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Maísa Vasconcelos: Os quadrados de Sérvulo
Opinião

Maísa Vasconcelos: Os quadrados de Sérvulo

Edição Impressa
Tipo Notícia Por
Maísa Vasconcelos

Jornalista do O POVO (Foto: Aurélio Alves)
Foto: Aurélio Alves Maísa Vasconcelos Jornalista do O POVO

Ao descrever o processo de criação da escultura Quadrados, Sérvulo Esmeraldo conta da dificuldade que foi pensar em algo que se adequasse ao espaço entre a avenida e os jardins da universidade. Em Sérvulo Esmeraldo - a Linha e a Luz, livro que se detém sobre sua obra, notadamente as esculturas públicas, o artista expõe sua preocupação em não esconder "a visão bonita das árvores". Assim, levou dois anos "pensando e procurando" até encontrar o que vemos hoje na composição em aço pintado, fincada na entrada do campus do Pici, da Universidade Federal do Ceará.

Era 2015 e o artista demonstrava insatisfação e certa frustração com o tratamento dado à sua criação. No seu entendimento, ela não "estava muito bem". Abrigos de ônibus tiravam-lhe a visibilidade. "Ninguém está muito preocupado com as obras de arte, não há interesse", reclamava referindo-se implicitamente a quem ordenou os abrigos, bem como a quem permitiu que lá se instalassem, neste caso, a universidade. Faltava amor pelo objeto.

No começo da semana, me deparei com duas postagens no Instagram em que a curadora, pesquisadora de artes visuais e presidente do Instituto Sérvulo Esmeraldo, Dodora Guimarães, manifesta indignação com a falta de planejamento na construção de uma praça no local.

Em um dos posts, uma imagem atual da escultura aparece praticamente encoberta. "É possível uma escultura tão curiosa, e critérios definidos para enquadrar como árvores e dinamizar o espaço em volta ser "atropelada", em nome do projeto (aparentemente sem arquiteto e paisagista) de uma praça planejada sem considerar o Monumento ao Conhecimento instalado pelo artista plástico Sérvulo Esmeraldo no local, desde 1987, quer dizer, há mais de 32 anos?", indaga na legenda. Numa outra foto, Sérvulo aparece pequenininho posando ao lado dos quadrados recém- instalados. Leves de tal maneira os enormes quadrados, que se pode ver balanço, como se fossem árvores embaladas pelo vento.

Nesses tempos de muitas lágrimas, não posso dizer que Dodora conseguiu sensibilizar a cidade, mas talvez nos fizesse bem um pouco mais de amor. Amor à arte. E mais amor pela vida, para que não se perca tão miseravelmente no fogo, na poeira, na lama, no óleo. 

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