A Assembleia Legislativa do Ceará (ALCE) aprovou ontem, por maioria acachapante, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que proíbe anistia administrativa a motins de profissionais da segurança pública no Estado, enviada pelo governador Camilo Santana (PT). A medida bloqueia previamente qualquer iniciativa destinada a obstar as penas previstas para esse tipo de crime, reiterando, na alçada estadual, o que já é previsto, in totum, no Art.142 da Constituição Federal.
A medida desestimula a deflagração de movimentos desse tipo e a adesão de quem se deixa levar, fiado na possibilidade de receber o perdão oficial pelos atos ilegais praticados. Pois, a verdade é que existem incentivadores à indisciplina até onde menos se espera. Foi o que aconteceu, por exemplo, no Ceará, quando o diretor da Força Nacional de Segurança Pública, coronel Aginaldo de Oliveira, parabenizou publicamente a tropa rebelada, durante a assembleia que definiu o fim do motim.
Certo, o oficial é marido da deputada Carla Zambelli (PSL-SP), uma das bolsonaristas mais ferrenhas, em nível nacional, mas o seu papel era de comandante de uma das forças pacificadoras e seu discurso deveria refletir as responsabilidades institucionais do cargo, e não de repetidor das invectivas frequentemente proferidas por sua esposa, na condição de representante política. Isso sem dúvida alentará o ânimo das tropas policiais em vários estados, que já se aprestavam para seguir o exemplo de seus camaradas do Ceará. O exemplo cearense serve como paradigma para possíveis movimentos em outros estados, por isso, a atenção nacional dos demais governadores com o desdobramento do motim em nosso Estado.
Faz bem o governador Camilo ao anunciar a intenção de mudar a estrutura de formação de quadros da Polícia Militar. De fato, isso é necessário, pois é preciso que a PM se enquadre no Estado Democrático de Direito e incorpore seus conceitos. Uma reforma mais profunda é da alçada do Congresso Nacional: é o que o Brasil espera para ter uma polícia democrática. Contudo, muito se pode fazer no âmbito estadual, e o governador deve ser apoiado nessa empreitada.
Por agora, o Ceará faz o balanço da barbárie ocorrida: só nos oito primeiros dias, foram registrados 220 assassinatos no Estado. Perfil: homem (94%), com idade entre 18 e 25 anos (46%), vítima de arma de fogo (95,4%) e morto na Região Metropolitana de Fortaleza (64,5%), segundo os dados da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS). É preciso debruçar-se sobre esses números e dissecar todo o mecanismo que levou a essa tragédia.