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Emmanuel Furtado: "O bêbado e o equilibrista"
Opinião

Emmanuel Furtado: "O bêbado e o equilibrista"

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Emanuel Furtado
etfurtado@uol.com.br
Desembargador do TRT e professor da UFC
 (Foto: O POVO.Doc)
Foto: O POVO.Doc Emanuel Furtado etfurtado@uol.com.br Desembargador do TRT e professor da UFC

Excelente a reportagem do O POVO, em suas Páginas Azuis, 16/03/2020, com a primeira mulher negra professora do ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica), Sônia Guimarães. A doutora em Física e pesquisadora fala da importância da inserção das mulheres e negros nas universidades e no cenário da ciência no Brasil.

Há, sim, uma dívida social com a etnia negra em nosso País. Adotar a teoria histórica de que nas sociedades africanas, ao tempo dos grandes descobrimentos, havia formas de escravidão, o que purgaria os pecados do homem branco, é mera falácia, pois o número de escravizados advindos do continente africano, nos escabrosos navios negreiros, principalmente para o Brasil, ao longo de mais de 300 anos de domínio europeu, chega a patamar aviltante. Mesmo nas Américas, a forma de colonização se dava diferente: para o norte ia o casal e já recebia sua gleba; para o sul vinha sozinho o colonizador e daqui se valia das nativas ou das negras, ficando a terra nas mãos de meia dúzia de pessoas que tinham relações com a coroa, principalmente no caso de Portugal. Opina pela dívida social o historiador Laurentino Gomes em seu livro Escravidão.

As ações afirmativas são formas de diminuir esse fosso entre negros, pardos e brancos. Como querer que número expressivo de negros logre êxito no dificílimo vestibular do ITA, se desde a base não lhes foi dado acesso à educação de qualidade, isso quando não foram largados à própria sorte e se entremeado com a criminalidade, ante a total falta de perspectiva de mobilidade social?

O que dizer de congregar a dupla condição de mulher e negra, em sociedade misógina e racista como a nossa? Em tempos como tal, de se lembrar da Pimentinha, Elis Regina, "doce ao cantar a doçura, cortante ao enunciar a revolta" (Elvis Matos. professor da UFC), que, se viva fosse, estaria completando 75 anos. Somos bêbados para tolerar tantas injustiças e equilibristas para andar nessa corda bamba que se chama Brasil, sabedores, contudo, de que o "show de todo artista tem que continuar".

 

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