"Espetaculosa" foi a palavra que Jair Bolsonaro usou para definir a prisão de Fabrício Queiroz, um homem ligado à família presidencial há muitas décadas por relações de confiança profissional e amizade. Todas as quintas-feiras, o presidente se encontra com o seu povo particular através de uma live transmitida na internet. O momento tem sua importância: é a hora de definir agendas prioritárias, obsessões recorrentes e inimigos públicos em potencial. Na última quinta, após a prisão de Queiroz, Bolsonaro parecia abatido, anunciou que falaria pouco e deu sinais de que o stress do dia havia minado seu vigor retórico habitual. Não só os palavrões e as ameaças à democracia são objetos de interpretação: as olheiras e os silêncios do presidente também têm seu sentido.
De espetáculo em espetáculo, a crise brasileira vem forjando seu enredo nos últimos anos. Nossa crônica política é televisionada, os acirramentos entre os grupos em disputa são impulsionados pelo Twitter, as peças de propaganda difundidas visualmente no Instagram e as fake news replicadas nos quartos fechados do WhatsApp. Na coexistência entre os meios de comunicação tradicional e as redes sociais, vivemos uma era onde a relevância dos acontecimentos do campo político depende da força da performance: do quão "espetaculoso" o ato possa ser, do quanto ele possa ser reduzido a peças informativas facilmente replicáveis e interpretáveis.
A imagem de Queiroz aprisionado não foi o único acontecimento midiático da semana. Lembre-se o leitor dos fogos de artifício atirados contra o edifício do Supremo Tribunal Federal, da prisão da polêmica militante bolsonarista Sara Giromini, do cumprimento dos mandados de busca e apreensão em face de uma dezena de deputados aliados do governo. Todos esses capítulos se deram ruidosamente, gerando um farto material de audiovisual: produzir conteúdo que possa garantir alcance e engajamento é hoje aspecto fundamental de qualquer estratégia política e dos principais planos de sobrevivência dos meios de comunicação tradicional.
Muitas explicações da psicologia social, da sociologia e da antropologia têm mostrado como a transformação da sociabilidade provocada pelas redes sociais no mundo virtual acabam potencializando a corrosão da democracia. O espetáculo agrega e engaja por seu potencial de êxtase, porque nos leva para o campo da emoção e das paixões, mas esse engajamento, por mais potente que seja, é transitório, como se quiséssemos sempre mais, uma banalização das breaking news, um vício.
A democracia deliberativa, ao contrário, como sistema político que busca dar conta da pluralidade, depende da mobilização de outras habilidades, mais racionais, menos passionais. Um sistema moldado para negociação, construção e constante aprimoramento, um fazer que requer tempo, estabilidade e disposição para o amadurecimento dos debates e das disputas. Talvez precisemos nos reeducar, nos imunizar contra o desejo de divertimento: nos emocionar menos com as imagens de prisões espetaculosas. Queiroz não é Tony Montana. Só assim, suspeito, com certa sobriedade, conseguiremos fugir às seduções da política do pão e circo.