A primeira vez que saí de casa no meio da quarentena para resolver algo pessoal, encontrei uma pessoa bem conhecida. Ele se aproximou de mim, como se fosse me dar um abraço. Eu fiz a mesma coisa. Paramos os dois, rimos por dentro das máscaras. E o amigo comentou: "temos esse impulso, né?". Conversamos sobre a vida por alguns minutos e dissemos um ao outro, na despedida: um abraço. Não há coisa mais reconfortante do que um abraço. Várias narrativas envolvem beijos traiçoeiros, tapinhas nas costas que são verdadeiras fake news, mas são raros os abraços que se transformaram em ícones de traição.
Tomar uma pessoa nos braços é uma grande responsabilidade. É um gesto de comunhão. Vale por um encontro inteiro. Um abraço sincero silencia tudo em volta. O que se ouve num abraço é tão somente aquela música que ressoa da alma, quase inaudível, o toque particular do ser humano. Quando meus filhos eram crianças e eu viajava a trabalho, tinha essa sensação ao voltar e abraçar um por um quando chegava em casa. Cada abraço era distinto no ritmo, no tempo e na pulsação. Algumas vezes, eles foram me buscar no aeroporto. E mesmo ali em público, era como se estivéssemos a sós. Eles tomavam o tempo que fosse necessário para se aninharem, pequenos, agarrados à sua cintura. Era comum meu filho mais novo, com quatro ou cinco anos, chorar nos meus braços.
Há alguns anos, eu li que um abraço reverbera por vários dias, proporcionando bem estar psíquico. Vocês vão lembrar do coletivo que distribuía abraços nas praças de Fortaleza. Vão recordar também do abraço coletivo no Cine São Luiz, no Centro; e em árvores, no Parque do Cocó. Alguns devem ter na lembrança o trabalho do artista cearense Sergio Helle que se chamou Abraços de cinema, que esteve em exposição no Dragão do Mar há tempos. Ele usava algumas técnicas para reviver esse gesto tão poderoso e o resultado transbordava de emoção.
Pensei na singularidade do abraço ao ver a triste e deprimente despedida do ex-ministro Abraham Weintraub, demitido na quinta-feira, do Ministério da Educação. Tudo era ruim naquele filme: a atuação dos personagens, o texto, o figurino, mas o pior de tudo foi o "abracinho" pedido por Weintraub, e o como a linha do pior sempre pode descer um pouco mais, veio o abraço em si. Algo frágil e sem fundamento. Como tudo neste (des)governo.