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Luciana Temer: Um retrato da violência sexual infantil
Opinião

Luciana Temer: Um retrato da violência sexual infantil

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Luciana Temer
Advogada, professora da Faculdade de Direito da PUC-SP e da Uninove, presidente do Instituto Liberta
 (Foto: Acervo pessoal)
Foto: Acervo pessoal Luciana Temer Advogada, professora da Faculdade de Direito da PUC-SP e da Uninove, presidente do Instituto Liberta

O tema da violência sexual infantil foi destaque recentemente em razão do caso da menina que vinha sendo estuprada desde os seis anos e que aos dez engravidou. O Brasil precisa entender que esta situação não é uma exceção, pelo contrário, trata-se de uma violência cotidiana.

Segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública de 2019, quatro meninas com menos de 13 anos são estupradas por hora no Brasil, mas a realidade é bem pior do que essa. Dados do boletim epidemiológico nº 27 do Ministério da Saúde apontam que entre 2011 e 2017 foram registrados 141.105 casos de violência sexual contra crianças e adolescentes, dos quais, 71,2% ocorreram nas residências. Então, não é exagero dizer que neste momento muitas destas estão confinadas com seus abusadores e não tem a quem pedir socorro.

Isto porque a escola, para além de um lugar de aprendizagem e convivência, é muitas vezes o único local no qual a criança ou adolescente encontra um adulto não ligado à família para quem pode pedir socorro em uma situação de violência familiar.

Apesar de não termos dados sobre isso (até pela dificuldade de denúncia apontada), o confinamento seguramente agravou a situação das crianças vítimas de violência sexual.

Enfatizo que a violência sexual contra crianças e adolescentes é uma grande violação de direitos humanos que impede o desenvolvimento integral das vítimas. Mas o argumento do respeito à dignidade humana infelizmente não comove a todos. Então, temos outro argumento bem pragmático, que é o enorme custo social de fecharmos os olhos para essa situação.

Ocorre que em 74,2% dos casos registrados as vítimas são meninas, portanto, estamos falando de uma questão de gênero, própria de uma sociedade machista, que objetifica o corpo da mulher e da menina. Uma das consequências sociais desta violência é a gravidez precoce, uma das maiores causas de evasão escolar. Na medida em que a menina sai da escola e não se capacita, a inserção no mercado de trabalho fica muito mais difícil. Com as oportunidades extremamente restritas, ela permanece no ciclo de pobreza e violência. Este ciclo perverso acaba por atingir a cada um de nós, direta ou indiretamente, e a sociedade como um todo. Vamos fazer o Brasil falar sobre violência sexual infantil. 

 

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