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Juliana Diniz: Um saldo das eleições de 2020
Opinião

Juliana Diniz: Um saldo das eleições de 2020

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Tipo Notícia Por
Juliana Diniz
Doutora em Direito e professora da UFC
 (Foto: Acervo pessoal)
Foto: Acervo pessoal Juliana Diniz Doutora em Direito e professora da UFC

É possível avaliar o resultado das últimas eleições municipais por diferentes perspectivas, otimistas ou não. No apanhado geral dos eleitos para o executivo, percebemos algumas tendências importantes, que podem dar pistas de como os partidos encaminharão as candidaturas para a presidência em 2022.

Partidos como DEM, PP, PL, PSD e Republicanos saíram mais fortes das urnas, ampliando significativamente o número de prefeitos pertencentes às siglas. Esse resultado indica não só a resiliência do chamado "centrão", mas sua capacidade de crescer após o recrudescimento da onda antipolítica que, há dois anos, tumultuou as urnas. Na direção contrária, os tradicionais PT, MDB e PSDB minguaram sua participação, com destaque especial para diminuição da influência deste último. Com exceção de São Paulo, onde ainda é uma força política hegemônica, o PSDB viu sua participação despencar nos executivos municipais pelo País.

O resultado pode cacifar os partidos do centro e especialmente o DEM para investir em uma candidatura presidencial própria e forte, sem maior dependência do clã Bolsonaro. Declarações de lideranças como ACM Neto vão nesse sentido, e a presença de Rodrigo Maia em Fortaleza para conversar com um fortalecido Ciro Gomes é um sinal claro de que as articulações para 2022 já começaram. O triunfo do PDT no Ceará, terra e base política dos Ferreira Gomes, foi contundente no primeiro turno e tende a se firmar com a vitória provável de seu candidato no segundo turno na Capital. O partido se fortalece não só local, mas nacionalmente, assim como o DEM de Maia.

Sob uma perspectiva pessimista, podemos dizer que as eleições locais em 2020 mostram que, em termos estruturais, a dinâmica política brasileira mudou pouco. A transferência de protagonismo entre partidos não representou um avanço de cultura, de agenda ou de quadros, mas simplesmente um rearranjo entre forças tradicionais. Essa conclusão ganha força quando percebemos o grau elevado de abstenção que marcou os pleitos nas cidades pelo país, uma ausência que pode ser explicada não só pelo medo do coronavírus, mas pelo desencanto do eleitor com a falta de renovação profunda. Em Porto Alegre, a abstenção chegou a um terço do eleitorado e a média nacional foi a maior em décadas.

Podemos, contudo, avaliar os resultados com outra lente, se tivermos em mente o legislativo. Isso porque o número de mulheres negras, trans e periféricas foi sensivelmente ampliado nas câmaras municipais. Belém elegeu Bia Caminha, a vereadora mais jovem entre os eleitos, negra, bissexual e feminista. Em Fortaleza, o coletivo Nossa Cara foi eleito e levará três mulheres negras e periféricas à Câmara Municipal, em São Paulo, Erika Hilton, uma candidata trans, foi a mulher mais votada com mais de cinquenta mil votos.

Esses são alguns exemplos de uma mudança de percepção do eleitorado sobre a importância da diversidade na representação política, um sinal de que a democracia brasileira segue amadurecendo e encontrando espaços para resistir à ameaça do radicalismo autoritário. 2020 deve começar menos ameaçador e mais colorido pelo país afora. Celebremos esse otimismo. 

 

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