Cabe certa prudência ao se buscar nacionalizar eleições municipais. Não que aspectos da conjuntura nacional não impactem. Estão corretos os analistas sobre como Fortaleza virou um "microcosmo" de 2022, tendo em conta os interesses de PDT, PT e bolsonaristas. Especialmente para os Ferreiras Gomes, a capital é um bastião para a sucessão de Camilo e as pretensões presidenciais de Ciro. Não por acaso, a escolha de um candidato tão afinado com o projeto do grupo, a exemplo de Sarto.
Há de se destacar, porém, como questões locais (saúde, transporte, educação, etc.) têm relevo para a eleição de um prefeito. Nesse sentido, os resultados do candidato apoiado por Roberto Cláudio denotam uma aprovação de segmentos da sociedade à sua gestão. Longe de buscar equiparações, RC faz lembrar o estilo administrativo de Juraci Magalhães. Suas obras impactantes (como viadutos) e de embelezamento/lazer (calçadões, areninhas) agradam a cidadãos, pelo sentimento de pertença (a uma cidade "progressista e bonita") que gera, apesar dos persistentes problemas.
Talvez essa percepção, por parte da população, tenha dificultado o percurso da ex-prefeita Luizianne Lins (o que não quer dizer que sua gestão não deixou marcas, a exemplo dos Cucas). Também foi o desafio do opositor Wagner, que ficou em situação melindrosa, visto que não poderia desconsiderar a "cidade bonita" de RC, mas criticá-la, a fim de apresentar aos cidadãos outro modelo de gestão. Wagner também ficou em posição difícil em não poder nacionalizar por completo a eleição, pelos aspectos locais envolvidos e pelo sentimento antibolsonarista de parte dos fortalezenses. Além disso, para além da retórica, é um reducionismo equiparar os "dois capitães". Por mais que tenha ao seu lado conservadores, que, claro, iriam capitalizar com sua eventual eleição, Wagner apresenta uma trajetória política e posturas diferentes das do "capitão de lá". Estrutura um grupo com considerável capital político.
Na Câmara, por fim, considere-se a eleição de candidatos compromissados com questões ambientais, étnicas, gênero, educação, arte. Em particular, chama a atenção um mandato coletivo, de três mulheres, negras, pobres, da periferia de uma das cidades mais injustas e violentas do mundo. Em época tão tenebrosa, Fortaleza ainda nos faz ter esperança. n