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Zenilce Bruno: Passagens na vida e o resgate do verbo perdoar
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Zenilce Vieira Bruno é psicoterapeuta de adolescente, adulto e casal, especialista em educação sexual e membro da Sociedade Brasileira de Estudos em Sexualidade Humana. Escritora, é autora dos livros

Zenilce Bruno comportamento

Zenilce Bruno: Passagens na vida e o resgate do verbo perdoar

Tipo Opinião

Perdoar é um verbo pouco conjugado no contexto de nossa cultura narcisisticamente movida à competição, à mania de grandeza, à banalização de valores, à desconsideração da importância dos outros.

Perdoar tornou-se valor obsoleto, coisa de gente fraca, no estilo dessa cultura tolificada pela mania de revidar, de ser vencedor, de ter que sobrepujar, de passar por cima e de destituir o outro. Perdoar tornou-se palavrão, coisa pejorativa, justificativa de gente sem coragem para a desforra.

Nesse contexto, quase sempre entra o álcool, como a droga que encoraja as insanidades. O clima pode passar a ser de armadilhas, de medo, de desconfiança, de incertezas e de falta de paz.

Mágoas, ressentimentos são frequentes na experiência mais guardada nas pessoas. Quem já não teve seus motivos de guardar uma dor, um sentimento rebentado, uma raiva por desejos frustrados, ou até ódio por uma situação transtornada, humilhante ou injustiçada?

Somos todos muito capazes sim, desses sentimentos raivosos. Eles compõem a nossa realidade humana. Contudo, é bom lembrar que nossas mágoas não resolvidas promovem sequelas muito sérias, quando as mantemos nutridas e realimentadas dentro de nós. Torna-se possível então, uma imensa produção de destruições em nós mesmos e nos outros.

A qualidade da vida interna, a saúde emocional, ficam prejudicadas nesse território amargurado, onde não sobra espaço para a alegria, a leveza, a partilha cordial, o afeto.

Talvez tenhamos construído a ideia de que o perdão é uma fragilidade diante do outro que nos ofendeu. Talvez imaginemos que se trata de um fechar os olhos para a falta do outro, de desculpar seu mau comportamento ou esquecer a dor que ele nos causou.

O que não percebemos, contudo, que é útil sobretudo a nós mesmos, à nossa própria saúde. Perdoar tem mais a ver conosco do que com o outro, nos libera do peso do ódio, da mágoa ou ressentimento que nos impedem de ficar bem.

Essa é uma bagagem muito pesada para nossa saúde emocional. Se não nos livramos dela, adoeceremos por dentro. Neste sentido, é uma escolha que fazemos, para viver longe dos fantasmas destrutivos. Não se trata de minimizar ou negar a própria dor, os sentimentos, mas de redimensioná-los.

Gosto muito da ideia de entender a crise instalada e até que ponto somos vítimas ou responsáveis, provavelmente os dois.

Quando nos impedimos disso, impedimo-nos também de crescer, de nos desembaraçar, de sermos nós mesmos. Não podemos conceder tanto poder ao outro de continuar nos afetando. Necessitamos processar sempre passagens na vida. Que ensaiemos, portanto, passar do estado de raiva, de ódio, de intolerância, para um estado de compreensão do humano, em suas falhas e encantamentos.

Não consigo entender a alegria sem sorriso e espontaneidade. A ideia da vingança e indiferença me congela. Somos todos maravilhosos e destrutivos. Capazes de amor e ódio. Cabe-nos dar destino ao que somos. Cabe nos apropriarmos do que queremos ser e fazer. Perdoar é abrir mão do ódio e permitir que a vida continue. 

 

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