Gilmar de Carvalho resolveu fazer suas obras em outras paragens. Certamente ganhará quem o acolher com suas letras, sua atenta leitura da realidade rústica e sua capacidade de tocar o cheiro da gente, de seus ofícios, e transformá-los em cores e tons impossíveis de captar por outro meio que não fosse pelo pensamento agudo, aposto na beleza de sua escrita.
Sua obra me foi contada hermeticamente e escutada por mim durante 21 anos, alguém eleito como seu primeiro leitor silencioso e agora silenciado.
Ficam os ecos de suas falas que compareciam assiduamente nas terças-feiras, com um desejo de tocar tudo que ia dos sabores das frutas às cores dos sons das rabecas; dos gestos autênticos daqueles que fazem a cultura com as mãos, com o paladar, com o aboio, com a fé, até ir ao encontro da vida com a morte.
Viveu como poucos a sensação de morrer a cada obra concluída e o desejo de viver em cada empreitada iniciada para uma nova etapa. Gilmar tinha sempre um novo livro.
Em cada livro um resgate de vidas e costumes alocados nos diversos rincões do Ceará e circunvizinhanças. Viagens longas, cansativas, noites mal dormidas, mas sempre contadas com entusiasmo que culminava uma análise fidedigna ao estado da arte encontrada.
Sua narrativa era elegante e precisa da fala à escrita, dos gestos à ação. Seu afã de servir à verdade do que via, o impelia a sair em busca de dados dos mais simples aos mais complexos, contanto que a informação passada não negasse a verdade de quem disse.
Era a ética do seu desejo, deixar escrito sob a égide de uma estética da verdade a criatividade de quem ele pesquisava. A escrita foi sua vida, que segue em cada Parabélum, em cada Madeira Matriz..., em cada parágrafo oferecido a quem estiver disposto a seguir a vida pela memória fiel ao ato de sua descrição minuciosa.
A memória e a escrita servem aos que orbitam ou querem entrar em seu pensamento, este sim, cunhado ao som de suas palavras belas e incisivas. Que siga Gilmar, construindo novos textos por quem for tocado por suas frases múltiplas e sensíveis!
A escuta se cala, mas não se apagam seus ditos. Estes estão em seus livros. Fiquemos com o conforto de poder voltar a uma conversa com você sempre que desejar experimentar sensibilidade sincera.