Logo O POVO+
Rui Martinho Rodrigues: Os especialistas e a tutela da sociedade
Opinião

Rui Martinho Rodrigues: Os especialistas e a tutela da sociedade

Edição Impressa
Tipo Notícia Por
Rui Martinho Rodrigues, historiador, professor da Faculdade de Educação da UFC (Foto: Georgia Santiago, em 01/06/2010)
Foto: Georgia Santiago, em 01/06/2010 Rui Martinho Rodrigues, historiador, professor da Faculdade de Educação da UFC

O Código Internacional de doenças considerou a velhice uma patologia. A decisão suscitou a reação de profissionais que levantaram problemas como a confusão entre senilidade e senescência, negligência em face problemas específicos rotulados apenas como velhice, em consequência de tal decisão.

Alexandre Kalache, geriatra e gerontólogo; Carlos André Uehara, sanitarista; Carlos Lima, psicólogo e outros estudiosos levantaram problemas clínicos (diagnósticos específicos negligenciados como "etarismo" ou "idadismo").

Também lembraram problemas de bioética, questões patrimoniais ligadas a facilitação da interdição de idosos e mencionaram o conflito de interesses da indústria farmacêutica. Estas reflexões são estranhas às minhas cogitações. Limito-me a menciona-las.

O problema político é a tutela dos "especialistas" sobre a sociedade. Karl R. Popper (1902 - 1994) demonstrou a falácia da ciência supostamente terminal e isenta e o erro do neopositivismo do Círculo de Viena, substituiu "prova" por "validade transitória", pois a validação obtida em um teste pode acabar em outro.

Popper apontou Platão (428 a. C. - 348 a.C.) como um dos inimigos citados, em "A sociedade aberta e os seus inimigos". O autor de "A República" disse, referindo-se ao governo, que não se entrega o comando de um navio senão a piloto experiente. Confundiu juízo de realidade (técnico), com juízo de valor (político).

A direção política dos sábios reaparece com o Iluminismo. Depois o positivismo de I. Auguste M. F. X. Comte (1798 - 1857) deu aos senhores da sofocracia a feição de técnicos, mais do que de sábios.

O voluntarismo revolucionário perdeu ímpeto. O dirigismo dos sábios voltou. Os profissionais da saúde, ao problematizar a decisão de considerar a velhice doença, mostram que a ciência não é unívoca nem isenta.

Michel Foucault (1926 - 1984) relacionou medicina e poder, em "O começo da clínica". Ivan Illich (1926 - 2002) apontou os perigos da medicalização em "A expropriação da saúde: nêmesis da medicina". O cientificismo é uma impostura.

 

O que você achou desse conteúdo?