A mais recente crise envolvendo Rússia e Ucrânia não sai dos noticiários. Desta vez, o olhar atento se volta para a possibilidade da escalada do conflito, com a potencial deflagração de uma guerra convencional.
Entretanto, a guerra já é uma realidade na Ucrânia desde 2014. Após a queda do regime favorável a Moscou em Kiev, a Rússia invadiu a península da Crimeia, anexando-a posteriormente. Somada a esta perda territorial, teve início uma guerra civil de cunho separatista no Leste do país. Enquanto a República Popular de Donetsk e a República Popular de Lugansk são apoiadas pela Rússia, desde 2014 a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) tem aprofundado a sua cooperação política e militar com a Ucrânia, apesar desta não ser oficialmente um país membro.
É importante considerar que a crise em tela não é apenas entre Rússia e Ucrânia, pois ecoa uma disputa geopolítica de longa duração, erroneamente percebida como uma Nova Guerra Fria. Na verdade, observa-se o retorno, na geopolítica, à clássica competição entre grandes potências no século XXI.
A crise entre Rússia-Ucrânia é mais do que uma disputa pelo futuro da Ucrânia. É um sintoma da tentativa de Moscou de frear os efeitos da derrota da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) e por consequência, da mudança estrutural de sua área de influência no Leste Europeu. A apreensão instalada no Ocidente é uma reação à não aceitação por parte de Moscou da continuação da expansão da Otan. Nesse jogo de xadrez geopolítico, a Ucrânia é vital para Putin e para o seu projeto de soerguimento da Rússia à condição de grande potência.
Dificilmente a Otan aceitará reverter a sua presença em países como Romênia e Bulgária. Contudo, Moscou está conseguindo levar a Otan e os Estados Unidos para a mesa de negociação onde se discute o futuro da Europa de Leste. A atual crise entre Rússia e Ucrânia ilustra a utilidade da violência como parte da diplomacia, uma barganha onde se negocia armado. Assim, a guerra - real ou imaginária - é parte da política.
A diplomacia e a força militar, e sua violência real ou esperada, são componentes do vocabulário. Afinal, como nos recorda Raymond Aron, o diplomata e o soldado são dois lados da mesma moeda. n