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Raquel Andrade: Quilombo, um caminho para a liberdade
Opinião

Raquel Andrade: Quilombo, um caminho para a liberdade

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A província do Ceará foi a primeira a libertar o povo negro escravizado, em 25 de março de 1884. Um ano antes do marco histórico, foram entregues 113 cartas de alforria na Vila do Acarape, hoje conhecida como cidade de Redenção. A região é o nosso berço histórico da liberdade.

À época, pessoas negras libertas permaneceram nas fazendas em razão do trabalho "remunerado" ou tentaram a vida na capital e cidades vizinhas. Algumas, no entanto, fugiram para o quilombo da serra do Evaristo, na região do Maciço de Baturité.

Coincidência ou não, era nesse pedaço de chão histórico que meus pés estavam fincados quando iniciei esta escrita. Pensei em tratar das Leis, do racismo, dos números e das violências. Mas hoje não. Hoje, não.

Neste humilde texto, irei na contramão da dialética que reduz nosso lugar existencial a dor e ao sofrimento. Nesta narrativa, nós seremos a esperança de uma sociedade melhor.

Quando entrei no Quilombo senti um arrebatamento de liberdade. O que a gente chama de "abolição" não cabe na força das mulheres, homens e jovens quilombolas da serra do Evaristo.

A organização impecável por meio de associação, o senso de coletividade na tomada de decisões e o enraizamento da solidariedade como valor fundamental são as primeiras armas de resistência e sobrevivência naquele lugar.

Presenciei a força combinar com afeto a melhor maneira para enfrentar difíceis batalhas. Vi a lei enveredar pelos caminhos do bem comum para a defesa de direitos. Justiça, cidadania, democracia. Não há um valor fundamental sequer desta nação, que não advenha de mentes, vozes e corações negros.

O limite de caracteres não me permite, mas posso resumir: após pisar no chão de um Quilombo pela primeira vez, percebi que jamais haverá liberdade ou igualdade sem o reconhecimento coletivo da contribuição do povo negro para a construção do que hoje chamamos de Brasil. Sem reconhecimento não há reparação.

Obrigada, Dona Socorro do Evaristo, por me inspirar nesta escrita. Por aguçar os olhos e ouvidos atentos e acarinhar minhas lágrimas indisfarçáveis. Compreendi, sentada no chão batido de sua acolhedora casa, o verdadeiro sentido de Aquilombar. n

 

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Raquel Andrade

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