Apesar de não ser a primeira guerra em que redes sociais tem um papel importante de documentar atrocidades, foi a guerra na Ucrânia que despertou o interesse público nos resultados práticos de vídeos, fotos e declarações que circulam em grupos online. Assistimos, quase que ao vivo, vídeos em Kyiv, Mariupol ou Bucha onde se destroem lares, shopping centers, escolas e hospitais, concluímos de maneira quase instantânea: são crimes de guerra.
Precisamos, contudo, de cuidado com conclusões apressadas, tanto de um ponto de vista jurídico, quanto psicológico. Juridicamente, vídeos como os que temos visto não são suficientes para uma condenação por crimes de Guerra. O direito penal internacional condena pessoas, não países, o que torna impossível condenar a Rússia ou o seu governo por tais crimes. Como colocamos, então, os responsáveis no banco dos réus?
Em outros julgamentos por crimes internacionais, vídeos e imagens foram apresentados como prova, mas sempre acompanhados de outros elementos que demonstrassem como e quando tais crimes ocorreram e quem eram os envolvidos. Vídeos e imagens são um excelente ponto de partida para uma investigação pois indicam o que e onde investigar, mas um processo criminal depende também de testemunhas, vítimas, relatórios técnicos, resquícios de bombas e munições, e documentos identificando comandantes de ataques.
Esse trabalho investigativo toma tempo que contrasta com a velocidade em que tais crimes têm sido cometidos. Se, de um lado, conseguimos visualizar um vídeo documentando um crime quase que imediatamente após a sua ocorrência, levar investigadores para colher provas e documentos em uma zona de guerra é um processo bem mais lento e demanda planejamento.
É nessa desconexão entre o imediatismo das atrocidades gravadas e uma eventual responsabilização dos envolvidos em que mora o perigo psicológico de concluirmos prematuramente que estamos assistindo a milhares de crimes de guerra todas as vezes que abrimos uma rede social. O uso do termo 'crimes de guerra' de forma tão corriqueira gera uma expectativa de que é só uma questão de dias até que milhares de soldados e oficiais de governo sejam presos e trazidos até a Haia para julgamento. Infelizmente, o tempo do direito penal internacional não é o mesmo da vontade de justiça.