Nas palavras camponesas, há um cobiçado dragão no sertão cearense. Lá, guarda-se a maior jazida de urânio do país que, associado ao fosfato, atrai o olhar dos grandes setores de nossa reprimarizada economia: a mineração e o agronegócio. Cada um à sua maneira, ambos se encontram nos maus presságios que ameaçam os bens comuns, a saúde e as águas.
A saúde, porque na explosão da rocha serão liberadas partículas radioativas e o imperceptível gás radônio, que alcança centenas de quilômetros de distância da jazida, aumentando a radiação do ambiente, precipitando-se sobre os solos na forma de polônio e provocando riscos de cânceres que afetam sobretudo as crianças (40 vezes mais sensíveis) e as mulheres (2 vezes mais sensíveis que os homens).
Além da liberação de radionuclídeos e do radônio, há neste projeto uma herança indesejada: duas eternas pilhas de rejeito a céu aberto convidando o vento e as chuvas a dispersarem seus contaminantes pelo Ceará, com restos de rochas ainda radioativas e o fosfogesso - um resíduo do tratamento do ácido fosfórico, conhecido internacionalmente pelas dificuldades de armazená-lo.
Essas pilhas podem contaminar as águas, mas o que chama atenção é o alto volume demandado: estima-se 855m³/h para matar a sede do empreendimento, mais de cem carros-pipa por hora, ameaçando a segurança hídrica da população e subestimando os efeitos climáticos adversos.
Noutro sentido, a empresa atua para subdimensionar riscos e tecer comparações incredíveis: não haveria com o quê se preocupar, a radiação está presente também nas castanhas e no sol, dizem. Quase como mágica, entre o projeto anterior e o atual, subtraiu-se da Área Diretamente Afetada um perímetro de 10km, no momento em que se descobriram importantes ocorrências arqueológicas e se identificaram comunidades na região.
Neste contexto que as comunidades e os povos afetados preocupam-se com a exploração e denunciam a violação do direito à consulta livre, prévia e informada pelo Estado, que lhes recusa a autodeterminação ao tempo em que promete adutoras e isenções fiscais para o projeto.
A notícia chega nas cidades alertando para os perigos da mineração e lembra o que não se pode cansar de dizer: é preciso defender a vida, a ciência e a saúde em tempos de passar a boiada. Afinal, precisamos todos das mesmas águas, terras e comida que vêm dos territórios onde repousa o dragão radioativo. n