"Alea jacta est" (em português, comumente traduzido como "a sorte está lançada") foi, segundo Suetônio, o que disse Júlio César ao atravessar o rio Rubicão, com suas tropas. O leitor já deve estar pensando: e lá vem mais uma analogia aloprada entre César e Bolsonaro. Pois bem: deixe-me explicar.
Evidentemente, comparar Júlio César e Jair Bolsonaro é um devaneio histórico sem tamanho. As grandezas, nesse caso, são incompatíveis. Seria como medir a distância entre Fortaleza e Sobral em anos-luz, posto que os dois personagens só compartilham o fato de serem bípedes implumes. A comparação cabível é, porém, entre as Repúblicas romana e brasileira.
Roma havia proibido os generais de atravessarem, com suas tropas, as fronteiras da Gália, exceto depondo as armas, pois o poder que os generais exerciam sobre suas tropas, no estrangeiro, não era da mesma ordem que o exercido na cidade eterna. O poder, em Roma, pertencia ao cidadão romano e, portanto, aos seus eleitos, que só o poderiam exercer sem colocar em risco a sua própria fonte de legitimação. Assim, as legiões romanas e seus generais não poderiam desempenhar o poder do gládio, onde o poder legítimo é o do verbo.
A travessia do Rubicão, portanto, não seria um crime contra Pompeu, rival de César, mas um ataque à República e, portanto, ao povo. Pois, onde o gládio impera, não pode existir uma República. As duas coisas são incompatíveis. Todo o exercício da política torna-se inócuo sob a ameaça de uma arma.
A multiplicação de soldados, capitães, coronéis e generais na política (que pelo título, não depuseram as armas); a intimidação constante ao sistema eleitoral por parte do Ministério da Defesa; o uso ostensivo das forças policiais na ameaça da vida civil; enfim, isso tudo é o exercício indevido do poder da espada.