A Constituição Imperial de 1824 deu ao monarca do Brasil grandes poderes. Ele possuía os poderes de chefe do Poder Executivo, sendo-lhe cabido o direito de nomear bispos, comandantes da Armada e do Exército, Ministros etc, mas também concedendo-lhe o uso do poder moderador, que, na prática, é o direito de intervir em qualquer dos poderes. Tendo sido uma Carta Magna outorgada pelo próprio ditador da família Bragança, todo o sistema de governo da nova nação brasileira permaneceu enredado aos quereres da Família Real Portuguesa.
Com o Golpe da República, a Constituição de 1891 elimina o poder moderador e mantém os três poderes: Legislativo, Executivo e Judiciário, como se preserva na Constituição de 1988. Acontece que, vez ou outra, surge a tese do poder moderador ser uma prerrogativa das Forças Armadas. Essa discussão é tão antiga quanto a própria República, mas pessoas esquecíveis buscam alguma notoriedade defendendo essa tese extravagante.
Tal tese é exótica ao sistema de ideias a que faz referência. Vejamos: a tese do poder moderador surge nos escritos de Benjamin Constant, intelectual conservador francês, com destaque no período da Restauração. Sua tese é que o poder real seria uma espécie de poder neutro, de equilíbrio. Mas nas suas ideias nada dá a entender que uma força militar qualquer venha a ter tal prerrogativa. Primeiro, porque, por óbvio, as Forças Armadas estão sob o controle do poder constitucional, ou seja, da soberania popular. Segundo, porque é inconcebível que as forças de fronteira tenham qualquer poder no interior do Estado livre.
As Forças Armadas se destinam à defesa externa da nação, não sendo permitido, segundo Constant, que elas tenham atuação interna, exceto depondo as armas e as patentes, parando "de ser soldados para nós, que sejam nossos iguais e nossos irmãos". Se é inconcebível ação interna das Forças, como elas poderiam ser poder de qualquer tipo?
A mensagem na leitura sistemática de Constant fica para as forças de segurança interna: "mas os cidadãos, mesmo quando são culpados, têm direitos imprescritiveis...".