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Fabiano dos Santos Piúba: Pôr a cabeça à altura do coração
Opinião

Fabiano dos Santos Piúba: Pôr a cabeça à altura do coração

Para além das dimensões do equilíbrio físico, psíquico e das funções sociais, sonhar é um ato criativo na construção de narrativas para sermos inventivos e darmos sentidos à vida
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"Sonhar a Terra". Esta cosmovisão Yanomami de Davi Kopenawa dialoga organicamente com a ideia de "falar com a terra" de Ailton Krenak que se conecta, por sua vez, com o pensamento do neurocientista Sidarta Ribeiro em seus estudos sobre as funções oníricas e sociais dos sonhos.

Para Sidarta, "o sonho tem tudo a ver com a arte, e a arte tem tudo a ver com a busca de soluções criativas para problemas objetivos ou subjetivos". Ou seja, para além das dimensões do equilíbrio físico, psíquico e das funções sociais, sonhar é um ato criativo na construção de narrativas para sermos inventivos e darmos sentidos à vida.

Mas Ailton Krenak nos lembra que o sonho não é exclusividade dos humanos: "A Terra sonha com essa humanidade, sonha com a nossa existência. Nós sonhamos a Terra. Essa experiência sensível de sonhar a Terra pode ser um dos recursos que pode nos socorrer diante da incapacidade daquilo que chamamos de Ciência em religar nós, humanos, com o organismo vivo da Terra".

Então, que possamos lembrar, contar, interpretar os sonhos, compreendendo-os como arte, mas também como busca de soluções criativas para problemas objetivos ou subjetivos, como fala Sidarta.

Afinal, sonhamos para reinventar o mundo real sem perder o encantamento de fruir a vida. E essa fruição é reconexão da experiência sensível de sonhar a Terra para que Ela nos sonhe também.

Mas não se sonha a Terra sem os espíritos, o Dela e os nossos. Daí que Ailton Krenak, buscando uma palavra dos parentes Maxacali, nos oferece o verbo espiritar: "A gente precisa espiritar a nossa relação com a Terra. Ela não pode ser só cerebral, mental, prática, cheia de razão. Nós vamos declinar dessa ideia de que a cabeça dirige o corpo e pôr a cabeça à altura do coração".

Pronto! Chegamos aonde tínhamos que chegar. Num gesto: pôr a cabeça à altura do coração. E colocar a cabeça nessa altura é encontrar o ponto cardeal. No meio da desorientação e confusão em que nos metemos, esse gesto significa orientação harmoniosa entre o céu e a terra, entre o corpo e o espírito, entre o cérebro e o coração, entre a razão e a sensibilidade, entre a cultura e a natureza. n

 

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Fabiano Dos Santos Piúba

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