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Leandro Vasques: A duração do processo penal e a espada de Dâmocles
Opinião

Leandro Vasques: A duração do processo penal e a espada de Dâmocles

A Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso LXXVIII, dispõe que "a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação"
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Leandro Vasques, advogado criminal, mestre em Direito pela UFPE e doutorando em Criminologia pela Faculdade do Porto, Portugal (Foto: Divulgação)
Foto: Divulgação Leandro Vasques, advogado criminal, mestre em Direito pela UFPE e doutorando em Criminologia pela Faculdade do Porto, Portugal

Dionísio, o Velho, tirano de Siracusa, vivia cercado de bajuladores, dentre os quais Dâmocles se destacava com especial afinco. Dâmocles invejava o poder e as riquezas de Dionísio, pelo que o governante resolveu deixá-lo temporariamente em seu lugar para que desfrutasse das benesses cobiçadas. Sentado em suntuoso trono, inicialmente maravilhado com as dádivas oferecidas, o cortesão assustou-se ao ver uma espada perigosamente suspensa sobre sua cabeça, presa por um frágil fio de rabo de cavalo. Foi a lição de Dionísio: detinha muitos privilégios, mas vivia sob iminente risco.

Analogicamente, mas sem as vantagens do poder, assim vive alguém que responde a ação penal ou é submetido a investigação criminal: constantemente sob a espada de Dâmocles. Ser acusado ou investigado criminalmente, como sabemos, não é uma condição meramente formal, pois traz reflexos indiscutíveis na vida pessoal e profissional. Além de estar com a "ficha" comprometida, o indivíduo pode sofrer as mais variadas medidas, tais como quebra de sigilo de dados bancários, fiscais e telemáticos, interceptação telefônica e restrições diversas sobre os seus bens.

A Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso LXXVIII, dispõe que "a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação". Em outras palavras, não pode perdurar indefinidamente - nem por tempo demasiado - a ingerência do Estado sobre os direitos fundamentais, como pontuou Aury Lopes Júnior, incluindo-se "a privacidade das comunicações, a inviolabilidade do domicílio e a própria dignidade" da pessoa investigada ou acusada. Nesse sentido, o STF, o STJ e diversas cortes regionais e estaduais têm consolidado entendimento contrário ao prolongamento excessivo de persecuções penais.

Compreendem-se as dificuldades enfrentadas pelos órgãos que compõem o sistema de justiça criminal, tanto pela sofisticação da criminalidade quanto pelas deficiências estruturais do Estado, mas é imprescindível que não se confunda a apuração acerca de um fato possivelmente delituoso com a devassa indiscriminada e por tempo indeterminado sobre a vida de alguém. n

 

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