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Isabel Carneiro: Nem todo homem?
Opinião

Isabel Carneiro: Nem todo homem?

Deveríamos estar protegidas em todos os lugares, mas não estamos. Num local destinado especialmente à proteção dos direitos das mulheres, uma de nós foi vitimada, não há outra reação senão o desespero
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Em 2022, após a notícia escabrosa de estupro cometido por um anestesista a uma mulher sedada para a cirurgia que traria seu filho ao mundo, viralizou um texto da Tracy Figg que dizia: "nem todo homem, mas sempre um homem". Sabemos que a generalização é perigosa, mas a realidade nos faz perguntar: nem todo homem mesmo? As mulheres têm sido violentadas sexualmente em situações cotidianas e sob o manto de todas as instituições sociais: família, igreja, Estado. Talvez, aquele que ainda não cometeu fará de algum momento banal uma oportunidade. E não dizemos isso levianamente, mas com a dor da constatação de que não há lugar nesse mundo onde estejamos seguras.

Em 29 de abril desse ano, uma mulher foi estuprada por um policial militar dentro do Juizado da Violência Doméstica e Familiar, que integra a rede de proteção às mulheres vítimas de violência. Vejam: violentada onde buscava proteção por quem deveria protegê-la. Deveríamos estar protegidas em todos os lugares, mas não estamos. Num local destinado especialmente à proteção dos direitos das mulheres, uma de nós foi vitimada, não há outra reação senão o desespero diante da questão: a quem recorrer?

A verdade é que estamos sozinhas e essa conclusão nos causa uma dor insuportável. Somos obrigadas a viver em estado de alerta, como se estivéssemos em guerra (e, pelo número de vítimas, talvez estejamos). Assim, o que nos resta é temer a qualquer um: pai, namorado, marido, irmão, tio, avô, vizinho, professor, padre, pastor, médico... homens.

Homens, vocês acham injusto serem vistos como potenciais estupradores? Nós achamos injusta a condenação de viver sob a égide do medo só por sermos mulheres. Façam alguma coisa! O silêncio de vocês alimenta a cultura do estupro. Rompam com o pacto masculino de proteção entre vocês, conversem, critiquem, denunciem, condenem, só façam alguma coisa! E chega de apelar para o discurso "e se fosse sua mãe ou filha?". Eles estupram mães e filhas, sobrinhas e netas, em qualquer lugar, de qualquer idade, a qualquer hora, todos os dias. Não merecemos respeito pelos vínculos familiares, mas sim por sermos mulheres, e isso deve bastar. n

 

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Isabel Carneiro

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