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Fabiano dos Santos Piúba: O pássaro-guia dos Guarani-Kaiowá
Opinião

Fabiano dos Santos Piúba: O pássaro-guia dos Guarani-Kaiowá

O desmatamento, o racismo e a intolerância religiosa fragilizam os laços sociais e o equilíbrio psíquico e espiritual. Violações dessa natureza têm afetado a saúde mental e elevado o suicídio, em especial entre os jovens indígenas
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Na cosmologia Guarani-Kaiowá, cada criança que nasce ganha a companhia de um pássaro que será seu guia por toda sua vida. O pássaro se chama gwyra, responsável pelo equilíbrio da pessoa.

Ocorre que ataques sistemáticos contra os Guarani-Kaiowá vêm afastando o pássaro-guia e levando as pessoas para o entristecimento e para o suicídio. São muitas as formas de violência, desde o avanço devastador do agronegócio até incêndios criminosos nas roças e casas de famílias. Casas de Rezas foram incendiadas por mais de uma vez e em setembro deste ano, a rezadeira Sebastiana Galton e seu esposo Rufino foram encontrados carbonizados na aldeia Guassuty em Mato Grosso do Sul.

E quem consegue trazer de volta o pássaro-guia para o equilíbrio do povo Guarani-Kaiowá? As rezadeiras porque possuem os saberes para invocar o pássaro de volta e ajudar no equilíbrio de seu povo. Sem as rezadeiras que sabem manter o Gwyra pousado na alma de sua gente não há equilíbrio na comunidade.

O desmatamento, o racismo e a intolerância religiosa fragilizam os laços sociais e o equilíbrio psíquico e espiritual. Violações dessa natureza têm afetado a saúde mental e elevado o suicídio, em especial entre os jovens indígenas.

Para quem ainda não entendeu o que é "cosmofobia", palavra criada por Nêgo Bispo, ei-la expressa em sangue, morte, racismo e violência. O jovem Janio Kaiowá denuncia que "estamos perdendo os anciãos por causa das perseguições e a comunidade está doente".

Doente está o mundo ocidental. Na sociedade indígena, o velho é o guardião da memória, o adulto é o guardião da aldeia e a criança é a dona do mundo. Estamos falando em cuidar da cultura, da educação, do território e do futuro. E não há futuro sem as cosmologias que compreendem que a sustentação de nosso equilíbrio enquanto seres é a relação harmoniosa entre as forças da natureza e da cultura, do corpo e do espírito.

Para os Guarani-Kaiowá é o gwyra, companheiro de uma vida inteira que para se manter vivo precisa das rezadeiras, das florestas e das terras demarcadas onde as crianças e jovens possam crescer belas e saudáveis. Noutras palavras, o que garante o pássaro-guia vivo equilibrando a alma de sua gente é o respeito à cosmologia de seu povo como um bem cultural sagrado, pois "tudo que move é sagrado, meu amor". n

 

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Fabiano Dos Santos Piúba

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