A participação das primeiras-damas nos governos de seus maridos, especialmente na gestão de programas sociais não é algo recente na história brasileira. Dona Darcy Vargas, na década de 1940, iniciou um conjunto de ações na área social, que deu origem à primeira instituição de assistência social no Brasil, a LBA. Várias primeiras-damas se destacaram pelas ações caridosas, benevolentes e de ajuda destinadas às populações mais pobres, o que expressa um traço da nossa formação social, mediada pela ideologia do favor e pela lógica familiar na política.
Certo é que isso contribuiu para demarcar a cultura do primeiro-damismo, que institucionaliza a primeira-dama como vocacionada para ocupar-se de projetos, ações e serviços. Não é à toa que, a última pesquisa do IBGE (MUNIC, 2013), acerca da assistência social, revelou que 23,42% dos municípios brasileiros tinham a primeira-dama como secretária de assistência social. Mas olhando para a atuação das primeiras-damas na atualidade, poderíamos dizer que esse perfil está mudando?
Nossa pesquisa de doutoramento revelou que há um ponto de inflexão no que se refere à cultura do primeiro-damismo no Brasil: as primeiras-damas vêm buscando romper com a reprodução da imagem tradicional patriarcal de doação, cuidado e ajuda, através da busca por profissionalização, a fim de demonstrar capacidade técnica. Parece haver uma tendência de participarem de forma mais ativa nas tomadas de decisão dos governos.
Mas, esse deveria ser o "novo" perfil da primeira-dama? No nosso entendimento, independente de terem uma postura mais tradicional ou uma proposta de atuação mais técnica, sua participação no governo é reveladora de uma estratégia presente em nossa cultura política: criar uma relação de proximidade, identidade e vínculo carismático entre governante e governados, através da imagem humanizadora da mulher, a fim de gerar processos conciliatórios que possibilitem a perpetuação no poder. Apenas sob essa justificativa é que se tem a defesa da participação das primeiras-damas nos governos.