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Deus em férias
Opinião

Deus em férias

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Tinha barba e cabelos brancos, pele bronzeada. Óculos escuros, camisa estampada, bermuda. Andava pela cidade como quem voltava depois de longa ausência. Dei bom dia.

— Ah, não. Estou de férias. A primeira que tiro em tempos. E de tantas pessoas com quem falar, tinha que ser você?

— Você me conhece?

— Demais.

Como ele sorria, me encorajei a se-
guir conversando.

Passamos pela Catedral.

—Vocês amam destruir. Coisas belas dão lugar ao novo. Essa catedral: grandiosa. Mas não tem o charme da igrejinha barroca que vocês derrubaram. Livre arbítrio. Fazer o quê? Vocês já se punem a si mesmos.

— Quem é você?

— Não me reconheces? Amigo, Eu sou o que sou, o altíssimo, eu sou Deus.

Eu ri. Isso fez com que ele me desse um olhar severo. Falei que não podia crer.

— Estou de férias.

— Então deixou os anjos cuidando de tudo e veio para a praia.

— Não preciso deixar anjos cuidando de nada. Não posso desfrutar do que criei? Estou em todos os lugares. Mas, principalmente, junto de vocês.

— Junto de nós? — Falava com ele como se realmente fosse Deus — Com tanta fome, miséria e desgraças?

— Livre arbítrio, lembra? Vocês deveriam cuidar uns dos outros e da terra. Fazem isso? Não. Cuidam dos seus próprios interesses. Eu criei a terra, livre, sem propriedade. O que há hoje, vocês criaram. E, apesar de usarem o meu nome para justificar suas obras, desde a criação, tirando a encarnação e a ressurreição, o que fiz foi ínfimo. Ouvi e vi barbaridades em meu nome. Agora mesmo, essa história de arminha! Absurdo.

Chegamos à praia, onde ele quis água de coco. Me ofereci para pagar. Sentamos
na areia.

— Como ter certeza de que és Deus?

— Acredite.

Ele me olhou e tirou os óculos. Nos olhos brilhavam estrelas.

Me senti pequeno e indigno. Quando dei por mim estava sozinho na praia. Ao meu lado, o coco vazio.

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