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Barbara Vasconcellos de Carvalho Motta: Donald Trump redux: três questões para pensar sobre o caos
Opinião

Barbara Vasconcellos de Carvalho Motta: Donald Trump redux: três questões para pensar sobre o caos

Para os próximos anos, veremos um Trump mais confiante, com renovado capital político e maior conhecimento da máquina política. O cenário que se apresenta não é de otimismo, e não apenas para os EUA
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Barbara Vasconcellos de Carvalho Motta. Professora de Relações Internacionais na Universidade Federal de Sergipe (UFS). (Foto: Arquivo Pessoal)
Foto: Arquivo Pessoal Barbara Vasconcellos de Carvalho Motta. Professora de Relações Internacionais na Universidade Federal de Sergipe (UFS).

Não é incomum, ao analisarmos a atuação internacional dos Estados Unidos, chegarmos à conclusão generalista de que pouco importa se a nova administração tiver à frente um Republicano ou um Democrata: para grande parte do mundo, em especial para o Sul Global, a política externa estadunidense será imperialista. Há muita verdade nessa avaliação. No entanto, é fundamental identificarmos nuances, sobretudo no caos.

Na atual conjuntura de contínua guinada à direita na política dos EUA, e do mundo, não é indiferente o retorno do Republicano Donald Trump à presidência. Três pontos são relevantes para refletirmos sobre o que esperar dos próximos quatro anos.

Um dos mais importantes é o ressurgimento das milícias de extrema direita e a radicalização dos setores de segurança e das forças armadas nos EUA. Embora a fundação de algumas destas milícias, como os Oath Keepers e os Proud Boys, preceda a eleição de Trump, todas tiveram crescimento significativo fomentado pelo trumpismo.

Não à toa 338 réus da invasão do Capitólio possuem ligações com mais de 50 grupos e movimentos extremistas, enquanto 209 têm alguma vinculação com as forças armadas norte-americanas. Somada à perspectiva de um perdão coletivo aos incriminados pelo 6 de janeiro, a mensagem passada por Trump é de que a violência é um instrumento legítimo quando a vontade de certo grupo for contrariada pela institucionalidade democrática.

Outro elemento crucial é a desdemocratização. A ilustração mais evidente são os questionamentos sucessivos de Trump ao processo eleitoral nos EUA. Uma vez à frente da presidência, ele poderá aprofundar este processo seja fragilizando instituições sólidas, como na promessa de cortar fundos do Departamento de Justiça, perseguindo opositores políticos, como mencionou que os membros do Congresso que investigaram sua atuação na insurreição contra o Capitólio deveriam ser presos, ou reorganizando a máquina política para centralizar poderes na figura do Executivo.

Ainda, o trumpismo, enquanto ideologia, reforça a primazia incondicional das liberdades individuais em detrimento das preocupações sociais. Quando esta liberdade significa a indiferença com o outro e uma demonização do social, a democracia perde a característica que lhe torna, de fato, democrática: a garantia de uma mínima igualdade - social, racial, de gênero, entre outras - para o exercício da vida política.

Por fim, em uma conjuntura de percepção negativa sobre a economia, Trump continuará identificando naqueles que são diferentes do estadunidense médio o motivo de todos os males. Se domesticamente o ressentimento contra imigrantes, latinos e negros pode elevar os índices de violência urbana, internacionalmente a negação do outro pode, inclusive, nos levar ao precipício do conflito armado.

Para os próximos anos, veremos um Trump mais confiante, com renovado capital político e maior conhecimento da máquina política. O cenário que se apresenta não é de otimismo, e não apenas para os EUA. Os impactos para o mundo serão de aumento das tensões, da insegurança e fomento do individualismo como única linguagem possível.

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