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Fernando Hessel: A Bispa do Trump no confessionário americano
Opinião

Fernando Hessel: A Bispa do Trump no confessionário americano

O caso Trump vs. Mariann Edgar Budde não é apenas uma questão de ego ou poder. É um lembrete cruel de como a fé é manipulada, reduzida a um trampolim para projetos de poder pessoais. Fica o questionamento: onde está o limite?
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Fernando Hessel. Observador-Chefe na Casa Branca e Pentágono. (Foto: Arquivo Pessoal)
Foto: Arquivo Pessoal Fernando Hessel. Observador-Chefe na Casa Branca e Pentágono.

Nada mais americano que um político se agarrando ao altar para reforçar sua imagem, e nada mais universal que essa cena de oportunismo ser replicada em outras democracias, como o Brasil. Donald Trump, um mestre em transformar qualquer situação em um espetáculo, agora exige desculpas da bispa ortodoxa Mariann Edgar Budde por um suposto "desrespeito" durante um culto.

O que realmente aconteceu não importa tanto, pois o episódio não é sobre o culto em si, mas sobre a eterna dança entre política e religião. Trump, assim como muitos outros políticos ao redor do mundo, abraça a fé apenas quando ela reforça sua narrativa. A religião, nesses casos, não é um guia moral, mas uma ferramenta de manipulação. E a ironia? Quando os líderes religiosos decidem falar algo que destoa do script, tornam-se os vilões da história.

A bispa Mariann Edgar Budde ousou sair da linha, e o resultado foi previsível. Trump, que gosta de posar como defensor da "moral" e "valores cristãos", não tolera ser confrontado no que considera seu terreno. Afinal, a religião, na visão desses líderes, deve ser uma aliada silenciosa, que legitime suas ambições sem questionar seus atos. Qualquer outra coisa é rotulada como "desrespeitosa" ou "politizada".

Esse cenário também se repete no Brasil, onde políticos buscam o apoio de pastores e padres com discursos sobre "valores familiares", embora suas ações frequentemente contradigam essas palavras. Quando a Igreja se posiciona contra seus interesses – sociais, econômicos ou ambientais –, é acusada de interferir onde não é chamada.

O caso Trump vs. Mariann Edgar Budde não é apenas uma questão de ego ou poder. É um lembrete cruel de como a fé é manipulada, reduzida a um trampolim para projetos de poder pessoais. Fica o questionamento: onde está o limite? Até que ponto a sociedade aceita essa hipocrisia institucionalizada sem perceber o quanto ela corrói a política e a essência da fé?

O verdadeiro desrespeito está no uso cínico da religião. Trump pode exigir desculpas, mas quem deveria pedi-las são os políticos que distorcem a fé para seus interesses.

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