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Nathana Garcez: Reação em cadeia
Opinião

Nathana Garcez: Reação em cadeia

o movimento parece ganhar tração nacional, um cenário que sugere riscos políticos para Trump. A dispersão geográfica dos protestos pode rachar a base republicana e ter custos eleitorais
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Nathana Garcez, doutoranda em Relações Internaiconais (Foto: Marcelo Freire)
Foto: Marcelo Freire Nathana Garcez, doutoranda em Relações Internaiconais

O que começou em 6 de junho, na Califórnia, como protestos isolados contra as duras políticas migratórias de Trump pode se tornar o estopim de um movimento nacional histórico. A violenta repressão da Casa Branca, longe de conter os manifestantes, parece ter catalisado a mobilização pelo país, em dinâmica perigosa para o governo Trump.

Desde seu retorno, Trump tem apostado alto na agenda anti-imigração. Detenções públicas de imigrantes tornaram-se mais frequentes, violentas e legalmente questionáveis, com relatos crescentes de erros e condições degradantes nos centros de detenção. Essa situação despertou, contidamente, questionamentos legais de parte da opinião pública americana. Na Califórnia, estado americano mais populoso, protestos pontuais ocorreram, mas sem grandes impactos. Até 6 de junho.

Os eventos dessa semana refletem o momento político que vive Trump, com a eleição de um Papa americano-peruano crítico de suas políticas, o aumento da rejeição à sua gestão econômica e o midiático rompimento político com Elon Musk. Na defensiva, Trump buscou retomar a narrativa pública com uma ação espetaculosa e controversa em sua única agenda ainda popular: a imigração.

A Califórnia, com grande população imigrante e sólida base democrata, parecia o cenário ideal para isso. Reprimir os protestos ali ecoaria positivamente entre a base de Trump e os adeptos do discurso de "segurança nacional", enquanto as críticas ficariam limitadas a um estado eleitoralmente inalcançável para o Partido Republicano. Assim, à revelia do governador Gavin Newsom, Trump ordenou o deslocamento da Guarda Nacional e da Marinha para o estado. O resultado foi violência extrema, dezenas de feridos e presos, incluindo jornalistas, em imagens que correram o mundo. Mas o presidente parece ter subestimado o efeito catalisador da repressão estatal aos movimentos sociais.

A indignação com as cenas ultrapassou fronteiras estaduais. Protestos eclodiram no Texas, tradicional reduto republicano onde o peso eleitoral migrante tem tornado as eleições cada vez mais competitivas. Com novos atos marcados em outros estados, o movimento parece ganhar tração nacional, um cenário que sugere riscos políticos para Trump. A dispersão geográfica dos protestos pode rachar a base republicana e ter custos eleitorais. A repressão, em vez de conter o dissenso, parece impulsionar o movimento pró-imigração.

A questão central agora é até onde a mobilização pode chegar e como o governo reagirá a ela. O episódio mostra que ações midiáticas geram efeitos imprevisíveis, com impactos na coesão social e no cenário político. Mas a trajetória de Trump indica que dificilmente ele tirará alguma lição disso.

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