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Guerras visíveis, violências invisibilizadas
Opinião

Guerras visíveis, violências invisibilizadas

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Enquanto o mundo assiste, perplexo, à escalada bélica no Oriente Médio e no Leste Europeu — Israel contra o Hamas e o Hezbollah; o Irã trocando mísseis; a Ucrânia sendo pulverizada por drones russos —, esquecemos que há guerras que não ganham manchetes, mas seguem matando em silêncio.

A guerra no Brasil é diária. Não há tanques nas ruas, mas há corpos no chão. Não há mísseis no céu, mas há fome nos becos. O país que condena os bombardeios alheios fecha os olhos para o genocídio simbólico e físico dos seus próprios filhos: jovens negros exterminados nas periferias; mulheres espancadas dentro de casa; indígenas expulsos por tratores financiados pelo agronegócio; quilombolas invisibilizados; idosos abandonados em filas do INSS; crianças violentadas sem manchete; LGBTQIAP assassinados sob o olhar cúmplice da indiferença social.

Thomas Hobbes via no Estado o único antídoto contra a guerra de todos contra todos. No Brasil, o Estado frequentemente é parte da guerra — seja por omissão, seja por corrupção. A verba que salvaria vidas é desviada, e o que poderia ser remédio vira orçamento secreto. Onde falta vontade política, sobra sofrimento.

Enquanto em Gaza se bombardeia com mísseis, aqui se bombardeia com ausência: de leitos, de merenda, de segurança, de justiça. Walter Benjamin já alertava: "o estado de exceção em que vivemos é a regra". E no Brasil, essa regra veste a farda da desigualdade histórica e da naturalização da violência estrutural.

É curioso como nos comovemos com guerras distantes, mas convivemos com massacres cotidianos com uma serenidade quase cínica. Talvez porque, como dizia Zygmunt Bauman, vivemos numa modernidade líquida, onde até a dor do outro se dissolve rápido demais.

O mundo está em guerra. Mas o Brasil, esse campo minado da indiferença, está em ruínas — não apenas por aquilo que explode, mas por tudo que se apodrece em silêncio.

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