Escrever sobre possibilidades futuras é sempre um risco no campo da crônica política. Se os fatos não se confirmam, o texto tende a envelhecer mal. Ainda assim, impactado pelas notícias que informam um possível retorno de Ciro Gomes ao PSDB, assumo o risco. Se concretizado, será um daqueles plot twists dignos de aplausos ao roteirista do Brasil contemporâneo - sempre a confirmar que, na política brasileira, não se morre nem de tédio, nem de coerência programática.
Após anos acusando o PSDB de traição ao Brasil, de capitulação ao financismo e de abandono de qualquer projeto nacional, um regresso ao ninho tucano soará como uma cena explicável menos pela lógica do enredo e mais pela exaustão dos personagens. Caminharam tanto - e tão erraticamente - que já não parecem ter para onde ir.
O timing também não poderia ser mais simbólico: trata-se da quadra de maior anemia política da história do partido - reduzido a traços nas disputas eleitorais e à sombra do que um dia já foi. Um belo match entre um político cambaleante e um partido em agonia. Uma afinidade eletiva comparável à dos perdidos que se encontram em uma noite suja.
Bastidores, palco, enredos, representação. As artes cênicas e a política guardam muitas relações. No caso em tela, o ato de decadência estaria para a política como Greta Garbo - que, na icônica peça de Fernando Mello, acabou no Irajá - estaria para o teatro.
Após se reinventar como defensor do nacional-desenvolvimentismo e como alternativa à polarização nacional, um eventual retorno ao PSDB reposicionará Ciro como peça-chave na celebração de um pacto antipetista com algumas das forças mais reacionárias da política cearense. Será de um apequenamento atroz. E isso, mesmo após as urnas reiteradamente lhe alertarem que a fatura da incoerência político-programática se paga com a falta de votos.
Ao voltar ao PSDB, Ciro Gomes pode muito bem estar encontrando seu Irajá.
Em prol da política cearense - e da nacional - torço para que este texto envelheça mal.