Para quem, como eu, já dobrou o Cabo da Boa Esperança, viver num mundo cada vez mais digital tem sido desafiador. Crescemos vivendo uma vida analógica e hoje vivemos conectados; para complexificar ainda mais a situação, a inteligência artificial tem invadido nossas rotinas, fazendo com que um certo saudosismo ronde nossos pensamentos.
Como professora universitária há mais de três décadas, sinto fortemente o impacto dessas mudanças. Fatores como tempo de tela elevado, dispersão e diminuição do interesse por leituras mais longas e densas, quando somados, têm provocado resultados que nos obrigam a repensar não só a nossa prática docente, mas também o nosso lugar no processo educativo. Se acrescentamos a inteligência artificial no cenário, a dificuldade aumenta.
As ferramentas de IA seduzem pelas facilidades que oferecem, resultando muitas vezes em um emprego indolente por parte dos alunos. Por outro lado, temos professores fechando os olhos para esse quadro, seguindo os mesmos modelos de ensino de muitas décadas passadas. Paradoxo e saudosismo se instalam, de mãos dadas com a desconfiança. Neste contexto de mudanças, estamos no meio do turbilhão, naquele momento em que a mistura de água e areia está turva e não nos permite ver com nitidez a situação.
A dicotomia entre essas inteligências é falsa. Esquecemos que a IA é o resultado do desenvolvimento e aperfeiçoamento cultural, técnico e científico humano e que não se contrapõe à inteligência humana; há infinitas possibilidades de interconexão entre elas. Não há como negar ou rejeitar a IA, mas é preciso enfrentar os novos desafios técnicos e, sobretudo, as questões éticas que incidem sobre a educação em geral e, notadamente, sobre a formação acadêmica.
Como manejar a IA nesse sentido? Simplesmente esperar a areia decantar?A UFBA elaborou, recentemente, um guia com diretrizes para o uso ético e responsável da IA na academia, de modo que seja utilizada para potencializar a aprendizagem e a pesquisa. Exemplo a ser seguido!