A soberania é o fundamento principal da República brasileira, insculpida, não por acaso, no inciso I, do artigo 1º, da Constituição de 1988. O Brasil é um país independente, com Poderes autônomos, atribuições e dinâmicas definidas.
Não é propriamente espantosa a tentativa de ingerência do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, na soberania nacional. O país não é o único do mundo a sofrer ameaças oriundas do megalomaníaco que se imagina dono do Planeta. Tampouco é a primeira vez que os Estados Unidos tentam interferir nos assuntos internos brasileiros, situação corriqueira desde a proclamação de independência de ambas as nações.
O que choca, neste momento, é que a justificativa de ingerência na soberania nacional tem como razão assumida pelo próprio Donald Trump, em carta reforçada pela Embaixada dos Estados Unidos no Brasil, os processos judiciais movidos contra Jair Bolsonaro, um ex-presidente desprezível e covarde, que tentou, de maneira frustrada, aplicar um golpe de estado no país e, por isso, responde à Justiça. Um sabujo que jamais poderia ter tido a honra de sentar-se na cadeira mais importante da República, fato com o qual ele mesmo, despudoradamente, e com singular naturalidade, reconheceu em público.
O filho do ex-presidente, Eduardo Bolsonaro, não só não nega que as ameaças de sanções estadunidenses contra o Brasil tiveram como motivação sua sabotagem internacional, articulada junto às autoridades da Casa Branca, como do conluio se orgulha, a ponto de falar que não interessa se o Brasil tiver que quebrar, o importante é garantir a impunidade do pai.
Cometeu a indecência de dizer que se tal impunidade não se consumar não haverá eleições em 2026. Assumindo a condição de agente dos Estados Unidos, descartou de vez retornar ao país para dar continuidade às ações pró-sanções contra o Brasil e o comércio brasileiro, punições que já começaram a se consumar (deportações em massa de brasileiros considerados marginais à parte) com o cancelamento unilateral de vistos de entrada de ministros da Suprema Corte do país nos Estados Unidos.
Um escândalo contra a deferência institucional que nações devem manter entre si. Crime claro contra o Estado brasileiro que o lesa-pátria, deputado federal do país, comete no exterior. Deslealdade evidente contra sua própria condição de parlamentar, que tem como dever ético defender a soberania nacional. Que o futuro lhe reserve as punições administrativas e criminais merecidas.
De outra sorte, é mais uma tentativa indecorosa do ex-presidente Bolsonaro de garantir sua impunidade, já havendo ele próprio confessado financiar as atividades internacionais de traição do filho. Um lesa-pátria, que se hoje não está preso preventivamente, é por excesso de cautela do Supremo Tribunal Federal, pois, há muito, mandou às favas o respeito pelo povo, pelo Estado democrático brasileiro, pela Constituição e as regras nacionais.
Sua agremiação partidária, o Partido Liberal, que também não se furta de insistir na chantagem contra o Brasil, ao escancarar apoio a Donald Trump, igualmente ignora que o resguardo da soberania é pressuposto básico para a existência de um partido político no Brasil, segundo explícito no caput do artigo constitucional 17.
A bem da verdade, desde as eleições de 2022 quando, sob o inescrupuloso pretexto de fraude às urnas utilizadas no escrutínio presidencial de segundo turno, porém não no de primeiro turno quando se viu beneficiado em pleitos majoritários estaduais e proporcionais, deveria ter tido registro eleitoral cassado por má conduta contra a democracia do Brasil.
Embora hoje, com instituições mais sólidas do que em janeiro de 2023, novamente se vê necessária a defesa veemente do Estado Democrático de Direito, não apenas como precaução, mas como necessidade iminente, diante das conspirações externa e interna contra o país.
Nação nenhuma pode dizer ao Brasil ou às suas instituições como devem agir. Se Donald Trump se considera o dono do mundo e lacaios brasileiros, por conveniência ou razão de vida, com tal absurdo concordem, este é um problema deles.
O Brasil é do povo brasileiro e quem quer que seja o nacional ordinário que se levante contra isso, que assuma as consequências de ser um inimigo da República, opositor do país, vassalo a serviço da sabotagem nacional. Que se acomodem em seu lugar na lata do lixo da história e lá permaneçam, porque de lá jamais deveriam ter saído. Não, porém, sem antes pagarem caro pelo crime de traição ao Estado, porque não pode haver prova maior de desamor ao país do que a tentativa de entrega de sua liberdade e independência a outrem. Que trincheiras sejam erguidas em defesa do Brasil, pátria livre e soberana. À luta, compatriotas!
* Marcelo Uchôa é advogado. Presidente da Comissão da Memória, Verdade, Justiça e Defesa da Democracia da OAB-CE