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Vanessa Venâncio: "Marco na política de drogas no Brasil e seus desafios"
Opinião

Vanessa Venâncio: "Marco na política de drogas no Brasil e seus desafios"

A descriminalização pode abrir espaço para políticas mais eficazes de tratamento e prevenção, visto que o STF recomendou ao governo a criação de campanhas de prevenção ao uso de drogas e aplicação de medidas de apoio aos usuários
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Vanessa Venâncio. Presidente da Comissão de Políticas Públicas sobre Drogas da OAB Ceará. (Foto: Arquivo Pessoal)
Foto: Arquivo Pessoal Vanessa Venâncio. Presidente da Comissão de Políticas Públicas sobre Drogas da OAB Ceará.

O julgamento do Recurso Extraordinário 635.659 representa um marco significativo na abordagem das políticas de drogas no Brasil, no entanto, diferente do que muitos pensam, não é sinônimo de liberação do uso da maconha de forma indiscriminada. A decisão reflete uma mudança paradigmática, reconhecendo que o consumo pessoal da maconha não deve ser tratado como uma questão exclusivamente criminal, mas uma infração administrativa cujas sanções possíveis são advertência cumulada com inserção em programas educativos.

Deve-se atentar que tal julgado traz consigo critérios para diferenciar o uso pessoal da cannabis da traficância a partir de avaliação objetiva e subjetiva , isto é, para classificar o sujeito como usuário, não basta o porte de quantidade de substância inferior a 40 gramas.

Outro ponto interessante do acórdão é a determinação de realização de mutirões carcerários a serem viabilizados pelo Conselho Nacional de Justiça com intuito de reanalisar os processos oriundos das ações criminais de tráfico.

Dados recentes do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), que mostram que o tráfico de drogas é o crime mais registrado no sistema prisional brasileiro, e a pesquisa do Instituto de Economia Aplicada (IPEA) intitulada “Critérios Objetivos no Processamento Criminal por Tráfico de Drogas”, que detecta que 37% dos processos por tráfico em tribunais estaduais tratam de apreensões de até 40 gramas de cannabis, pode-se deduzir que essas evidências respaldam a previsão de possível redução da sobrecarga do sistema penitenciário. Isso ocorre porque o encarceramento de usuários de drogas frequentemente é desproporcional e seletivo, dissociado da tipificação penal apontada.

A descriminalização pode abrir espaço para políticas mais eficazes de tratamento e prevenção, visto que na decisão o STF recomendou ao poder executivo a criação de campanhas de prevenção ao uso de drogas e a aplicação de medidas de apoio aos usuários. No entanto, é importante que essa mudança seja acompanhada por políticas robustas de regulamentação e educação.

A descriminalização por si só não resolve todos os problemas associados ao uso de drogas. Por outro lado, reflete um avanço na defesa dos direitos individuais. Contudo, é importante considerar os desafios que a descriminalização pode trazer, como a necessidade de ajustar o marco legal e a potencial reação de segmentos da sociedade que vêem essa mudança com receio.

Assim, a Ordem como defensora da Constituição, da ordem jurídica do Estado Democrático de Direito e os direitos humanos estará sempre atenta e ativa buscando um equilíbrio entre a garantia dos direitos individuais e a promoção do bem-estar coletivo.

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