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Hélio Leitão: Sempre teremos Paris
Opinião

Hélio Leitão: Sempre teremos Paris

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O país está sob ataque. Desde as manobras do adido militar à embaixada estadunidense no Brasil, Vernon Walters, longa manus do secretário de estado Kissinger, que culminaram com a operação “Brother Sam” e a derrubada do governo constitucional de João Goulart em 1964, não se via interferência em nossos assuntos internos como as que se dão agora.

A ingerência assume agora um novo formato - já não há espaço nem ambiência política, ao menos por aqui, para golpes à moda antiga, pela força das baionetas – desta vez foi o chamado “tarifaço”, medida em que se impõe ao Brasil tarifas da ordem de cinquenta por cento sobre suas exportações.

A coisa assume ares de chantagem e atende a vários propósitos do governo de extrema-direita de Trump. De um lado se procura com essas medidas torpedear o BRICS, arranjo político e econômico que lança as bases de um mundo multipolar, o prenúncio da derrocada da hegemonia norte-americana; de outro, a pretexto de defender a democracia e querendo exercer o papel de imperador do mundo, investe-se contra o Supremo Tribunal Federal, com o objetivo declarado de salvar a pele do ex-presidente Bolsonaro, sabedor de que seu parceiro de ideias e práticas autoritárias está na iminência de ir em cana. Atingindo nossa economia, tenta pôr o estado brasileiro de joelhos e fragilizar as instituições nacionais.

O restabelecimento do multilateralismo e o fortalecimento de articulações como a do BRICS, goste ou não aquele senhor de cabelo alaranjado, é consequência da pujança de novas economias como a brasileira e a chinesa. Natural a busca de mercados mais vantajosos. É do jogo. Ser contra isso equivale a ser contra a lei da gravidade. Inevitável, pois. Resta-lhe o direito de espernear.

O que não é do jogo absolutamente é querer interferir em assuntos internos, nossos, em processos ou decisões judiciais, seja qual for o tema, a decisão ou o réu. As instituições brasileiras não estão submetidas aos humores de um governante estrangeiro. Se a Suprema Corte erra ou comete excessos, o problema é única e exclusivamente nosso, a ser tratado no âmbito do direito interno. É assim em qualquer democracia digna do nome.

Não custa lembrar a lição de Ruy Barbosa, na sessão do Senado de 29 de dezembro de 1914, em aparte ao senador Pinheiro Machado, segundo quem “…Em todas as organizações, políticas ou judiciais, há sempre uma autoridade extrema para errar em último lugar. O Supremo Tribunal Federal, não sendo infalível, pode errar. Mas a alguém deve ficar o direito de errar por último, a alguém deve ficar o direito de decidir por último, de dizer alguma coisa que deva ser considerada como erro ou como verdade”.
É isso.

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