Mulheres curdas se tornaram símbolo de luta depois de sua participação na guerra contra o Exército Islâmico na Síria. Essas mulheres alcançaram o que poucos acreditavam após sua esmagadora vitória contra o terrorismo: parceria igualitária na política, na economia e na vida social em Rojava, região a noroeste do país,
O modelo por elas implementado tinha um slogan na língua curda: "Jin, Jiyan, Azadi" (Mulher, Vida, Liberdade), desafiava o patriarcado e priorizava o equilíbrio no ambiente em que viviam por meio do estabelecimento de uma democracia direta. Esse sistema político, décadas à frente do que se conhecia naquela região, surgiu, não em tempos de paz, mas sob a sombra de um conflito que envolvia governos antidemocráticos, terrorismo local e internacional.
O mundo testemunhou quando o movimento formado exclusivamente por mulheres, liderou a luta vitoriosa contra o grupo terrorista Isis. Essas guerreiras queriam não apenas derrotar extremistas, mas também quebrar tabus e construir um novo sonho de vida com justiça para o povo curdo. Terroristas do Isis, conhecidos por não temerem a morte, supostamente temiam ser mortos por mulheres — um destino que acreditavam, os impediria de alcançar o paraíso.
A resistência das mulheres curdas remodelou sua própria cultura, provando que a igualdade não é um ideal inalcançável, mas uma prática possível de ser exercida cotidianamente. Em janeiro de 2015, hastearam a bandeira da Unidade de Proteção à Mulher em terras sírias, onde as experiências da repressão feminina são a regra. A recente queda da família Assad na Síria foi, indubitavelmente, também para a população curda local, uma conquista histórica.
Os curdos foram o grupo étnico-populacional que mais sofreu repressão durante o regime Assad: privados de direitos, com terras desapropriadas, expulsos de suas próprias casas e aldeias, perseguidos, além de serem, coletivamente, declarados como apátridas. O fim da ditadura poderia significar para esse povo perseguido uma esperança se, e somente se, não tivessem um vizinho como a Turquia. O país que tem um governo declaradamente anti-curdo e, sob a égide do nada democrático Erdogan, exerce uma política genocida interna contra seu próprio povo, lança agora suas garras além fronteiras, em busca do domínio também em território sírio.
A alegria após a queda do regime Assad pouco durou nessa região semi-autônoma da Síria. A Turquia logo passou a colaborar com grupos aliados jihadistas em suas ofensivas, eclipsando a vitória que também seria curda sobre a ditadura em Damasco. A libertação do país para uma parte de sua população, já não é mais celebrada pelo povo curdo, que agora vive sob o temor de ameaça à própria sobrevivência e de retrocesso nas conquistas como região semiautônoma dentro da Síria.
Além do temor aos vizinhos turcos que se aliam a milícias locais para atacá-los, há dúvidas sobre as reais intenções do novo governo sírio, quando se trata de liberdades democráticas e respeito a minorias e mulheres.