Poucos analistas puderam prever que o abrupto fim da ordem mundial do Pós-Guerra, desencadeado pelo novo retorno à cena de Donald Trump como presidente dos EUA, seria acompanhado por tanto protecionismo daninho, truculência geopolítica e desrespeito à soberania das nações e aos direitos humanos. Parece que o mundo recuou para bem antes da criação da Carta das Nações Unidas (1945), que consagrou a declaração universal dos direitos humanos e das liberdades fundamentais das pessoas em escala global, e até mesmo antes da Paz de Westfalia (1648), que estabeleceu o princípio de soberania dos estados-nações e o estabelecimento de um sistema de relações internacionais baseado em tratados e negociações.
Estamos, assim, testemunhando uma situação de desordem internacional em que volta a prevalecer de forma escancarada a lei do mais forte sobre os mais fracos, o desmantelamento da cooperação e da solidariedade entre os povos e a aplicação de chantagem diplomática sistemática contra países adversários, parceiros e aliados.
Tudo isso contribuindo para levar o mundo à instabilidade econômica e ao perigo de uma conflagração de consequências imprevisíveis. A despeito dos sinais claros que apontam para essa direção muitos parecem, porém, acreditar que tudo é um blefe ou jogo do mandatário americano e que se deve assumir uma postura passiva e complacente para minimizar perdas e conseguir o melhor acordo possível com os EUA.
No caso do tarifaço imposto pela administração Trump ao Brasil sem justificativa econômica técnica, uma vez que os EUA acumulam há anos superávits comerciais bilaterais, a chantagem americana chega ao absurdo de tentar interferir nas decisões e processos do poder judiciário nacional e na regulamentação de atuação de redes sociais, assim como de sistemas de pagamento como o PIX. Esse tipo de interferência sobre a soberania do Brasil é inegociável e tem sido devidamente rechaçada pelo Governo brasileiro.
Não se trata de afrontar os EUA, como alguns têm criticado, mas sim de buscar defender os interesses nacionais com firmeza e responsabilidade diante de imposições descabidas e injustificadas. Nas relações internacionais só são respeitados os estados que se dão respeito. Ceder à coação e à chantagem alheias tornaria o Brasil um país desmoralizado no cenário internacional, caudatário de uma potência estrangeira e incapaz de proteger sua economia de achaques de líderes de outras nações.
Com a lista de exceção anunciada pelo EUA às vésperas da entrada em vigor das altas tarifas já se observa que a postura firme do Brasil em busca de um diálogo bilateral sério com os EUA pode fazer prevalecer o bom senso e levar o governo dos EUA a reconsiderar sua posição e rever sua política tarifária externa danosa e equivocada.