Até a 17ª Cúpula dos Brics, realizada em julho no Rio de Janeiro, o agrupamento político de países em desenvolvimento vivia momentos de oscilação, alternando demonstrações de força e sinais de incerteza na arena internacional. Apesar dos ambiciosos projetos conjuntos, como a criação de um sistema de transações transfronteiriço em moedas locais, até o mês passado as perspectivas futuras do grupo eram incertas, agravadas após uma Cúpula esvaziada pela ausência do presidente chinês Xi Jinping, e da hesitação indiana em se associar às principais iniciativas do grupo. Contudo, esse período de oscilação começa a dar lugar a um novo momento e o catalisador foi a mais recente ofensiva tarifária do presidente dos Estados Unidos.
O tarifaço de Trump contra os países dos Brics não é apenas uma medida econômica; é uma declaração de guerra política. Ao mirar a China, o Brasil e a Índia, o presidente dos EUA deixou claro que sua visão de comércio é menos sobre competitividade e mais sobre imposição de força. A ironia é que essa agressividade, em vez de enfraquecer os Brics, pode estar empurrando seus membros para uma coordenação mais estreita.
A China, pragmática e estratégica, não perdeu tempo: ainda nesta semana ofereceu apoio explícito ao Brasil, posicionando-se como parceira no fomento ao multilateralismo e na resistência ao protecionismo. Naturalmente, a ação representa mais do que solidariedade – é geopolítica calculada. Ao reforçar a ponte com Brasília, Pequim se fortalece no tabuleiro global e reforça a narrativa de que o Brics é alternativa real à hegemonia americana.
A Índia, sempre cautelosa, sentiu na pele a retaliação: tarifas de até 50% e a lembrança de que negociar com Trump não livra ninguém da tempestade. No entanto, os indianos também saber mover suas peças no xadrez. A resposta foi simbólica e estratégica: suspensão de compras dos EUA, viagem marcada para Pequim em 2026 e aproximação com Brasília, que também já acertou visita a Nova Délhi no mesmo ano.
Além dessas atuações, a retórica dura da Rússia – que se mantém firme apesar das sanções estadunidenses – e o respaldo da África do Sul às movimentações realizadas completam o quadro dos membros fundadores do Brics: não se trata apenas de comércio, mas de afirmar soberania num sistema internacional cada vez mais coercitivo. Trump pode acreditar que a pressão isolará adversários. O risco, para ele e para os EUA, é produzir exatamente o contrário: um BRICS mais consciente de sua força coletiva, mais disposto a agir como o bloco geopolítico que é.
Se a história nos ensina algo, é que sanções e tarifas raramente mudam comportamentos – mas frequentemente mudam alianças. E, nesse caso, é a Casa Branca que pode ter dado o maior empurrão para a consolidação política do Brics em anos.