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Direito à preguiça
Opinião

Direito à preguiça

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Confesso, em pecado, que nunca fui muito fã de trabalhar. Sempre fui dos que prefere curtir uma preguiça, uma sombra e água fresca. Quando minha saudosa mãe questionava a ausência de emprego em um certo período da minha vida, respondia com bom humor: "Ser vagabundo dá um trabalho danado, mãe."

Já ouvi muitos casos de suicídio de pessoas a caminho do trabalho — ou até mesmo dentro dele. Mas raras foram as vezes, ou quase nenhuma, em que escutei sobre alguém que quis se matar tomando uma cerveja de frente pro mar.

O fato é que o trabalho é, sim, essencial ao ser humano: é por meio dele que socializamos e nos relacionamos com a natureza. O problema não é o trabalho, mas a forma como ele é organizado. O que nos adoece é a exploração do nosso esforço, a remuneração baixa frente ao lucro alto do patrão, e, principalmente, o roubo do nosso tempo.

Mas nem por isso sou abestado a ponto de santificar o trabalho com frases do tipo: "o trabalho dignifica o homem". Dignifica nada. Trabalho é uma ação humana, necessária e coletiva — só isso.

Mente vazia pode até ser oficina do diabo, mas, com certeza, Deus não queria estar na cabeça de um operador de telemarketing.

Num mundo que nos exige produtividade e força a nossa correria pra além do que nossas pernas aguentam, é justo pensar a vida além do trabalho, reduzir a jornada laboral e usar o avanço da tecnologia para ser um aliado do bem estar - não uma ameaça.

Quando a tarde repousa sobre os barracos da favela anunciando o fim do domingo tudo parece ser tomado de uma grande angústia, o retrato da rua vazia, as conversas despretensiosas, o rádio do vizinho anunciando os minutos finais da partida de futebol. A angústia diz respeito à tristeza do seu único dia de folga estar chegando ao fim, esbravejamos contra a coitada da segunda-feira, mas o que odiamos não é ela em si.

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