Um condomínio localizado em São José, em Santa Catarina, ganhou destaque nacional ao aprovar uma regra no mínimo curiosa: a proibição de relações sexuais após as 22h. A medida rapidamente viralizou e transformou o residencial em alvo de comentários irônicos e críticas nas redes sociais. O que era para ser apenas um regulamento interno virou polêmica pública e, mais ainda, exemplo de como o excesso de zelo pode ultrapassar os limites do bom senso.
O motivo foram reclamações de moradores incomodados com gemidos, móveis batendo e conversas animadas durante a madrugada. A solução encontrada, porém, foi digna de roteiro de comédia: transformar o síndico em verdadeiro fiscal da alcova alheia.
O regulamento prevê advertência por escrito, multa de R$ 237 e até a possibilidade de reprodução de áudios em assembleia. Imagine a cena surreal: o síndico, de microfone em punho, apertando o play para exibir a intimidade dos vizinhos como prova de infração. Se a ideia era garantir silêncio, a execução virou espetáculo de constrangimento.
A grande falha está em confundir o direito ao sossego com a tentativa de controlar a vida íntima. Condomínios podem exigir que o barulho seja contido, mas não têm poder para determinar o que os moradores podem ou não fazer entre quatro paredes. O problema é o volume, não a natureza da atividade. Seja música alta, arrastar de móveis ou gemidos mais entusiasmados, o que cabe coibir é o excesso de ruído nada além disso.
Além da ilegalidade, há a inviabilidade prática. Quem fiscalizaria? O síndico com gravador na mão? Uma assembleia julgando áudios em viva-voz? A simples ideia de transformar reuniões condominiais em tribunais da alcova mostra o ridículo da medida. A intimidade é espaço inviolável, e tentar regulá-la é dar um passo perigoso em direção ao absurdo.
O resultado é uma norma fadada ao descrédito. Se aplicada, cairia facilmente diante de qualquer contestação judicial. O que sobra é a anedota: mais um capítulo para a galeria das excentricidades brasileiras. O sossego do vizinho deve ser respeitado, mas sem transformar o síndico em fiscal do prazer.
No fim das contas, a tentativa de impor toque de recolher ao amor não passa de curiosidade pitoresca, incapaz de resistir à razão jurídica ou ao bom senso. Porque, convenhamos, se existe algo que nem regulamento interno nem convenção coletiva conseguem controlar é a hora em que a alcova se abre.
E se a alcova é espaço de intimidade, ela não se curva a atas de assembleia nem a multas burocráticas: é território sagrado da liberdade, imune a carimbos, notificações e à criatividade exagerada de síndicos que, por excesso de zelo, esquecem que o Direito também precisa ter senso de limite e, de vez em quando, até senso de humor.