Essa semana foi realizado o julgamento histórico do ex-presidente Jair Messias Bolsonaro e de seu alto escalão por golpe de Estado e diversos outros crimes. A decisão foi aplaudida por muitos como um marco democrático, por outros, vista como um erro. Na posição de jurista, acompanho apenas os fatos e vejo o péssimo legado deixado tanto pelos golpistas quanto pelo Supremo à sociedade.
Inicialmente, é importante mencionar que o julgamento ocorreu dentro daquilo que se esperava pelo aspecto político apresentado. Isto é, o Supremo já anunciava, com suas decisões anteriores, que haveria uma condenação e que as penas seriam severas.
O voto do Ministro Luiz Fux foi visto como surpresa por muitos, pela incoerência interna. Mas deixou claro um ponto que já era levantado por diversos juristas: o Supremo tem se excedido, em especial quanto aos aspectos processuais.
Questões sensíveis foram modificadas ao longo do tempo para permitir este julgamento: a mudança dos entendimentos quanto à competência de julgamento do Supremo; as limitações às atividades dos advogados; e as restrições às vias recursais. Tudo já indicava que o Supremo julgaria de forma muito dura o caso.
Claro, ninguém nega que eventuais intenções golpistas são graves e exigem uma resposta clara e efetiva do Poder Judiciário. Estes casos revelam um histórico antidemocrático e impõem um resultado político muito ruim ao país, ao intensificar conflitos internos que prejudicam seriamente os interesses nacionais. Contudo, é essencial que qualquer punição seja aplicada estritamente dentro dos limites da legislação vigente, em preservação à segurança jurídica e aos princípios democráticos fundamentais.
Ultrapassar normas, pela modificação ou supressão, ainda que com a intenção de punir condutas graves, compromete a credibilidade das instituições e cria precedentes perigosos que podem enfraquecer o Estado de Direito. A defesa da lei não é apenas formalidade, mas condição indispensável para que a democracia funcione de maneira efetiva e justa.
O Supremo, ao ultrapassar esses limites legais, demonstra ao restante do Poder Judiciário que a legislação pode ser relativizada. Essa flexibilização, ainda que motivada pela intenção de punir condutas graves, acaba por estabelecer um precedente maquiavélico para todo o Poder Judiciário: aquele de que, em certas situações, os fins podem justificar os meios.
Eis que esse caso nos deixa um legado de maus exemplos: os ex-presidentes, que tentam perpetuar uma longa história antidemocrática; o Supremo, que, para conter isso, decide também não seguir a lei; e, no final, a sociedade, que permanece em uma eterna briga política, à espera de uma pacificação de ordem institucional.