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A ONU chega aos 80 anos sem motivos para comemorações
Opinião

A ONU chega aos 80 anos sem motivos para comemorações

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Denilde Holzhacker. Professora de Relações Internacionais da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM). (Foto: Arquivo Pessoal)
Foto: Arquivo Pessoal Denilde Holzhacker. Professora de Relações Internacionais da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM).

Setembro é o mês da diplomacia multilateral. É quando a Assembleia Geral da ONU abre seus trabalhos em Nova York e líderes globais ocupam a tribuna para apresentar visões de mundo, prioridades nacionais e, muitas vezes, atacar adversários. Ao longo de oito décadas, esse ritual já serviu tanto para gestos de reconciliação quanto para ameaças diretas à ordem internacional.

Apesar das tensões, a tribuna sempre foi lembrada como espaço de diálogo e como expressão do idealismo que inspirou a ONU em 1945. Hoje, porém, a organização completa 80 anos mergulhada em crise de legitimidade. Em vez de celebração, a abertura da Assembleia reflete a erosão da confiança em instituições multilaterais incapazes de gerar consensos.

O governo Trump é parte desse quadro. Além de reduzir o financiamento das operações da ONU, Washington ameaça impor sanções e restrições de viagem a delegações de países como Brasil, Irã, Sudão e Zimbábue. A recusa do visto ao presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, simboliza uma abertura marcada pela intensificação das divisões.

Ainda assim, o reconhecimento do Estado palestino deve dominar os debates. Em 12 de setembro, 142 países apoiaram resolução liderada por França e Arábia Saudita em defesa da solução de dois Estados.
Outro eixo será a Cúpula sobre Democracia.

Para Lula, trata-se de oportunidade de projetar o Brasil como democracia resiliente, capaz de enfrentar seus próprios fantasmas autoritários. O julgamento dos responsáveis pela tentativa de golpe de 8 de janeiro se torna trunfo que permite contrastar a experiência brasileira com retrocessos observados em outras nações.

A agenda ambiental também terá destaque. O Brasil busca reafirmar seu compromisso climático e resgatar a credibilidade da COP30 em Belém. As dúvidas sobre a infraestrutura da cidade pressionam o governo, que precisa convencer a comunidade internacional de que a conferência não será esvaziada. Mesmo que poucos esperem avanços substantivos, evitar um fracasso de imagem já será considerado vitória.

A maior incógnita é a postura norte-americana. Como Donald Trump reagirá às críticas contra suas políticas comerciais, migratórias e unilaterais? Não há sinais de encontro bilateral com Lula. Assim, o contraste entre os discursos terá forte peso simbólico. Lula deve adotar tom crítico, defendendo soberania e multilateralismo; Trump insistirá em sua visão nacionalista e confrontadora. As diferenças sintetizam o dilema global: de um lado, a defesa de instituições multilaterais; de outro, o avanço de agendas unilaterais.

A abertura dos 80 anos da ONU dificilmente trará consensos ou soluções estruturais. Mas, como em outras ocasiões, a Assembleia se manterá peça essencial do xadrez internacional. Apesar das frustrações, continua indispensável para compreender os rumos da diplomacia contemporânea.

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