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Charlie Kirk: As veias abertas da América em sangue
Opinião

Charlie Kirk: As veias abertas da América em sangue

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Leonardo Fernandes. Cientista político, mestrando em Ciência Política pela Universidade Federal do Piauí. (Foto: Arquivo Pessoal)
Foto: Arquivo Pessoal Leonardo Fernandes. Cientista político, mestrando em Ciência Política pela Universidade Federal do Piauí.

Charlie Kirk, ativista conservador, foi brutalmente assassinado durante uma palestra ao ar livre em Orem, Utah. O crime, de imediato, mobilizou a atenção da mídia mundial e reacendeu os debates sobre violência política e a cultura de armas nos Estados Unidos. Mais uma vez, a história política americana é escrita com sangue - e, mais uma vez, alimentada pelo poder letal das armas de fogo, símbolos tão enraizados na identidade nacional quanto a própria bandeira.

O episódio carrega uma dimensão simbólica perturbadora: o disparo atingiu a garganta, silenciando o orador em pleno exercício da palavra, dentro de uma universidade. O discurso não foi interrompido pelo contraditório, mas pela brutalidade da bala. Uma cena que sintetiza o colapso das democracias quando a divergência deixa de ser respondida com ideias e passa a ser esmagada pela violência.

A reação pública intensificou as fraturas da guerra cultural que consome os Estados Unidos. De um lado, lamentos pela perda de uma voz influente da direita; de outro, manifestações de celebração vindas de setores radicais da esquerda. Reafirmar o óbvio tornou-se necessário: a violência nunca deve ser festejada.

O ódio apenas gera mais ódio, numa espiral que se retroalimenta de ressentimento e vingança. Quanto mais essa espiral se expande, mais ergue barreiras e consolida trincheiras. Esse ambiente de radicalização se conecta a um fenômeno mais amplo: o isolamento social e a multiplicação das bolhas digitais.

Grupos fechados em seus próprios circuitos de informação produzem inimigos imaginários e transformam diferenças políticas em ameaças existenciais. O adversário deixa de ser alguém a derrotar nas urnas para se tornar um inimigo absoluto a ser eliminado. É a lógica amigo/inimigo descrita por Carl Schmitt - a política reduzida ao conflito irreconciliável.

Mas a política, na tradição clássica, tem outro sentido. Aristóteles a definiu como a arte de viver em comunidade, a realização da sociabilidade que distingue o ser humano. Se a pólis existe para permitir a vida em comum, cada ato de violência política mina esse fundamento e ameaça a própria possibilidade de convivência.

O risco maior, portanto, vai além de cada tragédia: é a degradação da política como espaço de deliberação. Quando o diálogo é substituído pela bala, não se destrói apenas uma vida, mas a própria ideia de comunidade política.

No fim, talvez reste o eco de uma conhecida canção brasileira, dos Titãs: nenhuma ideia vale uma vida. Uma lição simples, mas que parece cada vez mais difícil de ser lembrada em tempos de radicalização e sangue derramado.

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