À primeira vista, a expressão "racismo algorítmico" pode parecer um termo técnico demais, distante do cotidiano. Mas ele está mais perto de você do que imagina. Quando você acessa uma rede social, busca um emprego online, tenta obter crédito, publica um conteúdo ou apenas caminha por uma rua monitorada por câmeras inteligentes, há sistemas automáticos tomando decisões sobre o que você pode ou não ver, ouvir, dizer e, sobretudo, sobre quem será visto, ouvido ou silenciado. E essas decisões não são neutras.
Chamo de racismo algorítmico o modo como desigualdades raciais são reproduzidas e amplificadas por decisões mediadas por algoritmos. O problema não é a máquina em si, mas os modelos matemáticos, bases de dados enviesadas e critérios de decisão que carregam séculos de desigualdade.
Um exemplo emblemático está no reconhecimento facial. Diversos estudos mostram que rostos negros são identificados com muito mais erros, resultando em abordagens policiais injustas. No sistema de crédito, CEPs associados a bairros periféricos, onde vive majoritariamente a população negra, reduzem as chances de acesso a oportunidades financeiras. E isso não é um erro, mas estrutura.
Por trás de cada algoritmo há interesses econômicos e visões de mundo. O algoritmo é um texto e, como todo texto, carrega sentidos e intencionalidades. O racismo algorítmico é um desses sentidos que emergem silenciosamente das linhas de código, sustentando hierarquias coloniais travestidas de eficiência tecnológica. Desigualdade programada continua sendo desigualdade.
Chamo essa engrenagem de necroalgoritmização, que é um poder letal que não atira, mas decide quem importa e quem pode ser descartado. É o racismo reescrito em linguagem de máquina, operando com velocidade e invisibilidade. Combatê-lo exige mais que ajustes técnicos. Requer responsabilização, políticas públicas e regulação ética. Nomear o problema é só o primeiro passo. O segundo é agir antes que a exclusão siga operando na velocidade da máquina.
A neutralidade tecnológica é ilusória. Cada decisão envolve escolhas. Algoritmos não inventam desigualdades, mas as amplificam com aparência técnica.