Recentemente, li um texto do escritor Ruy Castro no qual ele dizia que estava se despedindo do ex-presidente Jair Bolsonaro. Para Castro, a condenação e a possível prisão do ex-mandatário, após a conclusão de todos os devidos recursos, subtraíam o personagem do rol dos seus interesses jornalísticos.
Bolsonaro já não significa, para o autor, absolutamente nada em termos de assunto para uma crônica de jornal. Depois que li a crônica do Ruy Castro, me dei conta que a pesquisa Datafolha, publicada em setembro último, afirmava que 50% dos entrevistados consideram que o ex-presidente deveria ser preso por atentar contra a democracia, enquanto 43% se posicionaram contra a prisão.
Em agosto passado, os dados da pesquisa Datafolha mostravam um maior acirramento: 48% contra 46%. Nesse mesmo mês, o Datafolha ouviu brasileiros, pela OAB, sobre o que achavam do regime democrático e o resultado afirmou que 76% dos que responderam a pesquisa consideravam que a democracia é melhor do que qualquer outro sistema de governo e 8% disseram que, em determinadas situações, uma ditadura seria melhor. Em dezembro do ano passado, a mesma pesquisa Datafolha apontou que os apoiadores da democracia eram 69% e os mesmos 8% se debandeavam para uma ditadura.
Apesar de considerar que existe ainda um acirramento político enorme no Brasil, às vezes, baseada em algumas dessas pesquisas e do que escuto em alguns grupos de pessoas tão diversas, concluo que estamos vivendo numa certa arena onde se respira melhor. Jair Bolsonaro está em vias de ser preso e o mundo não acabou e não vai acabar. Não sou louca de achar que os 43% das pessoas crédulasque o ex-presidente não tem nada a ver com o plano de dar um golpe no País estão dormindo. Eles estão infelizes e tristes, mas a vida segue e Bolsonaro não parece mesmo ser uma preocupação nacional. De repente, Ruy Castro tem razão, pensava.
Mas, mudei de ideia. Outro dia, estava conversando em um grupo e a política, claro, entrou na roda. Daí uma das moças presentes se levantou e disse que não estava à vontade com aquela conversa, que desculpássemos, mas ela sairia e quando o assunto fosse outro, mandássemos um "zap" e ela retornava. “Eu odeio esse assunto, simplesmente odeio”. Mudou de mesa. Foi a coisa mais desconcertante que vivi nos últimos dias.
A moça de 44 anos, bonita, vive confortavelmente, pratica esporte, participa de maratona, festeira, uma pessoa agradabilíssima, querida mesmo. Já tomamos litros de café juntas, e só ali percebi que ela nunca diz nada quando opino sobre alguma coisa política. Naquela tarde, acho que a tomamos como uma de nós. Fui até a mesa dela, conversamos um pouco, pedi que retornasse, que o assunto agora era roupa. Voltei para casa certa de que Ruy está enganado, Bolsonaro ainda é assunto.