A crise de representação que atravessa o País não nasce do acaso, mas da lenta construção de uma fadiga coletiva. Ariano Suassuna, inspirado em Machado de Assis, distinguiu dois Brasis: um conduzido por uma elite distante do País real e alienada de sua identidade, e outro formado pelo povo que sustenta a nação com esforço cotidiano. Ariano foi incisivo ao lembrar que essa elite "já quis ser portuguesa, depois francesa e agora estadunidense", sua crítica, literária e política, revela um poder moldado por interesses alheios à materialidade social da maioria.
A perpetuação das mesmas famílias na política revela uma deformação institucional, onde o poder é transmitido como herança. A cineasta Petra Costa em seu documentário "Democracia em Vertigem" cita que "uma democracia só funciona quando os ricos se sentem ameaçados; caso contrário, a oligarquia toma o poder. De pai para filho, de filho para neto, de neto para bisneto, e assim sucessivamente". Somos uma República de famílias. Umas controlam a mídia, outras os bancos. Elas possuem a areia, o cimento, a pedra e o ferro.
O debate no Supremo Tribunal Federal sobre a Súmula Vinculante nº 13, que veda a nomeação de parentes, expõe a fragilidade institucional diante dos vínculos de sangue, evidenciando a contradição entre o princípio da impessoalidade e práticas clientelistas de perpetuação do poder. Como advertiu o ministro Flávio Dino, "uma reunião de governo não pode ser um almoço de domingo".
O poder segue inacessível a quem nasce fora dos círculos tradicionais. A desejada renovação sucumbe diante da desigualdade entre quem dispõe da máquina e influência e quem detém a inteligência e vontade de enfrentar tudo isso, mas em um cenário em que a política se mercantiliza sob a penumbra de emendas bilionárias que definem territórios e fidelidades, a democracia é reduzida a uma mesa de negócios, em seu desfecho, vence não o mérito, mas quem pode comprá-la.