A aprovação da Política Nacional de Linguagem Simples revela como um jabuti inesperado ameaça desviar o debate público e comprometer a compreensão cidadã, justamente quando celebramos um avanço histórico para a comunicação clara no Brasil.
A sanção da Lei 15.263 deveria ser motivo de festa cívica. O país finalmente reconhece, em política nacional, que o direito de entender é fundamental e que o Estado deve falar de forma clara com a população. Não é detalhe retórico: é acesso real a políticas, serviços, benefícios e justiça. É democracia.
Mas a celebração foi invadida por um elemento estranho. Parlamentares inseriram na lei um artigo para proibir o uso de linguagem neutra. A emenda havia sido rejeitada pelo relator, Pedro Campos, mas recorreram a um destaque e a aprovaram.
Trata-se de um enxerto que não estava no projeto original, não dialoga com a técnica de Linguagem Simples, não aparece em norma brasileira ou internacional e tampouco integra o consenso de especialistas. É um absurdo aproveitar uma proposição concebida para fortalecer democracia, inclusão, transparência e controle social e inserir nela algo que, ao contrário, ceceia direitos.
O resultado foi imediato: manchetes apressadas reduziram o avanço histórico a uma falsa polêmica, desviando o foco do que importa. Em vez de discutirmos como tornar o Estado mais compreensível, fomos arrastados por ruído artificial.
É preciso reafirmar: Linguagem Simples não é linguagem neutra, não a substitui e não a regula. Linguagem Simples é método, não ideologia. Busca incluir todas as pessoas pelo exercício profundo da compreensão e se guia pelas normas gramaticais vigentes, essenciais para garantir textos claros, testáveis e verificáveis.
Ao mesmo tempo, a linguagem é construção social e, por isso, a linguagem neutra é expressão legítima de seus falantes. Sua busca por inclusão deve se consolidar como avanço social relevante, fruto de práticas reais de nomeação e reconhecimento.
Apesar do jabuti, a lei é conquista rara: cria padrões, orienta práticas baseadas em evidências e coloca o cidadão no centro.
Que o ruído não engula o mérito! Viva a Linguagem Simples!