Eu sempre fui uma criança comportada, daquelas que perguntam se poderia antes de fazer, chorava fácil e foi por isso que aquele dia ficou marcado. Acho que foi a primeira vez que minha mãe levantou a mão para mim.
Na minha cabeça de oito anos, aquilo era o fim do mundo. Fui ao quarto do meu pai. Contei tudo, mas nada foi resolvido. Ele não me defendeu, como eu esperava. Foi então que tomei a decisão mais radical da minha curta vida: eu iria fugir de casa.
Peguei minha mochila da escola, coloquei meu lençol favorito, alguns doces, uma garrafa de água e fui. Eu queria que todos sentissem minha falta. Queria as desculpas da minha mãe e que meu pai viesse correndo atrás arrependido de não ter feito nada.
Entretanto, o mundo lá fora era grande demais. E, principalmente, sem cama, sem alguém para cuidar de mim. No meio do caminho, meus pensamentos começaram a gritar mais alto que minha raiva: para onde eu iria? Onde dormiria? Então, desisti.
Voltei para casa, ninguém percebeu a fuga. Ninguém me perguntou coisa alguma. Talvez isso tenha doído mais do que a bronca em si. No entanto, hoje, ao olhar para trás, vejo uma menina ímpar tentando entender o mundo com a única arma que tinha: o sentimento.