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Novo normal é puro marketing
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Novo normal é puro marketing

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Luiz Felipe Pondé  (Foto: Doca Presença Digital/ divulgação)
Foto: Doca Presença Digital/ divulgação Luiz Felipe Pondé

Filósofo, professor, escritor e palestrante, Luiz Felipe Pondé integra o grupo de pensadores contemporâneos brasileiros disputados no mundo para participações em conferências, entrevistas e análises do cotidiano humano. Pós-doutor e com mais de 30 livros publicados, muitos figurando em listas de best sellers, acaba de lançar "Você é ansioso? Reflexões contra o medo", uma análise sociológica sobre a ansiedade, sensação que ele julga estar dentre as mais maléficas do mundo hoje. Entende como positiva a experiência da solidariedade que a pandemia motivou, mas não vê neste vírus e sua proliferação qualquer força capaz de provocar mudanças maiores nas sociedades. "Outras pandemias muito mais potentes e catastróficas não foram capazes", destaca. Acha a expressão "novo normal" mais uma invencionice do marketing e que os consumidores voltarão às compras iguais, apenas mais pobres. Afinal, como ele destaca logo no início, os adultos são infantilizados e fogem da realidade. Em entrevista por telefone, de São Paulo onde vive seu isolamento, Pondé compartilha sua opinião sem fantasias, mas com leveza e senso de humor, apesar dos pesares.  

O POVO: O senhor há décadas se dedica a pensar e entender como o homem se coloca e se relaciona com a humanidade. É mais difícil fazer isso nos dias de hoje?

Luiz Felipe Pondé: A gente tem mais informação hoje do que tinha antes. Isso torna mais fácil à medida que os dados são importantes para se refletir acerca de qualquer coisa. Ao mesmo tempo pode se tornar mais difícil porque hoje você tem uma saturação de informação e pode se perder nela. Um detalhe, porém, torna mais difícil. Hoje, inclusive por conta da capilarização dos conteúdos, há uma demanda muito grande de que você fale, faça e pense coisas que deixem os outros felizes. Isso é uma desgraça para a reflexão. Porque todo mundo vira seu consumidor, todo mundo se ofende, todo mundo tem opinião, de repente não importa se você tem repertório, mas se você pertence ao grupos dos azuis ou se você tem determinado tipo de carro ou se mora em determinado bairro. Isso torna mais difícil. Hoje em dia você tem menos distanciamento, o que é quase uma ironia falar de distanciamento em meio a uma pandemia, as redes sociais estão sempre mais ativas.

O POVO: O senhor falou que uma das dificuldades então, de analisar a contemporaneidade, seria o fato de as pessoas quererem consumir, ler apenas sobre o que lhes deixa feliz. O adulto de hoje não está preparado para a realidade?

Pondé: Primeiro eu não acho que essa geração só procura ler o que dá conforto a elas, elas querem que você escreva o que dá conforto a elas, que é um passo adiante do querer ler. É através delas que as editoras buscam quem escreva coisas que as pessoas querem. Em segundo lugar, acho que existe sim uma certa epidemia de infantilização. Isso a literatura estabelece, não é uma mera opinião minha. Os adultos são infantis, imaturos, têm pouca resiliência, não aguentam ter filhos, não aguentam manter relacionamentos sólidos, o Bauman já fala disso desde 1990. Em 79, a cultura do narcisismo já falava da dificuldade de adultos em manter atitudes de adultos. Desde 2004 vem de se falando de adultos com estrutura mental de adolescentes e os alunos entram na universidade com mentalidade de junior high, não tenho nenhuma dúvida que tenha infantilização.

O POVO: Professor, vendo este aspecto do adulto hoje, tentando olhar dentro de um processo histórico, isso tem relação com a construção e a busca de uma vida mais confortável, de menos dificuldade de acessar necessidades e desejos?

Pondé: Acho que sim, uma vida materialmente mais fácil. Sabe como se falava antigamente, que filho único é estragado? Acho que dá pra dizer que os problemas psicológicos que relacionam a filhos únicos mimados serve de arquétipo para os adultos que querem o tempo inteiro que façam o que ele gosta, que têm pouca tolerância ao que acontece à sua volta, que vive num mundo em que ele acha que tem que servir-lo. Eu acho que eu também, você, tem uma proteção excessiva que nasce inclusive do fato de que temos uma sociedade mais rica, mesmo que não seja no Brasil necessariamente, essa sociedade mais rica faz com que as pessoas apliquem as expectativas em relação ao seus filhos num nível que esteja mais restrito, mais seguro. Veja bem, neste contexto de pandemia, a humanidade já passou por pandemias muito piores que essa, não tem relativização da morte, mas do ponto de vista epidemiológico a gente já teve pandemias com mortalidade muito maior que essa e, no entanto, as pessoas estão em pânico, em uma incapacidade de viver com certo risco, gente cogitando ficar em casa durante um ano inteiro, universidade falando que só vai voltar as aulas presenciais quando tiver vacina. É uma situação que provavelmente faria nossos ancestrais, que passaram por pior, questionassem se o coronavírus causa também uma espécie de patologia psicológica, além do próprio dano respiratório. A ânsia do controle total, que nasce com o enriquecimento das sociedades, deixa a gente meio medroso e com dificuldade de lidar com o risco, é o que me parece.

O POVO: O mundo não tem como reaver esse processo para a gente ser uma sociedade mais resiliente e forte?

Pondé: Eu acho que não. Até agora a pandemia está deixando as pessoas com mais medo. Tem gente lavando maçã com pinho sol. Imagina uma pessoa como essa tendo que desembarcar para ter que enfrentar o exército alemão em 44, o que ia acontecer com ela. Talvez, Deus nos livre e guarde, se tivesse uma pandemia que ficasse assolando o mundo por 15 anos e matasse quatro quintos da humanidade, talvez tivesse algum tipo de transformação. A humanidade fica cada vez mais rica, mais egoísta, mais narcísica e com mais medo. Não vejo que essa pandemia mude isso.

O POVO: Falando da realização e busca pela felicidade, em seu penúltimo livro, “Felicidade: Modos de Usar”, o senhor afirma que só a vivência da misericórdia leva o ser humano a atingir essa plenitude a que se chama de felicidade. Perdoar e ser perdoado é este aspecto tão fundamental na nossa experiência humana?

Pondé: Perdoar significa que você é capaz de vivenciar o fato de que as pessoas são frágeis como você, podem realizar atos cruéis, podem se perder no que fazem e estão longe da perfeição. Há um vínculo direto entre perdoar e ser perdoado. Você ser capaz de sentir a misericórdia do outro, o perdão, significa que você sabe que não merece o perdão. Quando eu digo que a felicidade tem a ver com a misericórdia é porque a misericórdia deixa a vida mais leve, deixa você menos arrogante, menos ressentido e menos cruel. Se felicidade não tem a ver com essas três características eu não imagino o que possa ser felicidade.

O POVO: O seu livro recém-lançado, "Você é Ansioso: Reflexões contra o medo", começou a ser escrito antes da pandemia, mas calhou de ficar pronto num momento de isolamento social e pandemia, em que as pessoas tendem a entrar em processos de ansiedade. A ansiedade é o grande mal do mundo hoje? O que lhe motivou a mergulhar nesta sensação humana?

Pondé: O que me motivou foi o convívio com os jovens há 25 anos na universidade, tanto que o maior capítulo do livro é sobre os jovens, que estão cada vez mais ansiosos. Daí, eu parti, por sugestão da editora, para identificar essa ansiedade em outros níveis sociais. O livro é um livro de sociologia da ansiedade. O título só não é esse porque não é um título que vende (risos), mas o livro é sobre marcadores sociológicos da ansiedade, não é um livro de psicologia e nem propriamente de filosofia, é de sociologia.

O POVO: O excesso de informações e muito consumo de redes sociais e internet tem relação direta com a ansiedade dos jovens?

Pondé: Isso eu trabalho no livro. Não só dos jovens, mas muito mais para eles. Mas há questões outras, como excesso de atenção dos pais, excesso de serem muitos filhos únicos, o fato de a educação estar perdida porque a educação hoje está baseada na ideia de que sua função é legitimar o sentimento dos jovens e não passar para eles uma série de ferramentas, inclusive morais, que façam eles resistirem ao mundo e a eles mesmos. Então em questão de formação antiga, desde a Grécia, acabou, a educação hoje legitima o que o jovens sentem para eles não terem problemas psicológicos.

O POVO: Quando o senhor diz legitimar o que os jovens sentem é no sentido de a escola procurar atendê-los em suas expectativas e não o contrário?

Pondé: É no sentido de fazer com que eles não sofram. Se ele sente que na realidade ele é menos inteligente que um colega, a educação deve fazer com que ele acredite que não existe inteligência no colega e que o colega não é mais inteligente que ele e que tudo bem se ele não for capaz de entender uma série de coisas. É assim no mundo.

O POVO: Em que momento a educação deu essa virada e isso é fruto de que?

Pondé: Historicamente. A Hannah Arendt, nos anos 50, escreve um artigo sobre educação americana onde ela diz que a educação americana naquela época já tinha abandonado uma ideia de que os mais velhos tinham algo para ensinar aos mais jovens. A partir do momento que ela abandona isso, a educação não ia ter objeto, no sentido de que ela não ia ter como ensinar os mais jovens, já que ela tinha jogado fora a ideia de repertório que os jovens devem saber para virarem adultos. Mas antes disso, o sociólogo Frank Furedi localiza depois da primeira guerra mundial, na Inglaterra, uma educação que considerava as gerações que tinham criado a primeira guerra, como uma geração que já não tinha mais o que ensinar aos mais jovens. Então ali começa a nascer a ideia de que aquilo que os jovens devem aprender não tem nada a ver com que os mais velhos sabem. Se você for mais para trás ainda e se familiarizar com a geração de 1160 na Rússia, ali já aparecia uma geração de jovens que entendia que não tinha nada a aprender com seus pais, apesar de que não era uma questão da escola, porque nem escola existia sistematicamente na época, mas um entendimento dos jovens em relação a gerações superiores. Então é um processo que vem acontecendo e eu acho que tem muito a ver com a modernização. A modernização considera tudo o que passou como sem valor, no sentido marxista da modernização. Uma lógica voltada para a produção e para o novo.

O POVO: Em sendo a hiperinformação um agravante dos quadros de ansiedade, como conseguir, como sociedade, um equilíbrio de consumo de informação, já que o cenário aponta para um número cada vez maior e por mais horas ao dia em computadores e telefones?

Pondé: Vai ficar pior, não tem saída. A saída é reconhecer que agora a gente não tem nenhuma saída. Inclusive a coisa de colocar as pessoas dentro de casa, as empresas na Europa, Estados Unidos já colocam funcionários para trabalhar em home office, no Brasil a gente não tem muito essa cultura. Aqui as empresas acham que se colocar um cara para trabalhar de home office ele dorme e não trabalha. Mas agora, entendendo que pode se ter um maior volume de funcionários trabalhando em home office, evitar um maior custo e poder demitir gente, isso vai ganhar força. Porque as empresas, ao contrário de que falam sobre capitalismo consciente, o capitalismo fica cada vez pior, cada vez mais competitivo, se não vai sobreviver ao massacre chinês, do capitalismo chinês extremamente competitivo, com a mão de obra extremamente baixa, mesmo em esse acúmulo de horas em home office, a hiperinformação não diz nada no horizonte de que isso vai melhorar. O Bauman em 2015, no livro "Vigilância Líquida", já fala que a vigilância das redes sociais dá-se ao fato de que a gente mesmo quer ser vigiado. Um monte de gente afora está disposto a ser vigiado para garantir que não vá pegar nenhuma infecção. Da onde que tem saída? Não tem saída de lugar nenhum. Na verdade a gente quer isso, a gente quer segurança, garantia. Eu não vejo saída.

O POVO: E do ponto de vista individual, embora haja um controle das pessoas pelo que elas fazem enquanto estão navegando na web, ainda existe espaço para escolhas realmente autênticas, nascidas dentro do próprio sujeito?

Pondé: Eu discuti essa questão em um livro que eu escrevi em 2015 chamado "Marketing Existencial", essa é uma das maiores questões da Filosofia. Não dá pra responder essa questão absolutamente, mesmo antes do marketing digital, porque o desejo se constrói na relação com o meio. Não existe o grau zero do desejo, o desejo é articulado na linguagem. Na China você recebe uma televisão em casa mesmo sem ter comprado, porque eles têm tanta precisão do que você procura e consome que eles sabem que você quer a televisão. Se você não quiser devolve e não paga depois.

O POVO: Voltando para a questão do capitalismo consciente, citada anteriormente pelo senhor, é possível um mercado com outra perspectiva dentro do sistema capitalista? Hoje se valoriza muito as marcas com cadeias cíclicas e sustentáveis...

Pondé: O capitalismo é só produção, produção, produção. Se a dona Maria está conseguindo ganhar dinheiro com a palha que a avó dela já fazia, ótimo para a dona Maria. Agora o fato é que esse tipo de coisa ou é muito barata e a dona Maria não decola da pobreza ou em algum momento alguém descobre que isso é muito bom, alguém escreve um artigo chique sobre a dona Maria, algum influencer descola uma relação com ela e em algum momento ela começa a vender muito e de repente ela vai vender a marca dela para alguém por uma puta grana e vai comprar uma casa na praia, vai sustentar a família toda dela com a grana. O que se chama capitalismo consciente é antes de tudo um produto para o mundo corporativo que se chama palestra, de palestrantes que vão mostrar como as empresas do mundo estão associadas a causas sociais, a cadeia produtiva sustentável no sentido de mais longa e não só a bolsa de palha da dona maria.

O POVO: É um caminho positivo dentro do que a gente pode fazer hoje, num sentido de fazer uma cadeia mais longa onde se possam dividir os valores?

Pondé: Primeiro porque se você pegar um produto orgânico ele vai ser bem mais caro que um produto não orgânico, seja lá o que isso significa (risos). Comida orgânica é muito mais cara, comida sem agrotóxico é muito mais cara. Aqui em São Paulo as feiras que têm produto orgânico são super caras, então eu acho que não é que não exista, mas eu entendo que é muito marketing em cima de uma porção muito cara, em cima do verdadeiro. Eu entendo que quem mora na Dinamarca, por exemplo, que tenha uma vida estável possa querer consumir limão que cresceu com o xixi do povo da Sicília porque é orgânico. Imagina você alimentar uma população de favela com produtos assim.... Não é para massas.

O POVO: Seguindo nesse pensamento sobre o consumo, há uma expectativa de que a pandemia faça brotar consumidores mais conscientes e com novos valores. Como você vê isso?

Pondé: Eu acho que se esse consumidor for alguém que não tem filhos, não tem família, e tem alguma grana ele pode até sair da pandemia ele pode querer brincar de consumir como um sueco, onde metade da população mora sozinha. Então, assim, se você está falando do grosso da população, o consumidor pós-pandemia é um consumidor mais pobre, só isso. Com menos alcance e por aí tem menos consumir, o que significa mais gente pobre, porque num país como o Brasil se você não tem consumo você não tem emprego, a economia é um ciclo, então acho que essa história do novo consumidor pós-pandemia a única decência dessa discussão é se você entender uma população com medo.


O POVO: E como sociedade, nasce uma geração com valores mais humanizados?

Pondé: Olha, eu acho que não. Essa pandemia, a baixa letalidade dela tende a fazer algumas modificações. Na idade média no século XIV, onde teve uma peste negra que chegou a matar um terço da população europeia, isso sim que é uma epidemia terrível, né? No sentido epidemiológico e não de cada vida que se perde, ela operou a relação do capital e do trabalho, no sentido de que morreu muita gente, então quem sobrou teve mais trabalho. Essa epidemia matou pouco porque a letalidade dela é baixa estatisticamente, apesar de que o número dela é alto, porque tem muita gente no mundo e a epidemia atacou o mundo quase inteiro, num espaço de 30 dias. Porque existe avião, existe capitalismo globalizado e existe turismo internacional. Então a epidemia atingiu o mundo inteiro em um mês. O ebola não atingiu tanto porque estava em uma região da África Ocidental que tem zero de turismo, um capitalismo muito pobre e o ebola matava o hospedeiro muito rápido. Então uma característica dessa epidemia de contágio é porque ela tem um número muito grande de pessoas assintomáticas. Essa epidemia, não deverá deixar, além, no imaginário de nós que estamos vivendo agora, um rastro nem igual ao da gripe espanhola. Porque até agora a letalidade foi menor. A não ser que o bicho vire de um jeito completamente. A gente que está acompanhando no dia a dia na mídia, às vezes a gente pode ter a impressão de que nunca ocorreu na face da terra, relativamente falando, um nível epidemiológico desses. Mas já teve muitos piores. Uma epidemia como essa não chega nem a alterar a relação capital e trabalho. Ela pode alterar num sentido de demissão por causa de um trabalho remoto, agora inverter a lógica de oferta de demanda e de trabalho, por exemplo, ela pode causar uma diminuição de consumo, porque a população vai estar mais pobre.


O POVO: Então ela vai causar mais prejuízo na economia do que repercussão na vida humana?

Pondé: Sim, porque pessoas perderam pessoas, é um trauma gigantesco. Ela vai piorar a desigualdade, inclusive no Brasil. O que não significa que vai ser para sempre, tá? Não acho que seja para sempre. Estou falando de coisa de seis meses, um ano, depois, não para sempre. O para sempre é outra história, a gente nem sabe. Então essa expectativa de que vá nascer uma sociedade nova é só narcisismo de quem está vivo agora, é só isso. É orgulho, vaidade, é a pessoa tentando dizer que vai ficar legal depois disso tudo e o mundo vai ficar igual a ele. Não tem nada a ver. Achar que vai nascer um brasileiro diferente, agora estamos tendo exercícios de solidariedade, que é bom para quem recebe, mas não há nenhum indicativo de que a sociedade saia de uma epidemia mais solidária, não há indicativo algum.

O POVO: No começo da sua trajetória o senhor fez Medicina, depois foi para a Filosofia onde seguiu para doutorado e pós-doutorado. Uma vida de estudo e dedicada à Ciência e à Academia. Como o senhor avalia esse momento onde a gente assiste a medicina, as pesquisas, a ciência sendo questionadas pelas autoridades, por opositores políticos?

Pondé: Ninguém sabe muita coisa. Ninguém nunca soube tão rápido e nunca se dividiu tanto a informação quanto hoje em dia. Mais ainda se sabe muito pouco sobre a pandemia, sobre o vírus. É um vírus que apareceu em dezembro, talvez em novembro. Eu estava na China em novembro do ano passado e até meados de dezembro, que foi quando eu saí de lá, ninguém sabia de nada, ninguém falava nada sobre isso. É claro que na China o fluxo de comunicação é diferente daqui. Tanto é que se conseguiu esconder isso durante mais tempo. Portanto a ideia de que a gente vai sair desse momento, dessa epidemia e que a ciência sabe tudo, a ciência não sabe tudo, por isso que a ciência é boa. Porque ela aprende com a experiência, com o erro. No mundo inteiro tem debates, olha a questão da máscara. Nos Estados Unidos tem debate, a OMS não tinha certeza sobre a máscara. Agora no Brasil, você tem uma situação de polarização política bastante estúpida, bastante radicalizada e essa polarização acabou contaminando o debate epidemiológico. Então é pior. Ao lado disso você tem um país extremamente centralizado, que o dinheiro todo depende de Brasília, apesar de que Brasília não produz o dinheiro, mas ela arrecada tudo e o resultado se depende muito do que Brasília decide. Quando se tem um presidente terra-planista, negacionista, aí fica complicado. Mas o debate científico do mundo acontece, tem acontecido o tempo todo. Está se aprendendo sobre as medidas. Não se sabe sobre o destino imunológico preciso, a vacina vai sair muito provavelmente mais rápido que outras vacinas, mas você tem controvérsias. Mas cada um fala uma coisa. No cenário brasileiro isso foi piorado por causa de uma gestão irresponsável federal e porque você tem uma máquina de governo extremamente corrupta, em que os políticos, grande parte deles, sempre se aproveitou para roubar. Então ficou pior.


O POVO: O esperado e falado "novo normal" pós-pandemia existe, já estamos nele?

Pondé: Eu acho que esse conceito de novo normal é muito marketing. O novo normal é de gente falando sobre o seu próprio tédio, é gente fazendo live cozinhando brócolis, passando aspirador de pó, brincando de igualdade social. O novo normal é mais gente trabalhando em casa. Eu acho a expressão fajuta, agora que o novo normal vai ser de pessoas mais conscientes, um novo normal com pessoas com medo de dar beijo na boca também, mas acho que a volta à vida normal vai ser estressante, muita gente com medo, muita desorganização, gente sem saber o que fazer, como as escolas, por exemplo.

 

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