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2021 não pode ser um ano sem aulas presenciais
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2021 não pode ser um ano sem aulas presenciais

Presidente-executiva de uma das maiores organização educacionais do País defende retorno às aulas presenciais mesmo com indefinição no calendário de vacinação contra a Covid-19
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Priscila Cruz, Todos pela Educação (Foto: Divulgação)
Foto: Divulgação Priscila Cruz, Todos pela Educação

O retorno às aulas presenciais em 2021 deve ser prioridade dos prefeitos eleitos para evitar danos ainda maiores aos estudantes brasileiros, principalmente às crianças pretas e pobres. É o que defende Priscila Cruz, presidente-executiva da ONG Todos Pela Educação, uma das maiores do País na área, em conversa com O POVO. A mestre em Administração Pública pela Harvard Kennedy School of Government clama ainda mobilização social de apoiadores e críticos do presidente Jair Bolsonaro para que o líder do executivo nacional melhore o tratamento dado à educação básica.

O POVO - Ainda são incalculáveis as consequências na aprendizagem dos estudantes por conta da suspensão das aulas presenciais neste ano. O que será preciso para superar ou mitigar os danos?

Priscila Cruz - Os efeitos são brutais. Principalmente para as crianças que já estão numa situação de maior vulnerabilidade, com baixa ou sem nenhuma conectividade, na pobreza ou em casas onde sofrem com a violência física e insegurança alimentar. Me preocupa bastante agora, com o fim ou com a alteração do auxílio emergencial, essas crianças em casa sem a merenda escolar e nessa situação de aumento da pobreza e do desemprego no Brasil. Os impactos são de muitas ordens. Tem a questão da aprendizagem, que obviamente é bastante preocupante. Isso certamente vai prejudicar a trajetória escolar e as aprendizagens futuras dessa criança. A gente precisa mesmo entender de uma forma mais geral e completa todos esses efeitos. A gente vem alertando em relação a isso, mas é preciso sempre lembrar que a decisão da suspensão das aulas presenciais traz sim uma série de consequências, principalmente, para crianças mais pobres.

Para este ano que virá, a gente ainda sabe pouco como vai ser a vacinação no Brasil e em que patamar vai ficar a pandemia. Eu estava olhando os gráficos, e a gente está na direção de já superar o pico de julho e agosto da pandemia nos próximos dias (entrevista concedida dia 9 de dezembro de 2020). Então isso tem impacto na educação porque é mais tempo de escolas fechadas, mais tempo das crianças mais pobres nessa situação. Não há um clamor da sociedade, das famílias até, em ter essa questão solucionada.

Sobre o que precisa ser feito no ano que vem, temos duas grandes avenidas. Tem uma longa, contínua e que a gente vai precisar cada vez mais trilhar com muita competência, que é das políticas estruturantes. Essa avenida, a pandemia não substitui a agenda. Então, a gente ainda precisa ter formação de professores, fazer a Base Nacional Comum Curricular chegar nas escolas e implementar a Reforma do Ensino Médio. Precisa ter o atendimento na educação infantil, porque 90% das conexões cerebrais são formadas de zero aos 3 anos, e depois dos 4 aos 5 anos também são muito importantes para o desenvolvimento da criança.

E aí, tem uma avenida que é das polícias para mitigar os efeitos da pandemia. É uma agenda que os governos estaduais e agora os novos prefeitos também vão ter de cumprir. Eu estou falando da decisão política da retomada das aulas presenciais ou não. E como que vai ficar a conectividade, o acesso a dispositivos, equipamentos e às aulas remotas, formação de professores, implementação dos protocolos tanto os pedagógicos quanto os sanitários.

OP - Mesmo com a vacinação incerta, mas supondo que tenhamos vacina e que haja imunização abrangente, as escolas devem voltar imediatamente às aulas presenciais ou o processo deve ser mais gradual?

Priscila - Eu não acho que a vacinação é um pressuposto ou condicionante do retorno às aulas presenciais. A vacinação não vai controlar totalmente a doença. A gente vai precisar aprender a conviver ainda com casos que continuaremos a ter da Covid-19. Existe uma eficácia que não é 100%. A gente não tem comprovação da vacina para pessoas abaixo de 18 anos. As vacinas não foram testadas com as crianças. Então a gente vai ter que aprender a conviver em uma situação em que a doença vai estar presente na nossa vida por muitos meses. A vacinação pode começar em março, mas a gente não tem tempo para término. Então tudo isso é pra dizer que a gente precisa ter uma conversa, planejamento e decisão política em relação à reabertura das escolas, mesmo sem uma vacinação universal. Porque isso pode demorar muito tempo. Algo que eu defendo firmemente é que a gente não pode ter, em 2021, um ano sem aulas presenciais mais. O prejuízo em 2020 já é brutal e gigantesco. Mais um ano sem aulas presenciais, a gente está tirando da cidadania, da possibilidade de vida, da possibilidade de ter oportunidades, da possibilidade de ter uma vida plena, da possibilidade de ter uma vida feliz e saudável de milhões de crianças. Essas crianças, inclusive, têm renda e cor. São crianças pobres e negras. Essa é uma pauta de antirracismo, inclusive. Elas não podem pagar com as suas vidas porque é isso que vai acontecer: elas vão pagar com a vida delas por inação do Poder Público e da sociedade. Então, se a gente precisa começar antes por elas, que comecemos pelas crianças mais vulneráveis. Antes, no começo da pandemia, a gente acreditava que criança era um vetor de transmissão muito forte. Hoje, a gente já sabe que crianças abaixo de 10 anos têm uma taxa de transmissibilidade muito baixa. E abaixo de 10 anos, é justamente a faixa etária em que o ensino remoto tem uma resposta muito insuficiente, muito baixa. É o período da alfabetização. É o período da pré-escola em que o online faz pouco sentido. Então vamos começar com essas crianças. A gente não pode deixar que 2021 seja um ano em que a marca na educação seja de escolas fechadas.

OP - A Lei Federal 13.987/20 garante a distribuição dos alimentos da merenda escolar às famílias dos estudantes da educação básica da rede pública cujas aulas foram suspensas devido à pandemia. No Ceará, por exemplo, há inconsistência na distribuição. Como isso pode ser evitado? A responsabilidade é do gestor local ou do MEC?

Priscila - A questão é que o Governo Federal vetou um dispositivo dessa lei que era de dar para essas famílias a possibilidade de retirada em dinheiro, por meio de cartão, para comprar os alimentos. Que seria muito melhor, inclusive, no pico da pandemia, porque as famílias não vão às escolas para retirar a merenda escolar dos filhos. Então, o Governo Federal, como grande marca deste ano, mais atrapalhou do que ajudou. Eles não ajudaram quase nada, eles mal conseguem executar o próprio orçamento, eles não conseguem transformar o recurso que já é do MEC em programas e políticas de auxílio, de apoio à educação básica do Brasil. O nosso último levantamento mostrou que eles só tinham conseguido executar 6% do orçamento que é algo inédito na história do MEC. A gente nunca teve um MEC que não conseguiu executar nem 10% do seu orçamento já na entrada do segundo semestre de um ano. Então, o MEC atrapalhou, o Governo Federal atrapalhou. Então, qual é a melhor forma e a forma como eu defendo? É que os estados e os municípios façam essa distribuição da merenda enquanto as escolas estiverem fechadas, mas, de novo: a gente precisa falar sobre a reabertura das escolas, por meio de cartão alimentação. É muito mais seguro, a própria mãe pode fazer a compra no comércio local, você tem muito menos burocracia, muito menos dificuldade logística de fazer a distribuição desses alimentos. Seria uma saída muito mais racional.

OP - Durante a votação do novo Fundeb, especialmente no dispositivo Custo-Aluno-Qualidade, o Todos pela Educação foi confrontado com a versão de que a organização colocava os interesses privados acima dos da educação pública. Houve reflexão sobre isso?

Priscila - São afirmações desonestas. O Todos Pela Educação é uma organização social, sem nenhum recurso de governo, sem nenhum recurso de fundações partidárias, de sindicatos. A gente faz captação absolutamente transparente para viabilizar uma organização que é técnica, que busca as melhores evidências que existem disponíveis no Brasil e no mundo. A gente faz um trabalho absolutamente transparente, de defesa do aluno, de defesa do direito à educação e, principalmente, dos alunos mais pobres. A gente faz essa defesa sempre muito clara e evidente. O que acontece, e essa é uma tática que eu lamento mesmo que algumas organizações ou pessoas usem, é a tentativa de desqualificar algumas vozes com críticas desonestas e que não são verdadeiras. Porque a gente poderia muito bem ter um debate sobre. Olha, de fato, o Todos Pela Educação tem sérias reservas em relação ao CAQ (Custo-Aluno-Qualidade). Todas fundamentadas tecnicamente.

Eu tenho convicção muito forte de que o CAQ é tiro no pé da educação. Ele mantém boa intenção, eu reconheço, obviamente. Eu jamais diria que quem defende o CAQ é mal intencionado, de jeito nenhum. Mas eu tenho sérias críticas ao CAQ. Quando a gente tem críticas técnicas a bandeiras defendidas por determinadas instituições, e até especialistas em educação, se a contrapartida não é o diálogo, mas a tentativa de desqualificação do emissor da crítica, isso diz mais deles do que de nós. Assim, para mim, a mensagem muito clara, é que são pessoas antidemocráticas, pessoas que têm dificuldade em lidar com o debate democrático aberto e transparente. A gente está sempre muito aberto e disposto. As nossas notas técnicas todas e posições estão publicadas no site do Todos. Nossas posições e notas técnicas são redigidas para que qualquer pessoa possa entender a nossa posição. Então, como é difícil combater um argumento técnico e bem fundamentado, a tentativa de quem não tem argumento que consiga se contrapor é tentar desqualificar o emissor. Isso é bem lamentável. No fundo, é um pouco do que a gente vê com o bolsonarismo e a extrema direita, que ataca as pessoas e não as ideias. E é uma pena que a gente tenha dentro da educação, do debate educacional, esse mesmo tipo de atitude que é absolutamente antidemocrático.

OP - O Ideb mostrou a dificuldade dos municípios de manterem a boa performance ao longo dos anos, como é o caso de Sobral, no Ceará. Como a senhora interpreta isso?

Priscila - A gente tem que sempre olhar que o Ideb, primeiro, é um indicador com limitações. Mas é um indicador importante da gente sempre observar. É um dos indicadores para acompanhar e entender se o direito dos alunos à educação de qualidade está sendo atendido ou não. Então, indicadores e avaliações são muito importantes para que esse acompanhamento possa ser feito menos para gerar manchetes de jornais, mas muito mais para guiar a ação do gestor. Então, o gestor que começa a perceber que o indicador está em queda, que as avaliações de aprendizagem estão apresentando resultado aquém do esperado, as políticas precisam ser revistas, alteradas ou outras intensificadas. A avaliação e o acompanhamento de indicadores são importantes para melhorar a gestão educacional.

Outro ponto: qualquer indicador não obedece uma curva reta e ascendente. Em geral, e, obviamente, são modelos, o que a gente verifica são curvas quando o município é bem digerido. A gente tem no Brasil, infelizmente, municípios que, depois de quatro anos de gestão, tem queda nos resultados do Ideb. Mas, enfim, estou falando assim, idealmente, um município que consistentemente tem uma boa gestão da educação, ele vai ter uma curva que acelera durante o período. Depois, acelera menos. Então, é esperado que Sobral cresça menos do que crescia anos atrás. Não é que Sobral esteja piorando. Sobral entrou numa curva de maturação das políticas. Eu acho que é uma chamada de atenção para que eles possam rever, talvez intensificar outras políticas, para voltar a crescer como crescia. Mas assim, o dez não existe no Ideb. As pessoas falam: "Poxa, mas Sobral é mais que sete, tem que ir rumo a nove, rumo a dez". Não vai ter dez. É natural que quanto mais vai chegando perto de dez, diminua a velocidade de melhorias

OP - A previsão de desembolsos para 2020 era de US$ 59,9 milhões, mas apenas US$ 2,5 foram recebidos via Banco Mundial para auxiliar os estados a implantar o novo Ensino Médio. A implementação pode ficar prejudicada? Como contornar esse problema de falta de recursos e manter a implantação do novo ensino médio?

Priscila - A gente vai ter um 2021 ainda mais difícil. A gente fez um cálculo no Todos, há queda potencial de R$ 40 bilhões para as redes estaduais e municipais no Brasil. Eu estou falando que essa luta toda por um Fundeb maior e que vai acrescentar R$ 14 bilhões na educação básica. Só por conta dos efeitos da pandemia na economia, que afetam a arrecadação de impostos, a gente vai ter uma queda que pode chegar a R$ 40 bilhões. O Fundeb, obviamente, é muito importante, mas ele não faz frente a essa queda que vai ser muito intensa dos recursos da educação ano que vem. Todas as áreas vão sofrer. Não tem nem como tirar de um superávit qualquer para colocar na educação porque todas as áreas estão sendo afetadas por essa queda na arrecadação dos impostos do Brasil. A gente não tem perspectiva da aprovação de uma reforma tributária que beneficie a educação tão cedo. A gente vai ter que conviver com isso. Eu acho que a gente precisa, como cidadãos brasileiros, acordar para o fato de a gente ter o Ministério da Educação que faz parte de um Governo Federal que é absolutamente descompromissado com a educação. Ele poderia ser um impulsor muito grande para estados e municípios. O MEC poderia ser uma instituição pública que trabalha pelos estados e pelos municípios. Afinal de contas, o Governo foi eleito com o lema: "Menos Brasília, mais Brasil". O que a gente tem visto é o exato oposto. O Ministério da Educação disse aos estados e municípios que os efeitos da pandemia na educação são problemas deles, que não era problema do MEC. E é o MEC que pode ter um volume de recursos maior para poder fazer a complementação financeira que é sua atribuição constitucional. A atribuição primeira do Ministério da Educação, na educação básica, é a complementação dos recursos.

A gente teve, no começo do governo Bolsonaro, manifestações de rua por conta dos contingenciamentos e cortes nas universidades federais. A gente precisa ter um clamor público agora, uma indignação generalizada, forte o suficiente para abalar as estruturas do Ministério, do Governo Federal e da Presidência. Basta! Não dá para o Governo Federal dar as costas no momento em que a educação básica mais precisa. O que eu acho que precisa é de um clamor muito maior, uma crítica especialmente dos que apoiam esse governo, os apoiadores desse governo precisam cobrar que esse governo não dê as costas como ele vem dando para a educação.

OP - O Todos lançou o documento "Educação Já Municípios" para levantar o debate nas eleições municipais já pensando em 2021. Qual tem sido o diálogo com os gestores eleitos?

Priscila - A gente construiu de fato um documento a várias mãos, como é o costume no Todos Pela Educação. A gente sempre se ancora nas pesquisas mais recentes e que trazem as evidências mais fortes e também os especialistas em gestão pública da educação. O documento trabalha aquelas duas avenidas que eu falei no começo, tantas outras políticas estruturantes quanto das ações mais a curto prazo para mitigar os efeitos da pandemia na educação. Agora, a gente está com parcerias com fundações partidárias e com governos estaduais, que vão organizar, em regime de colaboração, trabalho com os municípios, para que a gente possa levar as orientações a todos os municípios do estado. A gente também vai chegar no Ceará. Em todos esses estados, com a presença forte do governador. O Ceará é a grande inspiração do Brasil, na verdade, para isso. O Ceará já faz isso. Então, a gente está levando essa experiência cearense para os outros estados, para que a gente consiga chegar nesses municípios todos. A gente também vai fazer um envio por Correios, para todas as prefeituras brasileiras, de um kit que contém essas recomendações todas, documento, vídeo. A gente também está com parcerias com instituições formadoras e que podem emitir certificados, inclusive, acadêmicos, para formação de secretários municipais de educação e também prefeitos. Tem uma outra vertente que vai trabalhar também prefeitos e prefeitas, que vão ter quatro anos para tomar boas decisões em relação à educação. Estamos com um conjunto de ações muito robusto e muito forte para chegar aos municípios brasileiros, com qualidade e profundidade. Assim, colabora para a gente virar o jogo com esses prefeitos eleitos que vão ficar quatro anos cuidando das crianças mais novas. Porque os prefeitos são responsáveis pela educação infantil, pelo Fundamental I e por metade das matrículas do Fundamental II. Então, todo esse começo de trajetória escolar, é responsabilidade dos prefeitos eleitos. Eles têm na mão, assim, se existe ouro em termos de pessoa, esse ouro são esses alunos que os municípios vão cuidar. Eles são o maior ouro do País.

OP - Como é que o Todos pela Educação tem se articulado para pautar a luta antirracista nos espaços de poder?

Priscila - Têm três macro áreas que precisam ser trabalhadas para que a gente tenha uma educação antirracista. São anéis circuncêntricos. Uma primeira, que precisa ser decidida, formulada e implementada com a intencionalidade de reduzir desigualdades. Como a gente tem uma desigualdade socioeconômica muito atrelada à questão racial, as crianças pobres têm cor no Brasil, então, a condução da política educacional no País precisa dar mais pra quem tem menos, dá mais pra quem precisa mais. Combater uma ideia ainda muito difundida de políticas universais, que são iguais para todo mundo. O que a gente precisa, de verdade, no País, é de políticas educacionais formuladas e implementadas olhando para a necessidade que as crianças mais pobres e as crianças negras deste País têm. Se a gente tem a política de tempo integral, tem que começar por essas crianças. Os melhores professores da rede precisam ir para essas crianças. As escolas com melhor infraestrutura têm que ser para essas crianças. A gente precisa ter a máxima prioridade para essas crianças. Precisamos garantir que sejam desenhadas (políticas) para colocar mais força para essas crianças, que estão numa situação de maior vulnerabilidade, presas à pobreza há gerações e que, na sua larga maioria, são negras.

O segundo recorte considera o espaço escolar. A gestão das escolas precisa conversar sobre o racismo estrutural. Precisa ter um acolhimento para essas crianças sempre que se sentirem numa situação de preconceito ou de desvalorização da sua cor. A gestão educacional precisa estar preparada para combater o racismo na escola. Precisamos ter esses momentos de celebração do negro, da cultura negra, das conquistas da África, das conquistas dos negros no Brasil, de líderes negros.

Depois, em cada sala de aula, a gente precisa primeiro cumprir o currículo obrigatório de história da África, de líderes negros, quilombolas, Zumbi dos Palmares, que já é normatizado no Brasil, mas que não é cumprido. Precisamos ter nas salas de aula o acolhimento. Para isso, tem que ter formação de professores, para que ele seja mediador e consiga enxergar situações que envolvem racismo. Quando o professor tem o radar bem calibrado para entender que determinadas ações são racistas, ele tem que saber ser um mediador rapidamente. Ser uma liderança na sala de aula para poder conduzir uma conversa que faça com que ações racistas sejam absolutamente intoleráveis e combatidas. Não adianta só cumprir o currículo, fazer uma festa, ter uma fala do governador. Precisamos ter a educação antirracista nesses três anéis.

OP - Quais as expectativas para o novo comando da Câmara dos Deputados e Senado? Qual deve ser a prioridade dos novos presidentes no próximo ano quanto à educação?

Priscila - Dois temas serão muito quentes no ano que vem. Tem uma parte da regulamentação do Fundeb que vai ficar para o ano que vem. A lei de regulamentação do Fundeb não esgota toda a regulamentação e todas as decisões relativas à regulamentação que devem ser feitas. Então, ainda tem um resquício de Fundeb no ano que vem, mas que deverá ser concluído até o final do ano, não dá pra passar do ano que vem. Então, assim, o que o deputado (Felipe) Rigoni (PSB-ES) tem defendido, e que a gente também defende, é que não pode deixar o novo Fundeb sem ser operacionalizado no ano que vem. Inclusive, nesta situação de enorme restrição orçamentária, seria uma loucura não ter o Fundeb rodando no ano que vem. O outro é o Sistema Nacional de Educação. A gente viu como que ter o SUS foi fundamental para o Brasil enfrentar os efeitos sanitários, na saúde, na pandemia. Mas a pandemia trouxe também efeitos brutais na educação, mas a gente não tem o "SUS da Educação". A gente não tem o Sistema Nacional de Educação. E o SNE está pautado para o ano que vem. Inclusive, o relator é cearense. É o deputado Idilvan Alencar (PDT). Da mesma forma que 2020 tem como marca legislativa a aprovação do Fundeb, 2021 terá como marca o Sistema Nacional de Educação.

OP - A má gestão orçamentária do MEC nos últimos anos, com agravamento em 2020, indica maior possibilidade de colapso nas gestões municipais nos próximos anos?

Priscila - Existe. A gente não pode tapar a realidade com viés de otimismo totalmente irrealista. Eu adoraria dizer: "Olha, ainda dá, pode ser possível". Como os recursos da educação são provenientes dos impostos, que por sua vez são provenientes da atividade econômica, e a gente terá, sem dúvida nenhuma, um 2021 muito difícil, do ponto de vista econômico do País. A gente tem um Governo Federal que é omisso, cuja marca é a inação. Quando age, age errado nas direções que não colaboram com uma qualidade de vida melhor para os brasileiros. O Governo Federal coloca mais energia para tirar os tributos para importação de armamentos do que coloca no Fundeb. É assim que a gente avalia os modelos. Este é um governo que, claramente, prioriza mais armar a população do que investir na sua educação básica. Então, um governo como esse, obviamente, não deve mudar de ideia. Por isso, eu defendo que a gente seja mais vocal nas críticas. Quem votou e quem não votou no Bolsonaro, todo brasileiro que tem orgulho de ser brasileiro, que tem orgulho do seu país e que quer defender as crianças deste País, precisa ter vocal em demandar desse governo que ele abra os olhos para educação básica, que ele comece a agir para a educação básica. O Governo Federal pode fazer uma diferença muito grande. Ele pode cobrir totalmente o rombo que vai acontecer na educação ano que vem? Não terá essa possibilidade. Preciso ser realista. Mas ele pode minimizar muito. Ele pode ser um grande articulador de esforços para fazer com que as gestões subnacionais tenham melhores resultados. Ele pode e deve, pela Constituição Federal, suplementar em recursos, os entes subnacionais. Pelo que eu vejo hoje, eu diria que não vai acontecer. O que pode mudar o jogo? É o governo sentir-se pressionado pela população brasileira. Ainda mais em um ano pré-eleições. Cada vez estou mais convencida que eleitores e não eleitores do Bolsonaro precisam ser vitais na defesa das crianças brasileiras. Isso vem da sociedade. É a sociedade e a população brasileira que têm que começar a dizer para os bolsonaristas e defensores do governo: "Olha, eu até concordo com esse governo, mas o que está sendo feito na educação é inadmissível. Eu exijo, como eleitor desse governo, providências". E os que não são eleitores: "Eu discordo desse governo. Mas eu discordo mais frontalmente com o descaso que esse governo tem com a educação básica pública do Brasil". Portanto, eu, como brasileira, exijo que essa postura se altere porque quem está perdendo profundamente são vidas. Essas crianças que estão em casa, nas ruas, sem aulas remotas, sem escola, não vão ter as mínimas condições de vida. Ou a gente exige isso como sociedade ou eu acho muito difícil que esse governo altere essa rota atual de completo descaso.

 

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