Licenciado do mandato de senador e com retorno ao posto previsto para fevereiro, Tasso Jereissati, 73 anos, evita cravar se o PSDB terá candidato ao Governo do Estado em 2022 ou se apoiará outro nome ao Abolição. O tucano admite, porém, que sua maior preocupação hoje é evitar que o Ceará mergulhe em retrocesso.
“O que, nesse momento da minha vida, me frustraria imensamente é ver um retrocesso, alguém que destruísse esse modelo e fizesse com que o caos administrativo do passado voltasse a ser uma realidade aqui no Ceará. Essa é a grande preocupação”, respondeu o senador em entrevista ao O POVO em seu escritório, em Fortaleza, no final de dezembro passado.
Questionado se o deputado federal e pré-candidato ao Governo Capitão Wagner (Pros) representaria risco às conquistas de sucessivas administrações estaduais, entre as quais a educacional e a fiscal, Tasso disse que “ele é hoje o mais forte representante do bolsonarismo no Ceará” e que “o bolsonarismo é o maior retrocesso da história do Brasil”.
“Eu tive muita esperança no Capitão Wagner quando ele iniciou lá atrás”, acrescentou o senador, “mas a evolução dele de lá pra cá é um pouco diferente do que eu esperava. Para mim é uma decepção”.
Como exemplo de conduta do deputado que estaria alinhada ao que o tucano considera como o pior governo da história do Brasil, Tasso cita a visita de Jair Bolsonaro (PL) ao Ceará no primeiro semestre do ano passado, quando o chefe do Executivo promoveu aglomerações e desrespeitou medidas sanitárias decretadas pelo governador Camilo Santana (PT).
“Lembro que o dia em que fiquei mais revoltado foi no Ceará, e aí o Capitão Wagner esteve presente. Nós estávamos no pico do pico da pandemia, quase 200 pessoas morreram naquele dia. O presidente Bolsonaro esteve aqui e fez duas aglomerações de pessoas, sem máscara, uma em Tianguá e outra em Caucaia”, criticou.
Na conversa, Tasso também classifica a saída de Geraldo Alckmin do PSDB como um baque para o partido e se pergunta se a legenda conseguirá se recompor depois disso. O ex-governador do Ceará avalia ainda uma possível chapa Lula/Alckmin, as chances do ex-ministro Ciro Gomes (PDT) na disputa, o desempenho de Sergio Moro (Podemos).
O senador faz ainda planos para 2022, mas confirma: não irá concorrer a mandato novamente. Confira a seguir os principais trechos da entrevista.
O POVO – O senhor se afastou temporariamente do mandato para se empenhar nas prévias do partido, mas também ajudar a organizar o PSDB localmente. Como está essa tarefa de reestruturação do partido no Ceará?
Tasso Jereissati – Na verdade, quando pedi licença, foi um conjunto de coisas que me fizeram pedir. Um, eu queria poder ajudar mais o Eduardo Leite nas prévias do PSDB por acreditar que, como continuo acreditando, mas não foi possível, ele seria o candidato com maior potencial para evitar essa polarização Lula/Bolsonaro e essas posições de extremismo no Brasil. Estamos vivendo um Brasil de muito ódio, de muita agressão e pouca argumentação. Ao mesmo tempo, existe na população um certo cansaço na maneira de se fazer política não só do presidente da República, do Executivo, mas do Legislativo, e as pesquisas estão mostrando. E Eduardo era o novo, diferente, com mentalidade nova, ideias novas, atualizado, e teria tudo para ser a terceira via que o Brasil quer. Mas, infelizmente, não foi possível. Ele não conseguiu vencer as prévias. Fiquei muito decepcionado. Segundo motivo, porque eu pretendia também fazer uma reavaliação do PSDB aqui no estado do Ceará, já que tenho estado muito em Brasília, muito envolvido com o trabalho do Senado e fiquei muito distanciado do PSDB, que, a meu ver, também precisa de uma reestruturação e de uma renovação. E terceiro também por motivos pessoais. Eu estou bem, vou logo dizer que estou bem porque às vezes as pessoas interpretam mal, mas eu não tinha tido tempo – com a pandemia, trancado em casa, com o trabalho no Senado – de fazer uma série de exames de rotina que eu precisava fazer e que há mais de dois anos que eu não fazia. Resolvi tirar esse intervalo pra fazer. Em fevereiro estamos de volta.
OP – Quando fala de reestruturação do PSDB no Ceará, o que tem em mente?
Tasso – Tenho conversado com muita gente, eu acho que a própria imagem do partido precisa rejuvenescer. Temos agora um secretário na Prefeitura, o Ozirinho (Ozires Pontes, secretário de Esporte e Lazer de Fortaleza), que é um jovem que está indo muito bem fazendo esse trabalho. Temos que repetir exemplos como esse por aí, em outros municípios, nos aproximando de novas lideranças e de algumas antigas lideranças também que estavam distantes de nós, para fazer uma avaliação do cenário político aqui do estado do Ceará e qual deveria ser o papel do PSDB nos próximos dois anos, três ou cinco. Tenho conversado e continuo conversando com muita gente, até janeiro vou continuar conversando.
OP – Pode citar algum nome?
Tasso – Preferia não citar porque as pessoas podem entender que isso seria compromisso, não quero comprometer ninguém já que realmente não existem compromissos, existem conversas e aproximações.
OP – Como projeta o papel do PSDB na disputa eleitoral de 2022 nacionalmente?
Tasso – Eu estou muito preocupado com o cenário nacional. Preocupado com que nós venhamos a ter que escolher entre o que já foi, no caso do governo Lula e do PT, que teve seus problemas e a meu ver está vencido o modelo que implantou, é preciso que eles tenham uma capacidade de autocrítica e reavaliação muito grande; ou o governo que está aí, que, na minha opinião, é o pior governo da história do Brasil. Com certeza, dos tempos que eu vivi, é o pior governo de todos, de longe. E tem uma parte grande da população que quer coisa nova, não quer o que está aí nem o que foi, e não tenho visto essa possibilidade muito aberta, já que está muito fragmentada. É um quadro preocupante, mas acho que daqui para abril muita coisa pode acontecer. Como estamos acompanhando o desenvolvimento das coisas, eu espero que aqueles candidatos que as pesquisas mostrem que não conseguiram evoluir daqui pra lá tenham o desprendimento necessário pelo país, pelo que o país quer, de abrirem mão e formar uma frente de centro-direita ou centro-esquerda que fuja dos extremismos.
OP – Vê algum nome que reúna mais condições de liderar esse projeto de terceira via?
Tasso – Não, essa é a minha preocupação. Não tem nenhum nome despontando no sentido de que haja uma evolução e saia dessa fragmentação, não tenho visto. Mesmo o nome do Moro, que a princípio pareceu que vinha subindo muito rapidamente, estagnou, e as pesquisas indicam também uma rejeição muito grande a ele. Então não vejo ainda. Não é que não sejam bons candidatos, mas nenhum atraiu ou entusiasmou ainda a população brasileira.
OP – O PSDB saiu das prévias bastante dividido. Considera que é possível conciliar o partido em torno de um projeto para 2022? João Doria tem condições de encabeçar isso?
Tasso – Como disse, nós temos que aguardar. A grande preocupação em relação ao governador de São Paulo era justamente pelo fato de ele ser candidato há tanto tempo, desde prefeito que ele já se colocava como candidato, e, como governador, ter feito um belo trabalho em relação à questão da vacina, mas não ter conseguido deslanchar. As pesquisas e indicações são de que a probabilidade de ele deslanchar é pequena. Mas tudo é possível. Vamos acompanhar e lá na frente, se não houver esse desenvolvimento, temos que discutir. O grande objetivo seria encontrar um candidato viável de centro. Até abril do ano que vem, véspera das decisões partidárias e o começo da campanha pra valer, deve ser o marco natural.
OP – O PSDB deveria abrir mão da disputa?
Tasso – Não acho que o PSDB, acho que qualquer partido, qualquer candidato que não tenha essa viabilidade, se tiver essa visão republicana e esse espírito público, deveria pelo menos sentar pra discutir qual a opção e alternativa para que todos não saiam numa eleição perdida para todos.
OP – Ciro Gomes teria condições de se colocar como esse nome em torno de quem essas forças poderiam se agrupar?
Tasso – É o que aparecer deles melhor colocado. As pessoas às vezes consideram o Ciro um homem de esquerda. O Ciro não é de esquerda, pode ser até de centro-esquerda, mas tem uma posição definida dentro do seu partido, suas alianças são sempre mais à esquerda. Mas é uma alternativa. Agora, também o Ciro, se vier a se mostrar o mais viável, que acho que é possível, por que não? É uma alternativa.
OP – O PSDB poderia apoiá-lo?
Tasso – Não digo o PSDB, nós vivemos umas prévias muito discutidas, seria muito leviano eu falar em nome do PSDB. Estou falando minha opinião como membro do partido.
OP – Do ponto de vista local, como o partido vai entrar na sucessão do governador Camilo Santana? Defende que componha a aliança entre PT e PDT ou que tenha candidatura própria?
Tasso – Primeiro tem um quadro a ser visto, como é que vai ficar. Aqui existe uma aliança entre PT e PDT. O PDT tem um candidato a presidente lançado, formalizado, confirmado, que é o Ciro. O PT deve ter candidato claro, que é o Lula. Não sei qual o caminho local que esses dois partidos vão ter. Pelo que tenho acompanhado, existe uma discussão interna nos dois partidos. Parte do PT quer continuar com a aliança e praticamente ignorar a eleição nacional, e outra parte não quer. Esse desenvolvimento é importante. Do nosso lado, ultimamente temos feito alianças com o DEM, que agora se fundiu no União Brasil. Também não sei qual o desfecho ainda que vai ter essa disputa por esse partido aqui no Ceará.
OP – Esse desfecho no União Brasil é decisivo para a definição do quadro local?
Tasso – Claro, nós temos uma aliança recente nas últimas eleições com o DEM, então o desfecho dessa disputa é importante para nós para ver que tipo e que aliados nós poderíamos ter. É importante até para as eleições de maneira geral. O União Brasil tem muito tempo de TV, tem uma base de candidatos a deputado estadual e federal forte. Isso vai precisar de uma discussão interna maior.
OP – O senhor fala de reconstrução do partido. Não avalia que seria importante que a legenda tivesse uma candidatura ao governo?
Tasso – A minha maior preocupação hoje, e claro que o partido faz parte das minhas preocupações, mas sem querer ser presunçoso, nem querendo fazer nenhum tipo de referência a mim mesmo, desde nossa gestão que o Ceará formou uma escola que é admirada pelo Brasil todo. Nunca mais teve problemas fiscais, é exemplo de administração na questão fiscal, na questão educacional, na gestão da saúde, enfim. É referência, mesmo com partidos diferentes. Tivemos uma época com Lúcio, outra época com Ciro, com Cid e agora com Camilo. Nós mantivemos essa administração que tem uma visão muito republicana e técnica, sem abandonar a política. O que, nesse momento da minha vida, me frustraria imensamente é ver um retrocesso, alguém que destruísse esse modelo e fizesse com que o caos administrativo do passado voltasse a ser uma realidade aqui no Ceará. Essa é a grande preocupação. Eu garanto a você que, na minha posição pessoal, de novo digo que tem muitas circunstâncias que vamos discutir e vai depender de outras opiniões, mas minha grande preocupação é que haja retrocesso no Ceará.
OP – Existe esse risco?
Tasso – Sempre existe. Construir é dificílimo, destruir é facílimo, são meses. Dependendo do administrador, da responsabilidade, do preparo, da visão de mundo, da responsabilidade fiscal, do grupo que o acompanha.
OP – Então não descarta candidatura e está avaliando cenário?
Tasso – O único risco que não admito correr é o risco do retrocesso. Não descarto nada. Como disse, as coisas ainda não aconteceram no Ceará. Como vão ficar o governo e suas alianças e como vamos ficar nós e nossas alianças, que estão dependendo ainda de algumas decisões de caráter até nacional, como a do União Brasil e do PT e PDT.
OP – Há uma candidatura de oposição no Ceará, representada pelo deputado federal Capitão Wagner (Pros). Wagner significaria risco?
Tasso – Eu tive muita esperança no Capitão Wagner quando ele iniciou lá atrás, porque sem dúvida nenhuma é uma liderança, mas a evolução dele de lá pra cá é um pouco diferente do que eu esperava. Ele é hoje o mais forte representante do bolsonarismo no Ceará, sem dúvida. O bolsonarismo é o maior retrocesso da história do Brasil. Eu fui governador por muitos anos, fui senador, e uma coisa que sempre diferenciou o Brasil em relação a outros países, mesmo avançados, era a nossa estrutura e cultura de vacina. Nós somos um dos poucos países do mundo que tem essa política do programa nacional de imunização. Eu sou mais velho que você, e com certeza você nasceu nessa cultura, se vacinando desde criança. Quando governador, eu fazia as campanhas de vacinação. Além de uma imensa convocação da população, eu mesmo saía nos postos de vacinação acompanhando, dada a importância que a gente tinha. E eliminamos muito problema assim. A paralisia infantil, por exemplo, desapareceu do nosso estado e do nosso país. Nós tínhamos essa cultura, e isso está sendo destruído, uma tentativa de destruição. Era um orgulho do Brasil, que é um país não tão notado por suas políticas sociais. Isso é um retrocesso. A questão do meio ambiente, que é uma agenda mundial, de sobrevivência da humanidade, é um retrocesso gigantesco. Esse posicionamento, e essa adesão a esses posicionamentos, visões parecidas como essa, isso me preocupa.
OP – O senhor fala que o bolsonarismo é um retrocesso e que Capitão Wagner representa o bolsonarismo.
Tasso – Para mim é uma decepção, inclusive. Uma decepção porque eu acompanhei o início dele como candidato a prefeito.
OP – O senhor se arrepende de tê-lo apoiado?
Tasso – Não, porque eu sempre quis ver renovação e novas lideranças. Eu lamento que a evolução dele tenha sido para esse lado.
OP – Ainda sobre cenário local, o senhor chegou a se afastar do grupo dos irmãos Ciro e Cid. Como está essa relação hoje?
Tasso – Uma das vantagens que a pessoa consegue captar no Senado é que se convive de uma maneira amigável, cordial e até afetuosa com pessoas que pensam diferente de você. Eu não tenho nenhum adversário com quem tenha inimizade pessoal ou qualquer outra coisa. No caso específico do Ciro e do Cid, é o contrário. Eu tenho amizade pessoal. Tenho um passado que foi construído junto, de uma maneira muito solidária e afetiva. Agora, aqui e ali nós pensamos diferente sobre política, mas isso nunca levou a um afastamento pessoal. E quando há coincidência na visão política, é com muita alegria que nós possamos marchar juntos em direção àquilo em que temos afinidades. Nacionalmente hoje, o partido do Ciro tem uma visão da política econômica bastante diferente da minha. Agora, eu reconheço muitas qualidades no Ciro, mas a visão econômica do partido dele é muito diferente da minha, e é isso que nos separa, sem levar a nenhuma inimizade e que não seja nenhum obstáculo a que se converse e dialogue com respeito, cada um com seus argumentos.
OP – Cid teve papel importante nessa reaproximação?
Tasso – Não é que não teve. Evidentemente que no Senado a gente se encontra praticamente todo dia, senta lado a lado, e essa convivência fica mais fácil. Também nunca houve afastamento pessoal do Cid.
OP – O ex-governador Geraldo Alckmin deixou o partido. Como avalia essa saída e a possibilidade de composição com o ex-presidente Lula como vice. Acha que isso é bom para a política?
Tasso – Primeiro quero dizer que lamento muitíssimo. Eu acho uma das piores notícias que o PSDB já teve foi essa saída do Geraldo Alckmin do partido, um dos fundadores do partido. Ele mesmo costuma repetir que ele é a ficha número 7 quando da criação do partido. Foi governador de São Paulo várias vezes, candidato a presidente da República e criou um enorme vazio no PSDB de São Paulo e do Brasil. Eu não tenho certeza se nós vamos nos recuperar disso. Não apenas recuperar do fato em si, mas do fato simbólico que representa a saída dele do partido em São Paulo, que a sigla governa com muito sucesso. É um baque no partido.
OP – A saída dele poderia ter sido evitada?
Tasso – Claro, nunca deveria ter acontecido. Ele praticamente foi colocado numa situação em que foi expelido do partido, colocado à margem. Isso é uma das dificuldades do nosso candidato, de agregar, e a facilidade de desagregar. Ele nunca poderia ter deixado de lado um homem como Geraldo Alckmin, uma liderança não só efetiva, mas simbólica do partido.
OP – E agora ele é cotado como vice de Lula. Essa aliança é boa pra política?
Tasso – Só deixando bem claro que isso já é fora do PSDB. Eu tenho defendido o fim das polarizações. O país está separado e com muito ódio. Até dentro das famílias a gente viveu pessoas se separando e brigando por causa de posições políticas radicais e extremistas, e até fanatizadas em alguns pontos. Pessoas inteligentes e preparadas não aceitando a ciência, a OMS, a vacina, rejeitando vacina. Isso beira o fanatismo, é falta de racionalidade total. Se isso servir (a aliança Lula/Alckmin) pra juntar, pra unir e pra, mesmo que seja composição com diferença, fazer com que essa divisão se acabe e seja uma divisão democrática e que as pessoas são diferentes, pensam diferentes, mas são aceitas e aceitam as regras. Se for pra isso, pode ajudar simbolicamente a acabar com essa desunião.
OP – Acha que tem chance de vingar?
Tasso – Acho que sim, é uma porta que se abre para isso.
OP – Como avalia o desempenho de José Sarto (PDT) e do governador Camilo Santana (PT), que deixa o governo para disputar possivelmente o Senado? Um que está chegando e outro que está deixando saindo.
Tasso – Não tenho nenhuma crítica contundente a nenhum dos dois. Acho que o governador Camilo Santana foi um bom governador, acho que o Sarto está no início, é muito difícil, mas alguns aspectos positivos já percebi. A limpeza da cidade está muito bem, comparativamente a outras cidades. Mas tem um caminho ainda para mostrar serviço. O governo Camilo é um bom governo, agora, e não é só culpa dele, mas o Ceará ainda vive um quadro de gente morrendo de fome, de profundas diferenças sociais e de pobreza muito grande, de miséria, de parcela da população vivendo abaixo de índices aceitáveis. Isso ainda nós precisamos fazer um projeto de longo prazo e consistente. Essa é a nova missão que não tem sido alcançada por nós mesmos.
OP – O ex-juiz Sergio Moro propôs agora, quando entrou no debate público como pré-candidato, uma força-tarefa para erradicar a pobreza. Seria necessária ação semelhante?
Tasso – Discordo do Moro nessa expressão. Força-tarefa não é o caso. Precisa de um programa de curto, médio e longo prazos, com objetivos claros. E eu tenho até um projeto que está rodando no Senado. Infelizmente o governo está segurando a votação desse projeto. Parte dele foi aceita agora no Auxílio Brasil, foi incorporada. Esse projeto por si só não resolve, mas é um programa que tem que ser complementado com várias iniciativas. Não é voluntarismo que vai resolver isso. Tem que ter muita inteligência, estratégia, muito estudo e avaliações tanto do ponto de vista social quanto do ponto de vista econômica.
OP – O senhor citou esse projeto de sua autoria. Pode fazer um breve balanço de sua atuação no Senado nos últimos anos?
Tasso – Sem dúvida o Marco do Saneamento talvez seja um dos projetos mais importantes que eu fiz na minha vida como senador e que está tendo repercussões no Brasil, com grandes investimentos. Acho que no Ceará estamos atrasados. Hoje não sei qual o número, mas pelo menos quase 40% vivem sem esgotamento sanitário, um problema que o mundo desenvolvido resolveu 200 anos atrás. Você vai num interior ou aqui nos bairros de Fortaleza, vê um menino com um tablete na mão e brincando sobre o esgoto. Isso é um contraste, um paradoxo. Não tem acesso ao que é básico, inclusive para ser um bom operador de tecnologia. Acho que aqui nós poderíamos ter andado mais. Agora, eu participei de um grupo e fui dos que lutou para que fosse criado, que foi a CPI da Pandemia. E se não fosse aquela CPI e aquela pressão, talvez nós tivéssemos demorado mais uns quatro ou cinco meses para começar a vacinação, já que o governo não acreditava na vacina. Isso ficou claro. Aquela teoria perversa da imunidade de rebanho foi uma das coisas mais monstruosas que eu já vi na minha vida. Esse trabalho que fizemos foi muito importante.
OP – CPI foi um divisor?
Tasso – Total, absolutamente. A gente não lembra, mas estávamos vivendo um momento quando começou a CPI. Fiz vários discursos no Senado pedindo implantação da comissão, porque não tínhamos vacina e o governo não queria nenhum tipo de restrição de mobilidade social. Lembro que o dia em que fiquei mais revoltado foi aqui no Ceará, e aí o Capitão Wagner esteve presente. Nós estávamos no pico do pico da pandemia, quase 200 pessoas morreram naquele dia. O presidente Bolsonaro esteve aqui e fez duas aglomerações de pessoas, sem máscara, uma em Tianguá e outra em Caucaia, se não me engano. E foi no mesmo tempo em que o governo estadual decretou o afastamento social e o fechamento de negócios. Havia revolta de restaurantes etc., portanto era decisivo o apoio da União, e ele chegou aqui e fez o contrário. Aglomerou sem máscara. É criminosa uma atitude como aquela. A CPI fez com que a imprensa e o próprio governo começassem a se retrair. Tanto que uma das primeiras consequências foi a substituição do ministro da Saúde, o Pazuello, pelo Queiroga.
OP – Foi um momento difícil porque havia pressão do próprio setor empresarial. Conversei com o ex-secretário Cabeto, que disse que precisou inclusive de apoio fora do governo para convencer secretários de que aquele momento era grave. Ele falou que uma das pessoas com quem conversou foi com o senhor.
Tasso – É porque a pressão era grande. Isso foi que me revoltou no governo Bolsonaro e no próprio Wagner, porque estava presente nessas manifestações. Foi um momento difícil. Eu posso até dizer que eu era oposição ao governo. Nunca fui uma oposição radical, mas não era aliado do governador. Mas compreendia que era um momento difícil, que o governador, já que o presidente não fazia, tinha que fechar loja, fechar restaurante, fechar shopping, escolas. Evidente que isso não era simpático e muita gente ia ter prejuízo. Mas era hora de união, porque estávamos falando ali de salvar vidas. E não houve uma compreensão, e tanto o secretário da Saúde quanto o governo foram massacrados de agressões. Essa incompreensão não precisava de apoio. Eu já fui governador e sei que é difícil enfrentar uma pressão daquele tamanho. Hoje, graças a Deus, as pessoas compreenderam.
OP – O senhor se manifestou nas redes sociais na época.
Tasso – Sim, me manifestei, não só nas redes sociais como no Senado.
OP – Deve retomar o mandato a partir de fevereiro. O que tem no seu horizonte político?
Tasso – É um ano difícil porque é ano eleitoral. Acho que a atividade vai ser menos intensa no Senado porque todas as vistas vão estar voltadas para as eleições, não só presidenciais, mas de governadores, de deputados, senadores em campanha etc. Acho que vai ser também um período rico. As perspectivas econômicas não são boas, a tentação de se fazer um populismo de curto prazo é grande, de fazer medidas aparentemente simpáticas de curto prazo, mas desastrosas no momento seguinte. Vai exigir de todos nós muito bom-senso.
OP – E em relação ao próprio futuro político, como planeja 2022?
Tasso – Eu não devo disputar mandato. Vou trabalhar no que puder para que a gente tenha um presidente bom, moderado, que o Brasil está precisando muito disso. Vou tentar, com essas pessoas que estou conversando, deixar o PSDB bem estruturado, tenho conversado com o próprio Luiz Pontes (presidente tucano no Ceará), mas não está nos meus planos nenhuma disputa direta eleitoral.
OP – O senhor se aposentadoria ano que vem?
Tasso – Eu não chamaria de aposentadoria porque não estou tão velho assim. Diria que está na hora em que você pendura a chuteira, mas pode virar técnico.
OP – Como se posicionaria num segundo turno com Lula e Bolsonaro?
Tasso – Eu já vivi o bastante na política para saber que as coisas mudam muito em um ano. Então a resposta é muito difícil de dar, porque tem muita água pra rolar debaixo da ponte, muita coisa vai acontecer. O que eu diria hoje não seria necessariamente o que vai acontecer. Eu espero ver os acontecimentos para agir e tomar as nossas posições.
Senado
DE LICENÇA do mandato de senador, Tasso Jereissati reassume o cargo em fevereiro, depois de 180 dias afastado do Congresso. Nesse período, assumiu a função o empresário Chiquinho Feitosa, que tenta se garantir na presidência do União Brasil, partido criado a partir da fusão do DEM e do PSL
Disputa
INTERNAMENTE, o União Brasil já nasce disputado. No Ceará, medem forças Capitão Wagner (Pros), ex-aliado de Tasso e hoje alvo de críticas do tucano, e o próprio Feitosa, um parceiro do PSDB no estado - tanto o DEM quanto os tucanos apoiaram José Sarto contra Wagner
União Brasil
A SAÍDA temporária de Tasso do mandato deu força para que Chiquinho negociasse em Brasília como senador da República a presidência do União Brasil no Ceará. A expectativa é de que até fevereiro o impasse tenha se resolvido