Um dos maiores nomes do futebol mundial fez um passeio pela carreira recheada de títulos, como as grandes conquistas com a camisa do Flamengo, período que ficou conhecido como a "Era Zico", no fim da década de 1970 e início dos anos 1980.
Arthur Antunes Coimbra, o eterno "Galinho de Quintino", lembra os bastidores da geração que mudou o status do clube Rubro-Negro no cenário do esporte nacional, as frustrações, como as eliminações nas três Copas do Mundo que participou (1978, 1982 e 1986), e a violência dentro de campo que lhe trouxe sequelas.
Zico narra ainda as brincadeiras da infância, a relação com os netos e as dificuldades que enfrentou para se tornar atleta profissional e revela a promessa que ele e seus cinco irmãos fizeram ao pai, José Antunes Coimbra. O ex-camisa 10 do Flamengo e da seleção brasileira também comenta sobre a polêmica envolvendo atletas que não compareceram aos velórios de Pelé e Roberto Dinamite.
O POVO - Como foi a sua infância?
Zico - Foi uma infância das melhores, das coisas gostosas que uma criança gosta de fazer e que te ajudam no desenvolvimento. Eram brincadeiras bem sadias, criativas, coisas que se você falar hoje ninguém vai ter a menor ideia de como funciona. No meu período primário, eu estudava na parte da manhã. Depois, no ginasial, na parte da tarde. No ginasial não dava para fazer muita coisa pela manhã. Aproveitava para fazer os deveres de casa. Eu estudava muito longe, tinha que pegar trem, voltar. Procurava, quando acordava de manhã, fazer os deveres de casa e já estava quase na hora de ir à escola.
Quando era primário, estudava de manhã, tinha a tarde e a noite livres para brincadeiras de rua. Chutar lata, por exemplo. Não sei se você já ouviu isso. Um grupo, digamos, de dez crianças, tinha um círculo, colocava a lata ali. O cara que tinha que pegar as pessoas ia pegando e, se aparecesse um antes e chutasse, a lata salvava todo mundo. Tinha bolinha de gude na rua, lógico, pega-ladrão. Tinha um jogo legal no chão que se chamava cotoco. A gente pegava um cabo de vassoura, cortava um pouco. O cabo redondo que parece uma cabeça no final, você colocava uma placa de madeira e fazia o goleiro.
E os cotocos a gente enterrava no chão com papel fino das cores do time que você jogava, fazia um campo na rua de terra e pregava no chão. Usávamos ainda palito de picolé e uma bolinha de ping-pong. Você botava o seu boneco cravado no campo. Com a palheta (palito de picolé), você tinha que acertar a bolinha no boneco, dá passos pra frente e chutar a gol. Era um joguinho que eu adorava.
O POVO - E como era a brincadeira com os netos?
Zico - A gente passa para eles. Eles gostavam mais do totó. É mais fácil. Mas as brincadeiras deles de hoje são todas no celular, no videogame. Pelo menos na escola eles praticam esportes, futebol. Têm netos que gostam de futebol, não são muitos, só os dois mais velhos, inclusive os que jogam no jogo das estrelas. Dois gostam muito de cinema. Tem um que o outro avô tem empresa de promover os filmes que vêm pra cá. Ele via muitos filmes quando o avô era vivo. Esse meu neto adora ver filmes, séries. Eles fazem minidocumentários aqui. Eles têm 11 e 12 anos. Tem um que gosta mais de coisa de terror, Harry Potter, é bacana esse desenvolvimento criativo, ainda mais aqui onde a casa é grande. Eu brinco com eles: 'Olha, o aluguel é caro. Estou colocando na conta'.
O POVO - A cultura do futebol já era presente na sua vida desde a infância?
Zico - Era muito presente. Meu pai era fanático, torcedor do Flamengo e apaixonado pela seleção brasileira, apesar de ser português. Meus irmãos também. Tive três irmãos que jogaram profissional, um (Nando) jogou aí no Ceará. Edu e Antunes jogaram também. Tinha o time da rua. Quando criança, eu acompanhava eles pra tudo que é lado. Futebol sempre esteve muito presente. Aprendi tudo com eles.
O POVO - E o que você lembra de dificuldade e abdicações na juventude para virar jogador profissional?
Zico - Tive que abdicar de praticamente tudo, até mesmo do namoro. Minha semana era ir ao treino e estudar. Eu já tinha 16, 17 anos quando conheci a Sandra. Começamos a namorar. E eu comecei a fazer um trabalho mais forte para desenvolvimento muscular. Ela morava do lado da minha casa. Eu praticamente só a via sábado e domingo. Eu saía 6 horas e voltava 22, 23 horas. Às vezes, ela estava esperando, dava um beijinho e ia dormir. No dia seguinte, tinha que estar de novo (no treino). Como não jogava sábado e domingo, eu aproveitava para ir ao cinema, passear, ir ao um teatro, circo, essas coisas todas. Mas nunca fui de balada. O barulho nunca me fez bem. Não pode falar, não pode conversar. Às vezes, ia só para dançar, se divertir, com grupo e tal.
Meu pai só deixava os filhos jogarem futebol se estudassem. Eu e meus irmãos fizemos um acordo com papai que íamos terminar os estudos. Todos os irmãos se formaram. O Antunes foi professor de uma grande faculdade no Rio, a Gama Filho, de Economia. Ele se formou também em Administração. O Nando fez Comunicação, o Edu fez Educação Física. O Tonico fez Direito. Eu fiz Educação Física. Minha irmã é psicóloga, foi professora na Gama Filho também.
A palavra está acima de qualquer coisa. O que nós prometemos, nós cumprimos. Quando ele subiu, foi feliz por isso. Não era pai do Zico, do Edu, do Nando, ele era o patriarca que, com todas as dificuldades de não ter estudado, trabalhou muito, criou seis filhos, não faltava comida pra ninguém. Regalia não tinha, mas nos ensinou muito com a dedicação dele. Só com atos, sem muitas palavra. O que a gente precisava fazer, todos cumpriram à risca e deram muito orgulho neste sentido.
O POVO - Qual foi o ponto de virada na sua carreira de jogador profissional?
Zico - O ponto de virada é quando todo mundo acredita muito em você. O próprio Flamengo. Um grupo do Flamengo que trabalhava lá resolveu fazer um trabalho de desenvolvimento muscular. Tive que me dedicar em dois períodos durante três meses que fiquei entregue a isso, musculação e academia. Quando terminei, veio o campeonato juvenil e me destaquei. Foi meu primeiro campeonato. Fui artilheiro. Quando acabou, o Solich (técnico do time profissional) me chamou para treinar no profissional. Ali eu vi que a história seria diferente, estava acontecendo o que a gente previa. Em 1971 foi quando houve essa mudança. Eu ainda voltei para o time da base em 1972 e disputei o campeonato de novo. Mas em 1971, quando aconteceu isso, eu já me preparei: 'Bom, agora é seguir esse caminho mesmo, vamos em frente'.
O POVO - Muito se fala da Era Zico no Flamengo de 1978 pra frente, quando vocês conquistaram vários títulos. Até hoje se fala daquele time. O que foi fundamental para que tudo tenha dado certo?
Zico - Eu acho que o que foi fundamental é que três gerações muito boas se juntaram. Todos da base do Flamengo. Naquela época não se investia muito. Hoje você — com a força da economia — pode montar um grande time, como o Flamengo fez em 2019. Vendeu prata da casa muito valorizada, comprou e montou um time que deu certo. Naquela época, você tinha que resolver com a prata da casa. Tinha a minha geração, que era Cantareli, Rondinelli, Júnior, Geraldo, Nunes, Julinho. Depois veio Adílio, Julio César Uri Geller, Tita, Andrade. No final, veio Mozer, Anselmo e Leandro. Juntaram três gerações diferentes.
Com isso, você imagina: no time campeão do mundo tinha Raul, Marinho e Lico, que não foram formados no Flamengo. Se pudesse contar com reservas: Cantareli, Figueiredo e Anselmo, então, dos 16, 11 jogaram na base. Era uma geração boa, com grandes jogadores e, ainda por cima, formados no Flamengo, conhecendo bem o que é o clube, sem vaidade, colocando o que cada um tinha de melhor para o time, um ajudando ao outro. Nem sempre os 11 jogavam bem. Às vezes, três, quatro não jogavam bem, mas sete, oito ajudavam. Eu acho que isso foi fundamental para que a equipe de 1978 a 1983 ganhasse aquela quantidade de títulos. Foram mais títulos do que o Flamengo havia ganho em toda a sua história até então. Abriu o caminho para um crescimento enorme.
Por isso passou a ser chamado de 'nação'. O Flamengo virou 'nação' por causa disso. Saiu do Rio de Janeiro e foi para o Brasil inteiro. Quando em 1971 no profissional, eu ia jogar em São Paulo, se não fosse um ônibus do Rio de Janeiro, não ia ter ninguém torcendo pelo Flamengo. Hoje, a torcida enche um Pacaembu (em São Paulo). Em Santa Catarina tem mais torcedor do Flamengo do que de outros clubes, além do Norte e do Nordeste que é uma loucura. Aquela geração teve muita importância. Se você tem hoje essa loucura que os caras têm pelo Flamengo, os caras têm que agradecer muito a geração dos anos 1980.
O POVO - Inclusive, uma pesquisa recente apontou que a torcida do Flamengo é maior do que as torcidas de Ceará e Fortaleza no Estado.
Zico - Pra você ver (risos).
O POVO - E sobre o primeiro título nacional do Flamengo no Campeonato Brasileiro, em 1980, como foi isso na época?
Zico - Os campeonatos regionais tinham muita força. O campeonato nacional mesmo, o Brasileiro, que passou a jogar todo mundo, começou em 1971. Mas o que aconteceu, também, aquilo ali tinha fator político muito grande. Os caras, para ganhar a eleição, botavam time de tudo que é lugar no Brasil. Tínhamos um campeonato com quase 100 times. Não dá para fazer campeonato com esse número de equipes.
Aos poucos foram acertando tudo isso. E nós, quando estivemos em 1978, tínhamos um time bem acertado. A gente teve o campeonato de 1979, foi uma perda muito grande em jogo dentro de casa. Na fase do mata-mata, levamos quatro do Palmeiras e fomos eliminados. Foi uma pancada muito grande para nós. O Flamengo era um time difícil de ser batido no Maracanã. A gente perdeu. Eu acho que aquilo ali deu um choque na gente.
Voltamos para 1980 com outro espírito. Lógico que tivemos reforços, mas no ano de 1980 fomos com outro espírito para o Brasileiro. Logo no início, na única derrota que tivemos no campeonato, perdemos em casa para o Botafogo-PB. Foi um alerta muito grande. 'Como a gente quer ser campeão dessa maneira? O que está acontecendo?'. Perder faz parte do jogo, mas há algumas coisas que não podemos deixar acontecer. Dali em diante foi só vitória.
Ganhamos o Campeonato Brasileiro. Foi uma reviravolta muito grande. Aquela coisa: 'Ah, esse time só ganha no Rio de Janeiro'. Aquilo mudou a história. No meu caso, teve uma importância grande também porque eu era chamado de jogador de Maracanã, tinha tido problema de contusão do Mundo. Não fui aquilo que se esperava. O Campeonato Brasileiro mudou um pouquinho. Você começa a ganhar de todo mundo fora. Os caras começam a te respeitar mais. A gente teve esses momentos. Sem dúvidas, foi um campeonato especialíssimo.
O POVO - Zico, fala um pouco também sobre a conquista da Libertadores em 1982. O que representou aquilo ali para todos vocês, vencer aquela Libertadores e depois o Mundial?
Zico - Você vai no embalo. Quanto mais conquistas, você quer conquistar mais, jogar toda hora, entrar em campo para ver o que tem pela frente. Com um time bom como aquele, a possibilidade de ganhar era muito grande. Lógico que a Libertadores, pelo fato de o Brasil ser o único país com língua diferente dos demais, era mais difícil. Eu tive que aprender espanhol para dialogar com a arbitragem porque era complicado. Não tinha o aparato que tem hoje. A gente ia jogar nos lugares, tinha transmissão na televisão, mas só uma câmera. Não pegava muita coisa.
Muitas vezes a gente era apedrejado chegando de ônibus. Dentro de campo, os caras procuravam — sabendo que a gente jogava bola — ganhar no grito, usar da violência contra nós. A gente foi pegando isso pela frente e passando por cima de tudo. Nos juntamos, vamos jogar bola, deixa eles fazerem o que estão fazendo. Se a gente entrar nessa área, nós não vamos ganhar nada. Era um pessoal muito legal, que tinha o mesmo objetivo, quando se falavam uma coisa, todos confiavam. Foi um momento muito importante para todos nós.
O POVO - Como está a sua saúde? Você carrega alguma sequela desta época em que o futebol era mais violento?
Zico - A única sequela é esta do joelho. Fiz seis cirurgias. Tenho que me cuidar, fazer musculação. Vou sair daqui para a academia, fortalecer a perna e poder jogar minhas peladas. Pancadas acontecem, você recupera. Mas lógico, no final da carreira, tive problemas musculares decorrentes do problema no joelho. Eu tinha que, talvez, poupar um lado e forçar o outro. É tipo carro velho. Você está com pneu ruim, aí afeta o amortecedor, desgasta o outro lado, tudo dá problema. Uma coisa vai afetando a outra. O joelho é a base do equilíbrio.
Hoje, eu não consigo mais bater um pênalti, uma falta, porque não tenho apoio suficiente do joelho para chutar forte. Com a bola rolando, eu chuto normalmente, sem problemas. Mas com ela parada, tendo que apoiar a perna esquerda, fica complicado. Eu coloquei uma prótese no quadril, no lado direito, se eu apoiar o lado direito e chutar com esquerda, não sinto nada. Mas se eu faço o contrário... A cirurgia da prótese é decorrente de ter forçado demais o lado direito. Aí tem que consertar.
O POVO - Sobre as Copas, te causa ainda algum sentimento de frustração de não ter conquistado nenhuma em três oportunidades?
Zico - Frustração não. Do outro lado tem gente com o mesmo objetivo. Ganhar ou perder faz parte do esporte. O que sinto mais é que, por exemplo, eu joguei três Copas do Mundo, uma porrada de jogos eliminatórios oficiais e só tenho uma derrota. Não tinha nenhuma oportunidade de jogar uma final. A única derrota em jogos oficiais de Copa do Mundo foi contra a Itália, aquele 3 a 2. Em 1978 nós não perdemos. Em 1986 nós perdemos nos pênaltis, no campo foi 1 a 1. É duro isso. Você ter todos esses jogos e, por questão de regulamento, ser eliminado. Poucos jogadores têm um retrospecto desse.
Muitos foram campeões com time perdendo vários jogos, mas é do futebol. Isso aí eu não tenho preocupação de não ter ganho. Eu estou numa leva de jogadores excepcionais que não ganharam. Faz parte do jogo. Em 1986 foi um caso diferente. Eu não queria. O pênalti afeta. Quando as pessoas não têm o que falar, falam do pênalti. O Brasil não perdeu por causa do pênalti, deixou de botar uma vantagem. Já tinha ficado em vantagem e a França empatou. O "se" não joga bola. Se você faz o pênalti, a França poderia empatar. Isso é do jogo.
Ninguém sabe, eu tinha que operar, tinha que ir aos Estados Unidos operar. Eu não obedeci o meu coração ficando lá, tentando ajudar. Deu no que deu. Fiz o que era possível de se fazer. Boto minha cabeça no travesseiro, durmo tranquilo, sei que fiz o melhor. Treinei pra cacete, acordava 6 horas da manhã para fazer musculação. Sabia que não podia fazer certos tipos de movimento porque o joelho ia falsear, ia inchar. São coisas da vida. O homem lá de cima é que sabe do nosso destino.
O POVO - O que você achou do Brasil na Copa do Catar, na eliminação para a Croácia?
Zico - Para mim, por exemplo, eu não sou favorável dessa questão, em Copa do Mundo, onde você tem sete jogos, tem três dias, quatro dias de intervalo, poupar jogadores. Se o time tiver acertadinho, mas não estava. Nem jogo amistoso fez antes. Você tem que acertar isso durante a competição. Você tem a oportunidade de, já classificado, jogar mais um jogo e você muda tudo, bota 11 jogadores diferentes para todo mundo participar. Não é bem assim. É o primeiro ponto. Fiquei muito chateado. É um time todo reserva numa Copa do Mundo. Eu acho que é um desrespeito com o torcedor, com o próprio público que vai ali, que paga uma quantia cara e quer ver os principais jogadores jogarem.
No jogo contra a Croácia especificamente, houve dois erros clamorosos. Primeiro, você está jogando a prorrogação e faz um gol no minuto final do primeiro tempo da prorrogação, o treinador faz mudança, deve ter dito: "Agora não tem erro. A gente não tem mais a necessidade de atacar, vamos ficar fechados". O Brasil, depois dali, ainda teve mais jogadores velozes na frente, tinha entrado o Rodrygo e o Antony, o Pedro também, jogadores frescos.
"Vamos ficar atrás e o resto ali na frente". Se tiver que dar chutão, tem que dar. Você não pode tomar contra-ataque ganhando o jogo numa prorrogação. Você ter seis, sete jogadores lá na frente e só três defendendo. Foi um erro tático clamoroso. Não é só o treinador. Com certeza ele pediu isso, mudou o time mostrando para eles que temos que fechar aqui. Mas não fizeram. Jogador dentro de campo também tem que falar: "Meu irmão, não vem, fica aí e acabou". E sofremos o gol. Vai para os pênaltis. Hoje em dia não há necessidade de dar uma lista e ela ser cumprida. Hoje ficam os 11. Quem quiser ir batendo, vai.
Lógico que o treinador vai orientando, mostrando a preferência. Mas eu defendo que os melhores batedores têm que bater primeiro. Isso dá mais confiança para quem vem depois. Tudo bem, não quis bater o primeiro, o Rodrygo perdeu, o Casemiro fez, o Pedro fez. Quando a Croácia chegou ao quarto pênalti e fez, ali, se perdesse, mesmo o Neymar sendo o quinto, não iria bater mais. O quarto tinha que ser o Neymar. Não tem ordem. Ele poderia bater. Se o Marquinhos perdesse, como perdeu, o Neymar não ia bater. O melhor batedor de pênalti não vai bater? Isso aí tinha que vir ordem de fora, os jogadores dentro de campo tinham que falar: "Vai lá, é você".
Para mim, essas duas coisas foram fundamentais. O time que foi campeão começou a competição perdendo para a Arábia Saudita. A França foi o tirar o time titular e perdeu para a Tunísia. Não é nada, não é nada, mas derrota em Copa abate. A Argentina teve sorte que foi no primeiro jogo, deu tempo de se recuperar. Os jogadores que jogam e perdem, eles ficam mal psicologicamente. "Ah, mas perdeu para Camarões e Tunísia". Quando você vai jogar depois já fica com aquele pensamento de que não vai ser mais utilizado, não vai ter mais confiança porque quando entrou, perdeu. Tem esse lado também.
O POVO - Queria saber tua opinião sobre toda a polêmica em torno da não ida de jogadores aos velórios do Pelé e Dinamite. Foram polêmicas vazias?
Zico - Todo mundo deve respeitar todo mundo. Cada um tem seu dia a dia, seu grau de amizade, de respeito. Ninguém pode cobrar de ninguém isso aí. No mundo, todo mundo quer impor coisas para que você faça. Cada um tem a sua vida, a gente tem que respeitar isso. Não sou favorável a esse tipo de cobrança. Cada um reza de uma maneira, apoia de uma maneira. Agora cobrar situações, esse Brasil de hoje está horrível por causa dessas coisas.
Cada um tem que saber seu sentimento, o que pode e o que não pode, o que deve ou não deve fazer. Eu não estou aqui com 70 anos de idade para alguém dizer o que eu tenho que fazer na vida. Viva da melhor maneira possível cumprindo o seu dever de cidadão trabalhador. Meu cumprimento é esse. Quer cobrar de mim? Cobre isso, você não está sendo cívico, você não está sendo direito. Me cobre dessa maneira. Não me venha cobrar outros coisas porque eu não aceito.
Logo após a entrevista, Zico foi direto para a academia fazer fortalecimento muscular. O ex-jogador ainda sofre com dores nos joelhos e no quadril, problemas adquiridos durante a carreira profissional. Uma das lesões mais sérias ocorreu em agosto de 1985, quando Zico levou entrada violenta do lateral Márcio Nunes, do Bangu, e rompeu os ligamentos de um dos joelhos. Atualmente, Zico tem uma prótese no quadril.
Zico atendeu à reportagem via Zoom. A marcação da entrevista foi feita diretamente com o ex-jogador, que aceitou de prontidão em conversa pelo WhatstApp. O Galinho falou por quase 40 minutos com O POVO.
O eterno camisa 10 é ídolo no Japão e considerado figura crucial para a profissionalização do futebol no país. O brasileiro popularizou o esporte em terras nipônicas quando defendeu o Kashima Antlers entre 1991 e 1994, no fim da carreira. Ele foi treinador da seleção japonesa na Copa do Mundo de 2006 e é conselheiro vitalício do Kashima.