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Wilemara Barros: "Meu corpo é um instrumento político"
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Wilemara Barros: "Meu corpo é um instrumento político"

Uma das primeiras bailarinas negras do Estado, Wilemara Barros, 55, traz em seu corpo-potência a trajetória de mais de quatro décadas alinhavadas pela arte
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Wilemara Barros (bailarina cearense) (Foto: ALEX GOMES/ ESPECIAL PARA O POVO)
Foto: ALEX GOMES/ ESPECIAL PARA O POVO Wilemara Barros (bailarina cearense)

Trazendo no corpo, por vezes nu, sua essência primeira - de mulher, negra, "roliça" (nas palavras de seu primeiro professor) - Wilemara Barros contabiliza 55 anos de idade, sendo 45 dedicados exclusivamente à dança. Iniciada ainda criança no estilo clássico, foi no contemporâneo que a cearense, filha de pai operário e mãe dona de casa, pôde encontrar seu norte. "Na dança contemporânea, quanto mais velho você é, mais você aparece", garante.

Bailarina cocriadora da Cia. Dita, dirigida pelo coreógrafo cearense Fauller, com o qual divide trabalho e também a vida há 17 anos, Wila, como é carinhosamente chamada, traduz sua dança, sobretudo, como um estado político: "Eu coloco o meu corpo nu nos palcos como resistência". Em entrevista ao O POVO, a artista faz um balanço de sua trajetória, discorre sobre o mercado de trabalho, fala sobre sua biografia e reafirma: "A nudez também é uma roupa".

O POVO - O começo da Wilemara na dança já foi pelo clássico? Quais foram suas inspirações?

Wilemara Barros - A minha história na dança começou bem cedo, aos 10 anos de idade, no Sesi da Barra do Ceará. Na verdade, com essa idade, muito criança, eu não tinha intenção de ser bailarina. Até porque, nessa época, mais ou menos entre 1973 e 1974, as coisas em relação à cultura e à arte não eram tão fáceis, não tínhamos projetos sociais relacionados à dança nas escolas, enfim... Mas eu acho que, na verdade, essa inspiração de ser bailarina veio da minha mãe. Minha mãe, quando mocinha, queria muito ser bailarina. Só que, na época - isso ela me conta sempre - as bailarinas eram "mal vistas", é essa palavra que ela usa. E aí, por conta disso, ela falava o seguinte: que a primeira filha que ela tivesse, essa filha ia ser bailarina. E aí aconteceu dessa forma. Quando eu completei dez anos, ela chegou pra mim e me falou que ia me levar num lugar, que era uma surpresa. E eu só fui saber realmente do que se tratava quando eu cheguei nesse determinado lugar, que era o Sesi da Barra do Ceará. Aí eu me deparei com uma audição com mais algumas 600 crianças e passei. Isso em 1974. A partir daí, eu passei a fazer parte da Escola de Balé Clássico e Dança Neoclássica do Sesi da Barra do Ceará. Os meus professores eram Dennis Gray e Jane Blauth. Dennis era do Teatro Municipal do Rio, ele coordenava essa escola; e Jane Blauth era sua assistente. Os dois eram do Teatro Municipal do Rio de Janeiro. E eu permaneci nessa escola por quatro anos. E ela só durou quatro anos pelo simples fato de que, na época, quem dirigia era o senhor Thomaz Pompeu de Sousa Brasil Neto. Quando houve uma mudança de gestão, entrou um outro gestor - eu não me lembro exatamente o nome - que dizia o seguinte: "A gente tem que acabar com essa escola porque, se filho de operário começa a fazer arte, certamente faltará mão-de-obra". Bom... Aí a escola acabou. Eu, na época, filha de operário, meu pai trabalhava numa fábrica; minha mãe, dona de casa, era "prendas do lar", aí quando essa escola acabou, eu realmente não tive pra onde ir. Os bailarinos mais talentosos começaram a procurar outros lugares. Eu, como na época não tinha condições financeiras, a minha história com dança aí parou. Acabou. Aí foi quando realmente, mais ou menos uns dois anos depois do término da escola, eu tomei conhecimento de que havia uma professora que tinha sido aluna do Dennis na mesma época. Foi quando eu voltei a fazer aula de balé com a professora Anália Timbó e, nesse período, ela resolveu criar um grupo de dança chamado Vidança e eu fui uma das pioneiras. Sempre fui uma apaixonada pela dança clássica porque foi o estilo que eu comecei a fazer e me apaixonei. Porém, eu comecei a perceber que eu gostaria de algo mais.

OP - Além da dança, você flerta com outras linguagens: já participou de filme, desfile de moda, etc. Como você gosta de ser identificada?

Wila - Eu gosto de ser identificada como uma bailarina, uma artista que se permite transitar por outras linguagens. Dependendo do trabalho que eu estou apresentando, por vezes algumas pessoas chegam pra mim e pensam que eu sou atriz. Eu não sou uma atriz, eu não tenho um trabalho de teatro específico, mas eu gosto sempre de pensar que a arte que eu faço, ela me permite e me dá subsídios, me dá ferramentas pra que eu possa transitar por outras áreas e por outras linguagens. Hoje em dia, eu penso que consegui estar, e ainda consigo estar em cena aos 55 anos, porque a dança hoje te permite isso, de uma certa forma. E eu tive a sorte de trabalhar com uma pessoa, que é o Fauller, que é um coreógrafo bem sensível nesse sentido, de perceber qual o lugar que eu posso estar e qual a dança que eu posso fazer com a idade que eu tenho, com a maturidade que eu tenho. Eu gosto também muito de ser uma cocriadora, que é aquela bailarina que está sempre apta a entender o que o criador, o que coreógrafo, quer e acho muito bacana essa liberdade para esse bailarino cocriador que, de certa forma, contribui para a obra.

OP - Você foi uma das primeiras bailarinas negras no Estado a se consagrar na dança clássica. Hoje em dia, ainda é um entrave adentrar nessa seara tão específica da dança, olhando pelo lado do "ser negro"?

Wila - Quando eu comecei a dançar, realmente não se tinha notícia de bailarinas negras na Cidade. Nos Estados Unidos já tinha uma coisa ou outra, na Europa também - mas eram coisas bem pontuais. Mas realmente, na Cidade, eu acredito que fui uma das primeiras bailarinas negras a ter essa visibilidade. Pelo fato de ser negra, subir na ponta, embora eu não tenha muito histórico de ter dançado grandes clássicos de repertório na ponta, mas as pessoas sabiam que eu fazia aula de balé, sabiam que eu subia na ponta, então isso já me dava uma certa visibilidade pra que as pessoas pudessem conhecer meu nome. Atualmente não é mais um grande problema você ser uma bailarina negra. Você hoje entra nos lugares. Se você tiver talento, trabalho, você pode entrar em qualquer sala. Até porque também tudo se abriu para a questão racial. Você vê que hoje são fabricados materiais de dança para bailarinas negras e isso é maravilhoso, um ganho muito grande! E hoje também a gente tem uma coisa inédita: a gente tem bailarinas solistas, que fazem os primeiros papeis em grandes companhias, nos Estados Unidos, e antes não se tinha isso. Quando eu comecei a sair da minha cidade e viajar fazendo aula de balé, quando eu entrava na sala, eu usava um cabelo rastafári e isso intensificava mais a minha negritude. Quando eu entrava com essas tranças enormes pra fazer aula de balé, o professor de balé clássico olhava pra mim e perguntava se eu era uma bailarina clássica porque a minha aparência não condizia com esse perfil que a Europa ditava. Aí eu, timidamente, respondia que eu era bailarina contemporânea. Só que, com o passar da aula, ele começava a me olhar de uma outra forma. Acho que ele pensava: "Bom... Uma menina negra com tranças, como é que não é clássica se ela não tem o perfil, mas tem uma técnica?" Acabava que, no final, ele me chamava e falava: "Wilemara, quem foi que disse que você 'não é' uma bailarina clássica?". Mas porque eu me considerava uma bailarina contemporânea eu me distanciava um pouco dessa coisa de ser clássica, porque eu não carregava esse perfil. Mas depois eu fui entendendo que, sim, eu podia ser uma bailarina clássica. Na verdade, foi uma escolha minha.

OP - Algumas pessoas colocam uma carga pejorativa no termo "mulata". No entanto, você possui um trabalho solo justamente com esse nome... Queria que você me desse a sua definição pra esse termo e o porquê de ter escolhido ele pra um solo de dança.

Wila - Por muitos anos, essa palavra veio de uma forma bem pejorativa. Porque os senhores denominavam suas escravas de mulata porque eles associavam a mulata ao termo "mula". "Mula" e "lata". Então ficava uma coisa bem pesada mesmo, que era a "mula que gostava de tomar na lata". Eram as escravas mais bonitas que eles tinham para serem usadas sexualmente. Já nos nossos dias atuais, é um termo que é usado para as mulheres negras que têm um belo porte, são bonitas, brejeiras... Tem uma mistura aí de raça, de cor branca com a negra... Eu acho que hoje em dia é mais pra esse lado. Na verdade, quem teve a ideia de colocar esse nome no trabalho foi o coreógrafo Fauller. Como nós somos casados há bastante tempo, há 17 anos, e trabalhamos com a mesma profissão, a gente conversa muito durante os nossos cafés e as nossas refeições. Nessas conversas, eu sempre relato histórias que aconteceram no começo da minha carreira e ele fica encantado com a vasta quantidade de histórias que eu acompanhei e atravessei durante todos esses 45 anos de dança que eu tenho. Numa certa vez, eu relatei pra ele que, quando criança, eu era bem magra, de pernas bem finas e longas. Ou seja, eu tinha um certo "biotipo" bem a favor da dança clássica. Só que, quando eu comecei a ficar adolescente, o meu físico passou por algumas transformações: meus seios começaram a crescer, meu bumbum começou a ficar empinadinho, minhas coxas começaram a engrossar e eu comecei a ficar "roliça", que era como meu professor de balé me chamava. E isso, o fato de ser roliça, pra ele era uma problema porque eu já comecei a abandonar aquele perfil que seria perfeito pra dança clássica. O professor ao qual me refiro é o Dennis Gray, que tinha uma metodologia de ensino bem rígida. Ele costumava, quando a gente errava, nos chamar com alguns nomes: "mula manca", "burra", "urubu na chapa quente", etc. Então, quando eu errava algum exercício na sala de aula, ele começava a me chamar de "mulata" por conta desse físico meio que estava em transformação. E como ele era paulistano, mas morava no Rio de Janeiro, ele tinha uma relação muito grande com essa cultura de massa de lá. Na época, tinha um empresário chamado Sargentelli e ele trabalhava com várias mulheres lindíssimas, negras, que ele chamava de mulata. Então eu relatando ao Fauller desse episódio, ele começou a pensar sobre isso e disse: "Wila, a gente tem que pensar em comemorar os seus 50 anos com um solo. Eu acho muito bacana você contar essa história porque você tem um legado bem interessante e acho também que esse trabalho pode se chamar Mulata". Eu conto isso super tranquila dentro do trabalho, não tenho problemas com isso, vejo com muito bom humor e com muita tranquilidade, até porque hoje eu tenho um respeito e um carinho mito grande por tudo que ele foi. Acho também que, na verdade, essa escolha que o Fauller fez pelo nome Mulata foi uma escolha política mesmo, sabe? É uma forma de você pensar que pode estar nos lugares, principalmente no meu caso como bailarina, eu posso estar nos lugares independente da minha cor, credo, raça. Não é a minha cor que vai determinar o meu talento, o meu caráter, a minha personalidade.

OP - O que se propõe a Cia. Dita é, acima de tudo, uma dança de ordem política. Isso foi o que sempre norteou o trabalho de vocês ou foi acontecendo aos poucos, à medida em que essas questões mais pontuais foram aparecendo pelo caminho?

Wila - Olha só... Dançar é um estado político. É uma ação política. Viver é uma ação política. Tudo é político. As tuas escolhas também são políticas. Ir e vir é uma escolha política. Então, essas questões políticas dentro da Cia. Dita foram acontecendo e permeiam as questões que a gente vive na atualidade, na nossa existência. Os trabalhos do Fauller têm uma reincidência muito grande da nudez. É uma escolha estética? É. Mas também é política, porque é dessa forma que ele e nós, bailarinos que compramos a ideia dele, encontramos de estarmos presente nos lugares com resistência. Por exemplo, Corpornô é um trabalho que a gente fala de erotismo e pornografia, mas apresentar Corpornô na atualidade, nas condições que o País se encontra hoje, é uma resistência e uma posição política. Com a repressão que a gente está vivendo hoje, apresentar (esse espetáculo) é uma posição política. Não tem como, tudo está ligado e foi nessa época, sim, que eu conheci o Fauller. Embora que, quando eu o conheci, ele era ainda um jovem bailarino, ainda não tinha o nome que tem hoje, mas foi por esse pensamento dele e por essa escolha de estética que fez com que eu quisesse fazer o trabalho dele. Porque eu já acreditava no talento dele e o trabalho dele me deslocava, me tirava de um lugar de comodidade. E foi esse deslocamento que me fez querer fazer o trabalho dele, que foi então quando ele me convidou para fazer De-Vir, que tem uma nudez que, na época, nenhum bailarino da Cidade queria fazer, ousaria fazer. E eu, como já era uma bailarina experiente, já tinha entre 36 e 37 anos, já sabia mais ou menos o que eu queria com a minha dança, o lugar que eu queria estar, então eu aceitei porque já era um posicionamento político dele colocar a nudez em cena, e não só a nudez como estética. Então foi mais ou menos por isso que a gente se encontrou, por essas escolhas e porque a gente queria uma dança que fizesse com que as pessoas saíssem do teatro questionadas, pensando no que elas viram, pensando na vida, nos seus lugares de habitação, pensando nos seus corpos... Dança, pra mim, é isso: é sair do teatro mexido, questionado. Seja pra bom, seja pra ruim, mas de alguma forma você tem que sair mexido.

OP - A sociedade construiu o corpo feminino como um tabu, colocando regras e opressões sobre a mulher. Enquanto artista, mulher, negra, "mulata", a importância do nu tem sido maior ao longo da sua trajetória?

Wila - Eu acho que, por muito tempo, realmente a sociedade construiu esse corpo feminino rodeado de regras e tabus. Mas que essas regras vêm desaparecendo ao longo dos tempos. Eu venho de uma geração em que o corpo da mulher era dito como sagrado, era feito somente para procriar. Mas hoje a mulher vem ganhando um espaço em que ela dita e ela diz: "Minha regra, minha lei". Eu acho que hoje as coisas estão numa balança, estão chegando num lugar talvez de equilíbrio. Eu coloco o meu corpo nu nos palcos como resistência. Ele pode até ser visto com erotismo, mas essa não é a forma como eu coloco meu instrumento de trabalho - no caso, meu corpo - em cena. Eu não vejo, não tenho intenção em colocar meu corpo nu em cena como objeto de venda, sexualizado, ainda mais por ser artista, mulher, negra - que a gente sabe por muito tempo que foi a carne mais barata do mercado. Enfim... Eu vou por um outro caminho, um outro viés. Meu corpo é meu meio de comunicação, meu instrumento de trabalho, eu o coloco em um lugar em que eu me sinta confortável, eu dito as minhas regras e meu corpo é um instrumento político, é um instrumento potente, a nudez com que eu trabalho tem potência, não é uma nudez superficial. E eu acho que tem um outro ponto que vale ressaltar: quando eu me coloco em cena sem roupa, nua, pra mim a nudez é uma roupa, entende? A nudez também é uma roupa, que tem uma pele que cobre todas as minhas vísceras, o meu esqueleto, meus músculos... Tem uma pele aí que me reveste. Então isso também é minha roupa. Quando eu me coloco em cena sem roupa, eu me desnudo - e isso, pra mim, atualmente, tem uma importância porque é a forma como eu me desnudo aos 55 anos. Quando que uma mulher iria entrar em cena, aos 55 anos, nua? Então isso também é quebrar tabu. É quebrar regras. Nós, mulheres na maturidade, a gente pode, sim, ter um corpo nu carregando as suas vivências, a sua história, toda uma trajetória, as suas experiências acumuladas durante muito tempo. Então isso também tem uma importância pra mim enquanto mulher, negra e de 55 anos.

OP - Celebrando os seus 40 anos de dança, você lançou a biografia Wila. Foi ideia sua, um sonho antigo? Como você se sente narrando sua própria história, principalmente, para as gerações de agora?

Wila - Bom... A ideia da biografia Wila, que foi lançada nos meus 50 anos e 40 de profissão, não foi minha. Até porque eu sou uma pessoa - não parece! (risos) - mas, quem me conhece, sabe que eu sou extremamente tímida e reservada. Isso partiu do Fauller que, como eu já havia falado antes, em ouvir as minhas histórias, ele, juntamente com a Izabel Gurgel - que, na época, era diretora do Theatro José de Alencar - eles começaram a conversar, daí partiu a iniciativa: dele, dela e do Alysson Amâncio, que escreveu a biografia. Eles três, juntos, trocaram as ideias e eu ia só mandando as informações, sendo entrevistada pelo Alysson e conversando com o Fauller. As pessoas, elas ficam bem emocionadas com os meus relatos, com a história que conta de uma menina pobre, negra, de origem humilde, que veio da periferia, que começou a dançar em um projeto social, que se transformou numa bailarina, que hoje é reconhecida na Cidade, que dança aos 55 anos... Isso já é a própria história! Eu fico muito feliz com isso, é isso que é gratificante. E saber que a geração atual ganha um pouco de força em ler essa biografia e saber que é possível, sim, você sair desse lugar e escrever uma história. Eu acho isso muito bacana. Eu não tinha sonho de ter biografia, estar registrada. Foi uma surpresa, adorável até, porque... É engraçado você abrir um livro e estar lendo coisas suas, intimidades suas ali e saber que as pessoas também estão lendo. Existem alguns relatos meus, escritos de bordo, que eu fiz num tempo em que eu estive doente e parecem que esses relatos mexem um pouco com as pessoas. E também é interessante porque, me parece, que as minhas questões, angústias, têm uma relação muito grande com as questões e angústias das pessoas, por mais que tenhamos profissões e vidas diferentes.

OP - Até onde - e até quando - você pretende chegar com a sua dança? Você pensa nisso?

Wila - Eu penso nisso, sim. É inevitável não pensar. Porque você está envelhecendo a cada dia e, aí, como a velhice vai chegando, as limitações também e você tem que saber lidar com elas que, pro corpo de um atleta, de um bailarino, essas limitações são cruéis! Mas eu acho que o bacana é você tentar entender essas limitações e trabalhar isso da melhor forma. Têm determinadas coisas que eu sei que eu não posso mais fazer e nem tenho mais a performance que eu tinha há dez anos, cinco anos até! Porque é tudo muito rápido! Mas eu acho que o bacana do artista que envelhece em cena, como é o meu caso, é saber o lugar onde ele quer que a dança dele esteja. E eu sei exatamente onde eu quero que a minha dança esteja: eu quero estar num lugar em que seja honesto, eu quero um lugar em que eu seja honesta com o meu público, um lugar em que eu possa estar bem, estar inteira e entender que existem várias formas de estar em cena. Porque você vai envelhecendo e o teu virtuosismo e a tua técnica, eles vão se borrando. Então você tem que suprir essa falta, essa lacuna. E como é que você vai preenchendo essa lacuna? Com a tua experiência! A experiência que você adquiriu todos esses anos, isso é muito potente em cena. É lindo você ver uma pessoa com mais idade em cena! E tem uma coisa interessante, que é assim: no balé clássico, quanto mais velho você é, mais ele esconde o bailarino. Então, de primeiro bailarino, de primeira bailarina, de solista, você vai passando a fazer mise en scène e vai se cobrindo cada vez mais, com mais roupas. Enquanto que na dança contemporânea, quanto mais velho você é, mais você aparece. Mais inteiro, mais honesto você é. Então a dança contemporânea, ela permite você estar com mais idade em cena. Então eu penso, sim, mas isso também não é uma coisa que me tira o sono. Claro que você vai percebendo que você está em outro lugar, mas cabe a você entender isso da melhor forma possível. E aí, o que é que acontece: eu pretendo dançar até o fim. Essa é a minha lei. Eu pretendo estar em cena até o fim.

Wila para ler

ORGANIZADO POR Alysson Amâncio, Fauller e Izabel Gurgel, a biografia Wila (2015; 196 páginas) lança olhar sobre a bailarina, reunindo ainda textos complementares de profissionais do cinema, da moda e da dança. A foto de capa é assinada por Vólia Castelar.

Colégio de Dança

APÓS PASSAGENS pela Cia. Vidança e Grupo Pano de Boca, além do próprio balé do Sesi (Barra do Ceará), Wilemara Barros fez audição para capacitação de professores no Colégio de Dança do Ceará. "Foi a partir daí que eu realmente comecei a pensar na minha dança como profissão", reconhece a bailarina.

Cia. Dita

O ESPETÁCULO De-Vir marca a estreia de Wilemara Barros na Cia. Dita, no ano de 2002. A obra cênica, apresentada como exercício final do coreógrafo Fauller no Curso de Criação Coreográfica do extinto Colégio de Dança do Ceará, já foi apresentada em países da América do Sul, África e Europa. Já Fortaleza (2019), é a montagem mais recente da qual Wila participa, que une dança e fotografia para pensar a história da Cidade a partir da arquitetura.

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